Mais um avanço para o feminicídio: agora é crime autônomo e inafiançável
Em mais um avanço contra a violência de gênero, no último dia 9 de outubro, o presidente Lula sancionou o Projeto de Lei nº 4.266/2003, que trouxe mudanças significativas no enfrentamento ao feminicídio, tornando-o um crime autônomo e ampliando a pena máxima para 40 anos de reclusão – a maior prevista no Código Penal brasileiro. A independência do feminicídio como crime autônomo significa que ele não precisa mais ser vinculado a outro crime para ser caracterizado, refletindo seu impacto devastador como parte de um ciclo prolongado de violência de gênero. Além disso, a nova lei aumenta as penas para lesão corporal e violência doméstica contra mulheres, tornando o combate a esses crimes ainda mais rigoroso.
Essa nova qualificação do feminicídio representa um avanço crucial para as mulheres e para a sociedade como um todo. O aumento da pena e o reconhecimento do feminicídio como crime hediondo – portanto, inafiançável – robustece ainda mais o sistema jurídico nacional no enfrentamento à violência de gênero. O feminicídio, por sua natureza, é frequentemente o último ato em uma longa trajetória de abusos, muitas vezes normalizada e banalizada socialmente. A nova legislação é um passo importante para romper com essa realidade e atribuir a devida seriedade ao combate a esse tipo de violência.
Além disso, o Pacote Antifeminicídio, como a lei tem sido chamada, prevê a tramitação prioritária dos processos relacionados a esses crimes e estabelece a gratuidade de justiça para as vítimas. O texto também agrava as penas de outros crimes cometidos em contexto de violência de gênero, como lesão corporal, injúria, calúnia e difamação, elevando o tratamento jurídico para comportamentos que muitas vezes são os primeiros sinais de um ciclo que pode culminar em feminicídio.
Anteriormente, o feminicídio era definido como uma forma qualificada de homicídio. Já na nova lei, o feminicídio passa a ser um tipo penal independente e com pena maior. Assim, a pena passa de 12 a 30 anos para de 20 a 40 anos de reclusão.
Outro destaque dessa nova legislação, são os agravantes. Entre eles estão o feminicídio cometido durante a gestação (nos três meses posteriores ao parto ou se a vítima é mãe ou responsável por criança); quando é contra menor de 14 anos, ou maior de 60 anos, ou mulher com deficiência ou doença degenerativa; quando é cometido na presença de pais ou dos filhos da vítima; quando é cometido em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha. O uso de métodos cruéis, como veneno, tortura, emboscada, ou o uso de armas restritas também são considerados fatores que agravam a pena.
Além disso, a nova norma aumenta ainda as penas para os casos de lesão corporal contra a mulher e para os crimes contra a honra – injúria, calúnia e difamação –, para o crime de ameaça e para o descumprimento de medidas protetivas. Ainda de acordo com a nova lei, após proclamada a sentença, o agressor perde o poder familiar, da tutela ou da curatela.
A legislação representa, sem dúvida, um avanço robusto, mas ainda é necessário um contínuo investimento em políticas públicas e em campanhas de conscientização, para que não apenas as penas sejam mais rigorosas, mas que a prevenção e a proteção das mulheres estejam no centro do debate. O feminicídio é um crime com raízes profundas na desigualdade de gênero, e combatê-lo requer ação constante em várias frentes.
* Advogada, mediadora, sócia do Bahia, Lins e Lessa – sociedade de advogadas.
___
Os artigos publicados nesta seção não refletem necessariamente a opinião do jornal. Os textos para este espaço devem ser enviados para o e-mail [email protected] e passam por uma curadoria para possível publicação.