Advil para treinar? Veja remédios que viraram febre antes da academia e causam riscos à saúde
Estudos afirmam que a administração de medicamentos sem acompanhamento médico durante o exercício físico pode causar problemas severos ao corpo e prejudica o ganho de músculos e a criação de resistência
A prática de exercícios físicos, principalmente para iniciantes, pode trazer alguns efeitos indesejáveis. É comum sentir o corpo cansado ou dores musculares após sessões extenuantes de atividades aeróbicas e de força. Para completar, os resultados que se pretende alcançar nem sempre vêm no ritmo desejado.
Nas redes sociais, é muito comum ver influenciadores do mundo fitness promovendo o uso de remédios para driblar esse desconforto. São substâncias como a tadalafila, um vasodilatador normalmente usado para tratar disfunção erétil e a hiperplasia da próstata, e o ibuprofeno, um anti-inflamatório que tem efeito analgésico e anti-térmico.
Entretanto, especialistas afirmam que o uso indiscriminado de remédios para turbinar exercícios pode causar prejuízos sérios para a saúde, mesmo no caso de quem tem já tem uma vida ativa.
Leia também
• TRE: Conheça método de exercícios para liberar estresse e trauma
• "Sinto a mesma coisa que quando tinha 50 anos": confira rotina de exercícios de mulher de 92 anos
• Conheça cinco exercícios para melhorar o equilíbrio, habilidade essencial para a longevidade
Ibuprofeno
O ibuprofeno tem sido frequentemente citado por perfis especializados em esporte e atividade física como um aliado na luta contra as dores causadas pelo exercício, principalmente sob o nome comercial de Advil.
O médico do esporte e nutrólogo Eduardo Rauen, que é fundador da plataforma de saúde Lit, do Instituto Rauen e diretor técnico do centro de tecnologia e performance do São Paulo Futebol Clube, afirma que uso sem indicação médica deve ser evitado. Apesar de o ibuprofeno realmente reduzir a sensação de dor, tomar anti-inflamatórios sem prescrição traz riscos diversos para o organismo.
De acordo com o especialista, o uso não regulado de anti-inflamatórios inibe a produção da prostaglandina, substância que protege a mucosa gástrica, responsável pelo processo digestivo.
— Essa produção já é naturalmente reduzida durante a prática de exercícios, então a combinação com a medicação aumenta a sensação de gastrite e as chances de criar uma úlcera ou até um sangramento. — explica.
Além disso, também existe risco para o sistema cardiovascular. Segundo o nutrólogo, o uso de anti-inflamatórios hormonais está associado ao aumento dos números de infarto e AVC, principalmente no caso de pacientes que já tenham uma predisposição.
No caso de pessoas que pratiquem esportes que exijam maior resistência, como corrida ou caminhada, Rauen afirma que também é preciso se preocupar com a hidratação, que é prejudicada pelo medicamento.
— É muito comum que o uso cause desidratação para o paciente que está correndo ou praticando uma maratona. Com essa desidratação, piora a função renal, potencializando uma lesão nos rins, pode chegar até a um quadro de insuficiência renal aguda — afirma.
Além dos riscos à saúde, o anti-inflamatório e analgésico também pode ser um grande vilão para quem faz exercícios como musculação, crossfit ou pilates, já que seu uso após sessões de treino prejudica a hipertrofia muscular. Esse processo natural do corpo envolve um conjunto de inflamações nas fibras do músculo, o que causa o aumento da força e do volume da musculatura.
Tadalafila
A tadalafila, medicamento criado durante o início dos anos 90 para tratar a disfunção erétil e a hiperplasia prostática, uma doença caracterizada pelo aumento exagerado da próstata, começou a ser comercializada sob o nome comercial de Cialis.
No Brasil, a substância tem sido promovida por diferentes influenciadores de musculação como um pré-treino. Nas postagens, eles afirmam que o remédio ajuda na circulação de sangue, o que proporcionaria maior resistência, permitindo a realização de exercícios com mais carga ou mais repetições, e um aumento de volume nas fibras da musculatura, o chamado pump.
