Filho de Xikão assume cacicado das aldeias Xukuru
Uma das tantas sementes de Xikão vingou dentro do filho, Marcos Luidson, que aos 22 anos de idade assumiu o cacicado das 24 aldeias da etnia
“Para mim, a morte dele foi ontem. Cada vez que encontro o povo falando sobre ele, para mim tudo fica muito recente”, desabafa a irmã do cacique Xikão, Maria das Montanhas, 61, mais conhecida por Marli. Foi em frente à casa dela que Xikão morreu atingido por seis tiros à queima-roupa dentro de seu Jeep em uma manhã de quarta-feira, quando iria buscar a filha no hospital. Alvo de diversas ameaças, alguns atentados, o líder não teve chance de se defender. “Foram mais de 50 denúncias feitas à Procuradoria Federal de ameaças de morte contra ele. Recolhi muitos relatos de emboscadas e de tentativas de suborno que nunca foram aceitos”, conta a antropóloga e professora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Kelly Oliveira.
As investigações, que passaram da Polícia Civil para a Federal, apontaram que o crime teria acontecido a mando do fazendeiro José Cordeiro de Santana, 65, preso quatro anos após o crime (em 2002), mas encontrado morto enforcado na sela da PF do Recife, aproximadamente 15 dias após ser detido. O pistoleiro José Libório Galindo acabou assassinado no Maranhão, em 2001, e Rivaldo Cavalcanti de Siqueira, apontado como o responsável pela fuga do atirador, acabou sendo o único preso e condenado. “A justiça foi feita em parte. Felizmente ou infelizmente, não sei bem, José Santana se enforcou, mas acredito que ele tinha muita coisa a confessar, inclusive sobre o envolvimento de outras pessoas”, avalia Maria das Montanhas.
“Para nós, existe a recordação, mas ele não morreu. Está sempre vivo dentro de nós. E nesses 20 anos de sua passagem de vida, ele está mais vivo do que nunca, porque estamos realizando todos os sonhos dele. Todos somos Xikão. As crianças são Xikão e até os que estão no ventre ainda, porque nascemos para dar continuidade à luta dele, que é a batalha de todos os Xukurus”, afirma a viúva, Zenilda Maria de Araújo, 59.
Uma das tantas sementes do Mandaru vingou dentro do filho, Marcos Luidson, que aos 22 anos de idade assumiu o cacicado das 24 aldeias da etnia. “Cacique não é todo mundo não, tem que haver a pesquisa com a natureza sagrada. A pessoa tem que ter o dom para a liderança, honestidade. E a pesquisa deu Marquinho”, relembra o pajé, seu Zequinha, que chegou a ser questionado por outros anciões sobre a escolha de alguém tão jovem para a posição de comando.
Hoje, aos 39, Marcos carrega a responsabilidade de perpetuar a memória do pai, mas também de escrever sua própria história de liderança. “Os 20 anos de passagem de papai traz muita saudade não só para mim, mas para toda a nação. Por outro lado, também entendemos essa partida como uma nova perspectiva de continuidade. É como se ele tivesse que passar por aquele processo para que o povo conseguisse a se fortalecer. Sou o que ele plantou, mas também comecei a semear novas questões”, pontua o cacique. Entre as apostas de fortalecimento, estão a gestão cada dia mais acurada do território para atender demandas básicas das famílias e assim fixar, com dignidade e oportunidade, o povo nas aldeias.