'Rachadinha': STF nega pedido do MP e mantém foro privilegiado de Flávio Bolsonaro
Em junho do ano passado, Justiça do Rio tirou investigação da primeira instância por entender que o foro do senador era no tribunal local
Por três votos a um, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou pedido do Ministério Público (MP) do Rio de Janeiro para devolver para um juiz de primeira instância a investigação das "rachadinhas" envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro. Com isso, fica mantida a decisão do Tribunal de Justiça (TJ) estadual que deu foro privilegiado a Flávio.
A Segunda Turma ainda vai julgar um pedido feito pela defesa de Flávio Bolsonaro para encerrar o caso por supostas ilegalidades ao longo da investigação. A Corte não vai avaliar se há provas suficientes para condenar ou absolver Flávio.
O senador foi investigado por suspeitas de que funcionários de seu gabinete na época em que era deputado estadual no Rio de Janeiro tinham que devolver parte de seus salários. Além do STF, ele vem acumulando vitórias no TJ do Rio e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A Quinta Turma do STJ, por exemplo, anulou no começo do mês todas as decisões tomadas pelo juiz de primeira instância Flávio Itabaiana, que cuidava do caso antes de ele passar a ser tocado pelo TJ.
A discussão no STF se arrastava desde junho do ano passado, quando o MP do Rio recorreu de uma decisão do TJ. Na época, por dois votos a um, a 3ª Câmara Criminal do TJ entendeu que, por ter emendado os mandatos de deputado estadual (que foi até 31 de janeiro de 2019) e de senador (que começou em 1º de fevereiro de 2019), ele nunca deixou de ser parlamentar, justificando o foro privilegiado no TJ. Assim, a investigação foi retirada do juiz de primeira instância e passou a ser de responsabilidade do tribunal estadual.
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O relator do caso no STF, o ministro Gilmar Mendes, alegou uma questão processual entre os argumentos para negar o pedido do MP. Ele destacou que o Ministério Público perdeu o prazo para recorrer no âmbito do próprio TJ do Rio contra a decisão que deu foro privilegiado a Flávio naquele tribunal. Assim, estaria tentando, de forma ilegítima, achar um caminho pelo STF que pudesse reverter a decisão do TJ local.
— Ocorreu a perda do prazo para recorrer. Essa situação processual sugere que o MP busca pela via da reclamação [no STF] um caminho processual considerado ilegítimo para a reforma da decisão — disse Gilmar.
O ministro não disse se concordava ou não com a interpretação do TJ do Rio, que levou em conta o fato de Flávio Bolsonaro ter emendado o mandato de deputado estadual com o de senador para lhe dar foro privilegiado. Gilmar afirmou que a questão a ser analisada é se o TJ desrespeitou a decisão tomada pelo STF em 2018 que restringiu o alcance do foro privilegiado. Na avaliação de Gilmar, isso não ocorreu porque, entre outras coisas, a Suprema Corte não deliberou sobre o mandato de deputados estaduais, mas apenas de parlamentares federais.
— Independentemente de concordarmos ou não com a decisão do TJRJ, o que está em debate é se a autoridade do STF foi violada. Não ficou claro o exato alcance da alteração jurisprudencial [feita pelo STF em 2018] — disse Gilmar.
Os ministros Ricardo Lewandowski e Nunes Marques acompanharam o entendimento do relator. Edson Fachin foi o único a discordar de Gilmar. Ele destacou que o STF revogou a regra que estabelece o foro privilegiado mesmo após o fim do mandato. Em outras palavras, a investigação de Flávio deveria ficar no TJ do Rio apenas se ele ainda fosse deputado estadual. Antes dos votos dos ministros, a subprocuradora-geral da República Maria Caetana Cintra Santos opinou pela manutenção do foro privilegiado e rejeição do pedido do Ministério Público do Rio de Janeiro:
— Há de se considerar um fato superveniente e decisivo. Em 17 de junho de 2021, aprovou-se no âmbito da Procuradoria de Justiça do MPRJ parecer que dirimiu dúvida de atribuição criminal. O documento conclui ser atribuição do procurador-geral de Justiça oficiar peças de informações em face do senador. Considerando o caráter uno e indivisível do Ministério Público, a presente reclamação se encontrou esvaziada quanto ao seu objeto, isso porque o chefe da instituição fluminense atua perante o correlato Tribunal de Justiça e não no primeiro grau de jurisdição — disse a subprocuradora.