Terminais Integrados são "hostis" e precisam ser repensados, diz especialista
Entrevista encerra série sobre TIs da Região Metropolitana do Recife
Ao longo de cinco reportagens, a Folha de Pernambuco abordou um problema que afeta diretamente a qualidade de vida de milhares de pessoas na Região Metropolitana: as condições de precariedade da maior parte dos Terminais Integrados do Grande Recife. Com base em depoimentos de usuários do transporte público e em observações feitas pela reportagem, a série TI: Próxima Estação trouxe reflexões sobre como determinados problemas – estejam eles relacionados à estrutura dos TIs ou às condições do transporte em si – impactam negativamente o funcionamento do Sistema Estrutural Integrado (SEI).
Cinco dos terminais integrados mais movimentados da rede foram visitados pela reportagem entre março e abril de 2023 (ao todo, a Região Metropolitana do Recife tem 26 TIs distribuídos entre oito cidades). Entre as principais críticas feitas pelos passageiros estão questões estruturais, problemas de organização de filas, superlotação e falta de conforto. Ainda, as reclamações mais frequentes dão conta da irregularidade nos horários e da pouca oferta de ônibus em linhas que possuem alta demanda.
Falta regularidade
De acordo com o especialista em mobilidade urbana Francisco Cunha, da TGI Consultoria, o problema da irregularidade aparece entre os mais citados entre os usuários do transporte rodoviário na RMR. “Para o problema da regularidade – ou seja, do tempo de espera e do cumprimento dos horários previstos dos ônibus – a solução mais imediata é buscar meios para tirar esses coletivos dos engarrafamentos. O principal instrumento para isso é a ampliação e a conexão das faixas exclusivas”, afirmou Cunha, apontando para as faixas azuis como alternativas para garantir a mobilidade dos ônibus em meio a locais onde o trânsito é intenso.
“A cidade do Recife começou a fazer [as faixas azuis], mas ainda falta muito, mais quilômetros de vias exclusivas e a conexão com outras cidades, que garantiria uma continuidade do fluxo. O sistema deveria ser metropolitano e, nesse sentido, não é”, completou Francisco Cunha.
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Para ele, os ônibus, que concentram mais pessoas em menores espaços (em comparação a carros de passeio, por exemplo), devem ter prioridade. “O importante é garantir a chamada velocidade comercial para o transporte coletivo. A conta que se faz é que num espaço em que um ônibus fica travado estão cerca de 100 pessoas para cada uma que fica dentro dos carros”.
Questionado sobre possíveis adaptações nos horários e sobre a possibilidade de reforço na frota destinada a determinadas linhas, o Grande Recife Consórcio de Transporte – responsável pelo gerenciamento do transporte por ônibus na RMR – respondeu que há um monitoramento constante realizado com o intuito de identificar problemas. “A análise da capacidade dos ônibus e da fluidez é realizada rotineiramente e as adaptações implementadas conforme as demandas de cada linha”, disse a empresa por meio de nota.
Ambientes “hostis”
Os usuários que transitam pelos terminais integrados da RMR sabem que não há conforto. Em boa parte deles – como no TI Igarassu, um dos visitados pela Folha –, há sérios problemas de acessibilidade que prejudicam a circulação de Pessoas com Deficiência. Ainda, há questões relacionadas ao acesso a esses equipamentos e diversas queixas feitas por rodoviários sobre a falta de espaços destinados aos profissionais (ao longo do primeiro semestre, a categoria chegou a promover manifestações demandando refeitórios nos TIs Caxangá e Igarassu).
Segundo Francisco Cunha, os TIs são ambientes “hostis”. “Os terminais precisam ser ambientes mais acolhedores, hoje eles são muito ‘áridos’”, comentou.
“É preciso melhorar, sobretudo, os entornos e a estrutura desses equipamentos, garantindo acessibilidade. Geralmente esses terminais são isolados, como é o caso do TI Macaxeira; então para entrar neles sem ser de ônibus é difícil. Isso devia ser alvo de atenção, de modo que esses terminais deveriam ter formas de acesso facilitadas, integradas também com outros meios de transporte”, completou Cunha, apostando na chamada “integração modal”.
BRTs mudaram durante a série
Na visita da Folha ao Terminal Integrado de Camaragibe, as principais reclamações feitas pelos passageiros estavam relacionadas ao sistema de BRTs. Usuários denunciaram a degradação dos ônibus, que, segundo eles, têm falhas elétricas constantes, o que atrasa as viagens e intensifica a irregularidade nos horários. Ainda, houve reclamações sobre a superlotação dos veículos, especialmente em horários mais avançados e de pico, e sobre a falta de refrigeração nos ônibus articulados.
De acordo com o Grande Recife Consórcio, vistorias regulares são feitas nos veículos articulados do sistema BRT que operam em Camaragibe. Em nota, a administradora afirmou que “esse trabalho é realizado de forma sistemática para detectar ajustes e realizar correções, a fim de evitar impactos na operação”. Em abril, em meio à publicação da série TI: Próxima Estação, novos ônibus (não articulados) foram adicionados à frota dos BRTs.
Para o especialista em mobilidade Francisco Cunha, o sistema de transporte via BRTs, que começou a operar em 2014, foi marcado por um “erro relacionado à modelagem do sistema”. A precarização, segundo ele, está relacionada aos altos custos das operações. “O subsídio ficou alto e faltou dinheiro. Como faltou verba, o sistema degradou-se. As estações ficaram degradadas, algumas precisaram, inclusive, ser fechadas; os ônibus começaram a apresentar problemas e as empresas compraram ônibus menores do que os articulados, entre outras questões”.
Posicionamento da Nova Mobi
Após a publicação da última matéria da série TI: Próxima Estação, a Nova Mobi Pernambuco emitiu um posicionamento acerca dos questionamentos feitos pela reportagem.