Escritor Carpinejar lança o livro 'Depois é nunca'
"Depois é nunca", novo livro de Fabrício Carpinejar, tem escrita norteada pelas angústias que formam o luto
“No mesmo cemitério onde repousa a minha avó, em Guaporé (RS), eu já acabei enterrado. E ressuscitei. Não foi uma experiência pós-morte, mas pré-morte”, relata Fabrício Carpinejar em um dos seus textos do recém-lançado “Depois é nunca”, da editora Bertrand Brasil. O breve relato de quem, acidentalmente, caiu numa cova quando criança se junta ao sentimento de empatia por quem perdeu alguém querido durante a pandemia e precisa encarar o luto.
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Numa espécie de híbrido entre crônica e reflexões sobre a perda, a publicação vai se apresentando de maneira leve e tocante por mais de 120 páginas. “Em que eu trabalho as outras perspectivas do luto, que não é a individual. Não estou em homenagem a alguém, mas, sim, me colocando no lugar do outro”, diz, em entrevista à Folha de Pernambuco, durante sua passagem pela 13ª Bienal Internacional do Livro de Pernambuco, contextualizando o tema entre as centenas de milhares de vítimas da Covid-19 no Brasil.
Produção na pandemia
Já em março de 2020, quando a pandemia se instalou, Carpinejar se viu assombrado pela urgência do tema, a ponto de começar a elaborar os primeiros rascunhos da obra. “Então, entra o luto, quando você perde alguém e tem que lidar com aquela ausência. E o paradoxo é: ‘quem está ausente é você’, porque é você quem morre na partida de quem ama. A outra pessoa não vai mais te ligar ou abraçar. Você não sente saudade do outro, mas de si mesmo com o outro”, completa.
O livro compara o luto a uma panela de pressão, em que não se tem como abrir a tampa, mas ainda precisa soltar o vapor aos poucos. Num resgate à realidade, "as pessoas não se despedem sumariamente de alguém, a despedida física pode até ser rápida, mas a interior é lenta", pondera.
Não foi preciso perder alguém diretamente para a Covid, a fim de deixar as emoções sobre o assunto brotarem. Segundo o autor, foram muitos mortos, e não teve quem não se sentisse tocado pelo sofrimento de tantas famílias. Para o leitor, essa empatia pode até não acontecer pela identificação do fato, mas certamente virá pela saudade de alguém.
“A Covid matou os profetas”
Ainda no contexto da ausência, o isolamento social suspendeu os projetos de longo e médio prazo de muita gente. “Essa pandemia trouxe a perspectiva de que só havíamos vivido na infância. Quando pequeno, é como se fosse um único dia interminável, sem noção do futuro, quem traz esse futuro é o adulto ao perguntar ‘o que vai ser quando crescer?’. Mas a criança só se preocupa com o presente. Experimentamos, então, uma infância da humanidade”, reflete.
O improviso e o reconhecimento das próprias vontades foram ganhando espaço ao longo desse tempo. “O que é a ansiedade se não querer ter controle sobre o futuro? Você faz algo esperando ter uma recompensa, reconhecimento ou aplauso e, agora não, precisa fazer porque se gosta”, sentencia o autor, acostumado a discutir tantos conflitos da vida humana, colocando-se no lugar do outro desde pequeno.
Reflexões sobre o agora
Pelo título, “Depois é nunca” também anuncia uma abordagem em torno dos adiamentos. Para Carpinejar, as chances de se concretizar algo adiado é pequena, pois tudo o que é lançado para depois faz parte de uma idealização, um perfeccionismo, um momento mais adequado para tudo, inclusive para se demonstrar afeto.
“Darei prioridade à carreira, porque quem me ama já me conhece, já serei perdoado. No entanto, nossa rotina é feita de momentos imperfeitos. Não existe essa presença sem rascunhos. Não enrole, trate todo mundo como se fosse uma criança querendo brincar ou um idoso querendo passear”, aconselha. A urgência de viver os momentos é mesmo um apelo imponderável nas páginas, numa espécie de convite subjetivo a se fazer presente.
"Depois é nunca"
Editora: Bertrand Brasil
Páginas: 128
Valor R$ 39,90