REPERCUSSÃO

Em Davos, banqueiros debatem impacto da gestão Trump e veem desvantagem europeia

Executivos de empresas americanas e europeias aproveitaram o encontro anual no resort suíço para discutir a abordagem da nova administração dos EUA

Entrada do Fórum Econômico Mundial, em Davos - Fabrice Coffrini / AFP

No Fórum Econômico Mundial, em Davos, uma nova divisão no setor bancário global está emergindo: empresas que se beneficiam com a flexibilização das regras em Washington e aquelas que temem ficar para trás. Executivos de empresas americanas e europeias aproveitaram o encontro anual no resort suíço para discutir a abordagem da nova administração dos EUA em relação à desregulamentação.

— A expectativa é que os EUA estarão bem à frente da Europa em termos de menor regulação, e como os bancos americanos operam na Europa, isso nos colocará em desvantagem competitiva — disse Andrea Orcel, CEO do banco italiano UniCredit SpA.

Ao competir por negócios em países como a Alemanha, o UniCredit não vê outros credores da região como iguais, afirmou ele:

— Os verdadeiros concorrentes que tememos são os bancos americanos.

As advertências de Orcel feitas na Suíça surgem apenas um dia após Donald Trump reassumir a Casa Branca com a promessa de reduzir a burocracia e impulsionar o crescimento econômico. Desde que tomou posse, na segunda-feira, ele emitiu várias ordens executivas numa tentativa rápida de cumprir essa promessa.

A equipe de Trump está criando um “ambiente muito pró-negócios,” disse Mary Erdoes, chefe da divisão de gestão de ativos e patrimônio do JPMorgan Chase & Co.

— Espero que isso nos mantenha à frente de outros governos no mundo.

O possível impulso para os bancos americanos pode ampliar a disparidade com os bancos europeus, que vem crescendo há mais de uma década. A preocupação agora é que o crescimento estagnado da UE prejudique ainda mais as perspectivas dos credores da região.

— Não há dúvida na minha mente de que a Europa precisa de um chamado de atenção em relação à regulação — disse Philipp Hildebrand, vice-presidente da BlackRock. — Isso não significa desregulamentar e se preparar para a próxima crise financeira, mas é preciso considerar a competitividade.

Bancos americanos sempre superaram os europeus
Um dos principais focos dos bancos europeus será a implementação das regras de capital conhecidas como Basel III. Inicialmente previstas para este ano, diversas jurisdições começaram a adiar a data de início.

bancos em todo o mundo argumentam que requisitos de capital mais altos limitam sua capacidade de conceder crédito a empresas e famílias, embora padrões mais rígidos impactem principalmente suas reservas para dividendos e recompra de ações.

Os EUA ainda não anunciaram planos para adotar a próxima fase das regulamentações de Basel após uma proposta de 2023 enfrentarem forte oposição da indústria bancária. Embora os reguladores tenham divulgado uma proposta suavizada no final do ano passado, não especificaram quando os bancos seriam obrigados a cumprir as novas regras.

Isso deixou muitos países no mundo em dúvida sobre quando, ou se, os EUA avançarão com a proposta. Já o Banco da Inglaterra adiou a adoção de Basel por um ano, citando “a atual incerteza em relação ao cronograma” dos padrões nos EUA.

A União Europeia também adiou a implementação de algumas partes de Basel, embora parte do regulamento já esteja em vigor. Ela também avança lentamente em outras medidas para impulsionar a indústria financeira: um mercado único para finanças permanece distante, enquanto barreiras nacionais a fusões e aquisições mantêm o setor fragmentado e menos rentável do que os equivalentes americanos.

Bettina Orlopp, CEO do Commerzbank AG — cujo banco está sendo alvo de uma tentativa de aquisição pelo UniCredit que pode abalar o mercado alemão — disse que há sinais positivos de que Bruxelas está disposta a simplificar algumas regras bancárias da UE diante das mudanças na abordagem dos EUA.

— Defendemos repensar e reconsiderar pelo menos a implementação futura das regras de capital de Basel. Acreditamos que a UE precisa ajustar seus planos, considerando o que os EUA e o Reino Unido estão fazendo —disse Bettina.

Benefícios regionais
Se a promessa de desregulamentação impulsionar a economia dos EUA, algumas empresas europeias com grandes operações no país poderão ter motivos para um otimismo cauteloso, incluindo o UBS Group AG.

— A avaliação real, verdadeira e honesta é que a nova administração provavelmente não introduzirá novas regulamentações, o que, para o setor bancário, já é uma conquista, —disse o CEO Sergio Ermotti em entrevista ao editor-chefe da Bloomberg News, John Micklethwait.

— Esperamos ver alguma simplificação para evitar tarefas redundantes por diferentes agências nos EUA, o que seria um movimento bem-vindo. Não acredito, honestamente, que deveríamos ter uma grande desregulamentação para bancos maiores — afirmou Ermotti.

O CEO do UBS enfrenta sua própria batalha na Suíça, enquanto o governo do país avança com planos para aumentar os requisitos de capital devido ao novo tamanho e complexidade do banco após a aquisição do Credit Suisse em 2023.

Ermotti argumentou que regras mais rígidas poderiam prejudicar a competitividade do país como um importante centro financeiro, mas ao mesmo tempo disse que o cenário regulatório suíço ajuda a diferenciar seu banco dos demais:

— Queremos continuar sendo bem-sucedidos operando a partir da Suíça. Faremos nosso caso até o último minuto para garantir que as pessoas entendam não apenas os riscos que podemos representar, mas também os benefícios que criamos para o país.