Alexandre Silveira: "Nossas matrizes elétrica e energética são as mais renováveis do planeta"
Em entrevista exclusiva, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, fala, entre outras questões, sobre o protagonismo que o Nordeste tem assumido
A transição energética, no cenário atual de busca pela promoção de fontes mais limpas, aparece como chave para moldar o futuro do fornecimento de energia.
Neste contexto, o Brasil, com uma matriz diversificada, desempenha um papel decisivo nesse movimento transformador, destacando-se em relação a outras nações.
As fontes renováveis (solar, eólica e biomassa), que têm apresentado um crescimento constante, estão conquistando uma fatia significativa do mercado brasileiro.
Esse crescimento reflete não só a resposta às demandas globais por energia mais limpa como também o potencial expressivo do Brasil na liderança da transição energética para um futuro mais sustentável.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, nesta entrevista exclusiva à Folha Energia, fala, entre outras questões, sobre o protagonismo que o Nordeste tem assumido nesse cenário.
Ministro, quais ações mais relevantes para o avanço no modelo de transição energética do Brasil vêm sendo realizadas pelo Ministério de Minas e Energia (MME) ?
Estamos trabalhando de forma firme e vigorosa na promoção de uma transição energética justa e inclusiva, que já está levando desenvolvimento aos municípios e dignidade às pessoas.
Sob a liderança do presidente Lula, já garantimos mais R$ 150 bilhões em investimentos para geração de energia limpa, em especial no Nordeste, e viabilizamos a contratação de R$ 60 bilhões em linhas de transmissão.
Só no primeiro leilão de 2024, Pernambuco estava contemplado em dois lotes, com previsão de geração de emprego e desenvolvimento no Estado.
Em que etapa se encontram os projetos de lei do setor?
Em julho, avançamos com a aprovação do projeto de lei que cria o marco legal do hidrogênio de baixa emissão de carbono no Senado Federal (sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2 de agosto), um instrumento que trará segurança jurídica e previsibilidade aos investimentos e que contribuirá significativamente para a descarbonização da matriz energética brasileira.
Também progredimos com o projeto de lei do Combustível do Futuro, em apreciação no Senado, que vai destravar mais R$ 200 bilhões de investimentos para o setor, e criar um marco legal para atrair investimentos na atividade de captura e estocagem de CO2.
O que está previsto para este semestre?
Os esforços serão para a consolidação da nossa Política Nacional de Transição Energética, que contará com dois importantes instrumentos. Um deles é o Plano Nacional de Transição Energética (Plante).
O outro é o Fórum Nacional de Transição Energética (Fonte), em que poderemos comunicar nossas ambições e prioridades, ancorando as expectativas das empresas, dos investidores e da sociedade. A lista é grande e será ainda maior nos próximos anos.
Quais os obstáculos na transição energética?
O grande desafio é atrair os investimentos dos diferentes setores produtivos. A boa notícia é que o Brasil já tem sua liderança e, por exemplo, no G20, já está transformando isso, avançando em investimentos na transição energética.
O Brasil investiu US$ 34,8 bilhões em transição energética em 2023. Este ano, deve ser investido quanto e como para que as metas se concretizem?
Só o Novo Programa de Aceleração de Investimentos, o Novo PAC, prevê R$ 646,7 bilhões em investimentos no eixo Transição e Segurança Energética, que inclui geração de eletricidade, no Programa Luz Para Todos, em linhas de transmissão, em eficiência energética e uso racional de energia, em produção de petróleo e gás, na pesquisa mineral e na produção e desenvolvimento de combustíveis de baixo carbono.
Desde o início da sua gestão, o Ministério já garantiu R$ 150 bilhões em geração de energia limpa, principalmente para o Nordeste. Qual a projeção feita para os próximos 12 meses?
Nesse contexto, nos próximos 12 meses, esperamos potencializar ainda mais os investimentos, buscando colocar o Brasil como um dos principais destinos para projetos de transição energética no mundo, diante de nossas vantagens competitivas naturais.
O Nordeste é estratégico em geração de energia limpa e renovável para o Brasil?
Sem dúvida, é um dos grandes protagonistas desse processo de transição energética. Um protagonismo diretamente relacionado às condições favoráveis da região, de ventos fortes e constantes ao longo de todo o ano e de alta incidência solar, condições favoráveis para a produção eólica e fotovoltaica no País.
Na última edição do Balanço Energético Nacional, lançada este ano, o Nordeste se apresentou com 92,5% de toda a potência instalada de geração eólica do país, além de 31,2% da potência instalada de solar fotovoltaica.
Até 2027, estima-se que o subsistema de energia do Nordeste vai contribuir com o acréscimo de 13,3 GW de capacidade ao SIN, enquanto o subsistema Sudeste/Centro-Oeste contribuirá com menos da metade desse valor, cerca de 6,4 GW.
