AMÉRICA DO NORTE

Decretos de Trump contra imigração ocorrem enquanto EUA registram menor nível de travessias ilegais

Medidas adotadas pouco após assumir a Presidência são esforço para alterar políticas domésticas de Biden e cumprir promessas de campanha

O presidente dos EUA, Donald Trump - Greg Nash/POOL/AFP

Poucas horas após assumir a Presidência dos Estados Unidos, Donald Trump assinou uma série de decretos que sinalizaram uma reversão das políticas existentes no país em questões como imigração, meio ambiente e diversidade.

O conjunto das ordens executivas foi um esforço para alterar muitas das políticas domésticas do agora ex-presidente Joe Biden: em discurso na segunda-feira, o republicano disse ter revogado quase 80 “decretos radicais e disruptivos da administração anterior”.

Embora algumas das ordens de Trump devam quase certamente ser contestadas nos tribunais — e com outras sendo amplamente vistas como simbólicas — elas representam, em conjunto, sua intenção de se afastar drasticamente da direção da administração democrata e de cumprir suas promessas de campanha.

Desde que anunciou sua candidatura, o republicano garantiu que iniciaria seu segundo mandato com novos esforços para restringir a imigração ilegal e deportar imigrantes indocumentados que atualmente residem no país.

Não foi surpresa, portanto, quando ele assinou uma série de decretos relacionados à fronteira, incluindo o “realinhamento” do Programa de Admissão de Refugiados, a designação de cartéis de drogas como organizações terroristas estrangeiras, a declaração de emergência nacional na fronteira sul e o fim da cidadania automática para crianças nascidas nos Estados Unidos filhas de pais estrangeiros sem status legal — uma questão controversa e que deve enfrentar desafios legais, segundo avaliação de juristas.

O republicano ainda encerrou o uso do aplicativo CBP One, que buscava facilitar a imigração regular a requerentes de asilo. Funcionários do Departamento de Segurança Interna citaram o aplicativo como uma ferramenta criada para ajudar a reduzir as travessias de migrantes ao fornecer uma maneira ordenada de inscrever suas solicitações.

Com ele encerrado e as restrições de asilo em vigor, a fronteira também passa a estar efetivamente fechada para solicitantes de asilo. Agendamentos que já estavam marcados pela plataforma foram cancelados.

As medidas foram tomadas mesmo com os últimos meses da administração Biden registrando os menores números de travessias ilegais na fronteira em quatro anos.

Em dezembro, o último mês completo do governo democrata, a Patrulha de Fronteira americana registrou a detenção de 47,3 mil migrantes na fronteira, segundo o Serviço de Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA (CBP). Em dezembro de 2020, no último mês completo do primeiro mandato de Trump, as travessias ilegais giravam em torno de 71 mil.

Trump também removeu a liderança da agência do Departamento de Justiça que inspeciona os tribunais de imigração do país, segundo uma fonte ouvida pela CNN americana.

O Escritório Executivo de Revisão de Imigração (EOIR, em inglês) supervisiona o sistema de tribunais de imigração do país, onde juízes de imigração decidem se os imigrantes podem permanecer nos EUA ou se devem ser deportados.

Com servidores públicos de carreira na mira, a medida ilustra o impulso de Trump de admitir funcionários alinhados com sua visão política.

Veja, abaixo, alguns dos decretos do líder republicano sobre imigração registrados ainda na segunda-feira:

Emergência nacional na fronteira
Em seu primeiro discurso no cargo, Trump declarou emergência nacional na fronteira sul do país. A ação permitirá a militarização da zona fronteiriça e o bloqueio dos pontos de entrada nos Estados Unidos, com instruções aos secretários de Defesa e Segurança Interna para erguer barreiras físicas na fronteira.

Além disso, com o decreto, o republicano terá à sua disposição uma série de fundos e recursos militares para implementar seu plano de detenções e deportações em massa.

“Nossa fronteira sul está sendo invadida por cartéis, gangues criminosas, terroristas conhecidos, traficantes de seres humanos e contrabandistas”, diz o decreto assinado por Trump que declara emergência nacional.

Não há dados públicos disponíveis sobre quantos migrantes nos EUA passaram algum tempo na prisão, mas há informações sobre quantos têm condenações criminais: dos 1,5 milhão que cruzaram a fronteira ilegalmente até setembro, 15,6 mil tinham histórico criminal, sendo a condenação mais comum por entrada ilegal em outro país (9.545).

Segurança da fronteira
Segundo autoridades ouvidas pela rádio pública NPR, o novo governo também planeja encerrar a política conhecida como “pegar e soltar”, que liberava pessoas sem status legal da detenção enquanto elas aguardavam uma audiência no tribunal de imigração.

Em vez disso, as novas medidas devem buscar restabelecer a política “Fique no México”, ou seja, a exigência de que alguns solicitantes de asilo na fronteira sul aguardassem no país vizinho as suas audiências no tribunal de imigração.

A Casa Branca de Trump ainda designou grupos e cartéis criminosos — como o venezuelano Trem de Aragua e o salvadorenho MS-13 — como organizações terroristas estrangeiras e terroristas globais.

Antes de assinar o decreto na segunda-feira, o republicano disse que seu governo invocaria uma lei de 1798 sobre “inimigos estrangeiros” em solo americano para ordenar o uso de “imenso poder das forças de ordem federais e estaduais para eliminar a presença de todas as gangues e redes criminosas que cometem crimes devastadores” no país.

Reassentamento de refugiados e asilo suspenso
A ordem suspende temporariamente o Programa de Admissão de Refugiados dos EUA a partir de 27 de janeiro, “até que a entrada adicional de refugiados nos Estados Unidos esteja alinhada com os interesses dos Estados Unidos”. O decreto também proíbe o asilo para pessoas que chegaram recentemente à fronteira sul.

Fim da cidadania por nascimento
Outro decreto emitido por Trump visa acabar com a cidadania por nascimento, consagrada na 14ª Emenda da Constituição dos EUA desde 1868, que garante o direito à cidadania para crianças nascidas no país independentemente do status legal de seus pais.

Como o presidente não pode alterar a Constituição por conta própria, porém, qualquer ordem para restringir ou abolir esta cidadania será contestada nos tribunais.

Ainda na segunda-feira, o republicano foi processado pela tentativa de acabar com a cidadania automática. Advogados de imigração entraram com uma ação pouco após o mandatário assinar a ordem executiva.

Na denúncia, a acusação diz que a medida de Trump ameaçaria crianças e suas famílias “com uma exclusão vitalícia da sociedade e medo de deportação do único país que já conheceram”. Questionado sobre possíveis desafios legais para implementar esta medida, Trump disse:

— Veremos. Achamos que temos fundamentos muito bons.

‘Restaurar’ a pena de morte
Outra ação assinada por Trump instrui o procurador-geral a buscar a pena capital para o assassinato de oficiais da lei e crimes capitais cometidos por aqueles sem status legal.