Sobre esta prática, Rauen afirma que não existe relação comprovada cientificamente entre o uso da tadalafila e o aumento da resistência física, a não ser em casos bem específicos.
— Existem estudos que apontam que a tadalafila pode ajudar a melhorar o desempenho em regiões de grande altitude, onde há baixa concentração de oxigênio. Essa melhora se dá pelo fato de que um dos efeitos da medicação é a dilatação dos vasos sanguíneos do pulmão — afirma.
Entretanto, o nutrólogo afirma que, mesmo nas condições citadas, o consumo de tadalafila com o intuito de melhorar a performance não é indicado.
— Este benefício para o sistema pulmonar só foi identificado em atletas de altíssimo rendimento. E mesmo no caso de atletas profissionais, o uso não é recomendado, já que é considerado doping pela maioria das entidades reguladoras — complementa Rauen.
De acordo com o urologista Luiz Otávio Torres, que preside a Sociedade Brasileira de Urologia, o uso indiscriminado do remédio pode ter efeitos colaterais, principalmente no caso de pessoas que exageram na dose.
— Como todo medicamento, a tadalafila pode ter efeitos colaterais como dor de cabeça, inchaços no corpo e vermelhidão, mas é uma substância segura quando administrada na dosagem correta e com o acompanhamento de um médico — afirma o urologista.
Alternativas para o uso
Para quem quer ter mais conforto durante a criação de uma rotina de exercícios, existem alternativas para o uso de ibuprofeno, principalmente para evitar o efeito da dor tardia, que é o desconforto muscular gerado nas primeiras 24h após um exercício e que afeta principalmente quem não está condicionado.
Para a dor tardia, é recomendado o consumo de BCAA, um composto de aminoácidos vendido como suplementação para ajudar na recuperação da musculatura.
Também é indicado o aquecimento dinâmico, que consiste em exercícios como polichinelos, elevação dos joelhos, circulação de pélvis e elevação dos membros superiores. A rotina, quando feita antes do treino, pode ajudar a reduzir o desconforto. Depois do exercício, é recomendada a realização de um aquecimento estático, mantendo a posição dos músculos tensionados de 20 a 30 segundos por repetição.
Já para substituir a tadalafila, existem alternativas mais orgânicas. De acordo com Rauen, a melhora na vascularização e o aumento da performance podem ser obtidos com o consumo de nitrato, um nutriente encontrado em abundância no suco da beterraba.
E outros remédios?
Os especialistas afirmam que medicamentos comumente administrados sem acompanhamento, como anti-alérgicos, ansiolíticos e analgésicos também podem gerar efeitos indesejados, mesmo que mais brandos, para quem se esforça na academia, no funcional ou na corrida.
Os ansiolíticos e anti-alérgicos, que são usados para tratar quadros ansiedade e alergia, respectivamente, são mencionados no meio da musculação por seu poder de induzir a sonolência. Mas a administração com essa finalidade não é indicada.
— As pessoas que se interessam pela musculação entendem que dormir é importante para recuperar a musculatura. De fato, ter uma boa noite de sono é algo que melhora a qualidade de vida. O problema é usar de meios artificiais como medicamentos para induzir o sono, o que pode criar dependência. — afirma o preparador físico Marcio Atalla, colunista do GLOBO.
Sobre o uso de analgésicos, Rauen afirma que substâncias como dipirona e paracetamol são mais seguras para administrar a dor causada pelos exercícios do que anti-inflamatórios, mas que anular a sensação dessa dor a todo instante pode não ser uma boa ideia.
— Esse desconforto que a gente sente no músculo, principalmente depois de criar o hábito de fazer exercício, é uma forma do organismo de sinalizar que algo está errado. Se a gente fica constantemente tomando analgésico para mascarar isso, fica mais difícil identificar uma lesão, por exemplo — explica.