"A toda hora escutava o barulho das grades batendo", conta diarista presa por engano
Presa por um erro da Justiça de Minas, diarista fala sobre o pesadelo que enfrentou na cadeia ao dividir cela com 24 mulheres
Setenta e duas horas após sofrer uma agressão do companheiro e ter sido presa por engano ao registrar uma ocorrência de violência doméstica na 105ª DP (Petrópolis), na Região Serrana, a diarista Débora Cristina da Silva Damasceno, de 42 anos, ainda guarda no corpo e na memória as marcas da passagem pelo cárcere.
Por um erro, ela teve seus dados pessoais inseridos em um mandado de prisão emitido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais e acabou confundida com uma foragida acusada de tráfico de drogas. A Justiça mineira informou que a corregedoria apura o caso.
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Depois de três dias, Débora deixou a prisão, anteontem, quando a falha foi reconhecida pela Justiça do Rio. Aos prantos, ela mostrava as pernas e os braços cobertos por mordidas de percevejo:
— Tive pesadelo na primeira noite fora da prisão. A toda hora eu escuto o barulho do cadeado e das grades batendo. Fui toda picada por insetos, estou me coçando toda.
A diarista contou ao GLOBO o que passou nos últimos dias:
“No domingo, fui a um churrasco na casa da minha irmã com meu companheiro. A gente bebeu lá. Eu ia dormir na minha mãe. Ele quis ir embora e começou uma discussão. Ele me deu um tapa na cara e começou a puxar meu cabelo. Na rua, me bateu novamente com um soco. Foi a primeira vez que ele me agrediu, mas acabou. Não quero mais.
Chamaram uma viatura policial. Meu companheiro foi embora, e o carro da polícia me levou para a Unidade de Pronto Atendimento. Fui examinada e minha pressão estava alta. Dali, fui levada para a delegacia. Fiz exame de corpo de delito para registrar a violência doméstica.
Logo que terminou a ocorrência, eles (policiais) falaram que eu tinha um mandado de prisão. E que estava recebendo ali a voz de prisão. Disseram que eu estava presa por conta de uma sentença com uma condenação de nove anos e quatro meses por tráfico de drogas e associação para o tráfico. Falaram que o crime foi em Belo Horizonte. Expliquei a eles que nunca havia estado lá, que eu nem sei como se faz para chegar a Belo Horizonte. Eu pedi que olhassem meus dados e checassem o que estava escrito no mandado. Eles disseram que, no documento, além do meu nome, constavam a filiação e o meu CPF.
Na hora, fiquei desesperada. Vi a esposa de um colega meu, que estava entrando na delegacia com uma amiga. Falei; ‘pelo amor de Deus, me ajuda! Liga para minha família e avisa que fui presa injustamente’. Passei a noite toda de domingo no porquinho (cela provisória nas delegacias, onde os presos ficam aguardando remoção). É um espaço quadrado com grades em que você fica esperando até ser transferida para outro local. Não consegui dormir a noite toda.
Na segunda-feira, um policial avisou que minha mãe e minha irmã estavam lá na delegacia. Só então vi as duas. Comecei a falar com elas, mas logo o policial me avisou para eu voltar para o porquinho porque o carro que faria minha transferência já estava lá. Fui algemada e levada para o transporte.
Na hora que saí da delegacia, eu estava sozinha no carro. Quando a viatura parou na 106ª DP (Itaipava), vieram outros presos. Vieram uns dez presos na mesma viatura. Era só eu de mulher. Eu fiquei muito constrangida porque estava usando uma jardineira, curta. Mas, graças a Deus, me respeitaram. Em momento algum falaram algo para me ofender. Eles (os presos) me respeitaram totalmente.
Sem cama
Em Benfica, fiquei de segunda a terça-feira. Fiquei numa cela com 24 mulheres, no chão. Também não consegui dormir, pensando em tudo que havia acontecido comigo. Na audiência de custódia, na terça-feira, meu advogado já chegou com os papéis que comprovavam que eu não era a pessoa que deveria estar presa. Que eu não era a Débora que praticou os crimes em Belo Horizonte. Aí, na mesma hora, o juiz pediu para tirarem as algemas. Fiquei aliviada quando soube que seria solta. Depois, fiquei em uma sala esperando o alvará chegar. Ao voltar para casa, fui recebida com um verdadeiro banquete, tinha até pizza.
Agora não vou voltar para Petrópolis, vou recomeçar a vida aqui (no Rio)”.