Não à toa, a região receberá, de 2024 a 2026, R$ 58,8 bilhões em investimentos em fontes renováveis. Cabe destacar, ainda, o grande potencial da região para o hidrogênio de baixa emissão de carbono.
O Ministério anunciou, em junho, o lançamento de uma Chamada Pública de R$ 100 milhões para projetos de Energia Zero no Setor Público do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica. Além de se buscar investir na eficiência de prédios existentes por meio de reformas e da instalação de geração distribuída renovável, quais são os outros objetivos?
Na agenda regulatória do Comitê Gestor de Indicadores e Níveis de Eficiência Energética, definimos metas importantes para o período de 2024 a 2026.
Entre elas, está a que em 2025, pela primeira vez na história, vamos propor índices mínimos de desempenho energético para as edificações construídas no País.
Para o setor público pretende-se que, em 15 anos, todas as edificações alcancem o balanço zero de energia, ou seja, sejam capazes de produzir toda a energia que consomem por meio de projetos energeticamente eficientes.
Nesse contexto, a chamada pública é um projeto estratégico que contribuirá para produzir e internalizar esse conhecimento, viabilizando experiências práticas para integração dessas estratégias no ambiente construído, priorizando edificações nos setores de saúde e educação.
O MME já calculou a redução que vai conseguir na utilização de recursos ambientais e de energia, ajudando na descarbonização do setor de edificações?
Somente a esfera pública federal possui 22,5 mil edifícios. A reforma para ampliação do desempenho energético dessas edificações tem o potencial de reduzir ao menos 30% do consumo de energia, restando à geração distribuída a partir de fontes renováveis o atendimento dos 70% restantes.
Se considerarmos a seleção de cerca de 20 projetos, nas cinco regiões brasileiras na Chamada Pública de Edificações, teremos um efeito multiplicador significativo para a redução do consumo de energia, com consequente descarbonização.
O senhor já deixou claro que quer promover o Brasil como exportador de tecnologias de energia limpa. De que forma isso se dará?
Queremos muito mais que isso: queremos ser promotores de desenvolvimento econômico e inclusão social por meio dessas tecnologias de energia limpa.
Estamos deixando claro nas reuniões com investidores no Brasil e no mundo, com entes nacionais e partes interessadas, seja no setor público ou no privado, para construir consensos e ampliar nossos esforços visando ao uso racional e oportuno de nossos vetores energéticos. Estamos fazendo isso na presidência do G20.
No que diz respeito à bioeconomia, que tem um papel fundamental na transição energética, movimenta cerca de 2 trilhões de euros no mercado internacional e gera cerca de 22 milhões de empregos, o que o Brasil vem fazendo para enfrentar a competição global na atração de investimentos?
O principal desafio hoje para o governo federal é, justamente, a competição global para a atração de investimentos de bioeconomia.
Infelizmente, não temos os mesmos recursos orçamentários que outros países têm para subsidiar sua produção, e precisamos vencer isso com, por exemplo, a possibilidade de utilização de créditos tributários para financiar as soluções energéticas com produtos de bioeconomia.
A matriz energética brasileira ainda tem uma participação significativa de fontes não renováveis, especialmente combustíveis fósseis. Como o governo pensa em mudar essa realidade a médio e longo prazo?
As nossas matrizes elétrica e energética são as mais renováveis do planeta. São quase 50% de renovabilidade, enquanto no mundo esse percentual é de 15%. A nossa matriz elétrica é 89% renovável, frente aos 29% registrados no mundo.
Ou seja, enquanto o mundo passa por uma desaceleração nos investimentos em renováveis, o Brasil segue como um dos países que mais tem avançado na implementação de ações para a transição energética. No médio prazo, o nosso esforço tem sido pela redução da queima de combustíveis fósseis.
A longo prazo, o objetivo é aumentar os percentuais de renovabilidade nas nossas matrizes e alcançar as metas que continuarão sendo estabelecidas mundialmente, desenvolvendo novas tecnologias, projetos, políticas públicas.
Para finalizar, quais os investimentos previstos pelo MME para o desenvolvimento e ampliação do uso de fontes renováveis?
Mais R$ 150 bilhões para geração de energia limpa, em especial no Nordeste; R$ 60 bilhões em linhas de transmissão; mais de R$ 50 bilhões em projetos em hidrogênio de baixo carbono; mais de R$ 200 bilhões previstos com aprovação do PL do Combustível do Futuro; R$ 5 bilhões de investimentos no programa Energias da Amazônia, para transição dos cerca de 200 sistemas isolados que utilizam combustível fóssil para opções mais sustentáveis.