Complexo do Alemão: entidades lamentam mortes e cobram investigação do MP sobre atuação das polícias
Elas destacam a falta de política de segurança pública no Rio e o descumprimento de determinação do STF de limitar operações em favelas
A operação no Complexo do Alemão, que terminou com 18 mortos, provocou a reação de entidades que atuam em segurança pública e de defesa dos direitos humanos. Representantes das instituições assinalaram que o estado não tem política de segurança pública e vem realizando ações a despeito de determinação do Supremo Tribunal Federal, que, em 2020, limitou as operações em favelas a casos excepcionais. Eles defenderam que seja feita uma investigação independente da atuação das polícias pelo Ministério Público, tanto estadual como federal.
A advogada Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil, lamentou as mortes e o impacto da operação na comunidade. Ela se mostrou preocupada com informações que sugerem que o número de vítima possa ser maior e com relatos de violação de direitos humanos, como a invasão de casas, tortura e não prestação de socorro a baleados no confronto. Ela lembrou que exercer o controle externo sobre as polícias é uma obrigação constitucional do Ministério Público:
A polícia investigando a polícia não tem resultado eficiente. O Ministério Público, então, deveria promover uma investigação independente, rápida e eficiente, para estabelecer as circunstâncias das mortes e dos ferimentos das pessoas e quem são os responsáveis. Deve haver investigação e responsabilização, quando comprovada atuação excessiva da polícia. A responsabilização é essencial para interromper esse ciclo de violência, que não só afeta moradores da comunidade como os próprios policiais.
Gláucia Marinho, da coordenação da Justiça Global, no Alemão, também pediu que o Ministério Público passe a controlar a ação policial. Gláucia ressaltou, cada vez mais, as operações reúnem um efetivo maior de policiais e equipamentos:
"Para realizar essas operações, usam a narrativa da guerra contra as drogas e o combate ao roubo. Com isso, temos um número grande de mortos, com a justificativa do homicídio decorrente de intervenção policial. Vivemos numa cidade túmulo, onde os índices de violência provocada pela polícia aumentam. Temos uma perspectiva, depois de ouvida a sociedade civil, que haja uma melhora da situação com a construção de um plano de redução de homicídios, também uma determinação Supremo. Mas, para isso, é necessário que o sistema de Justiça cumpra o seu papel."
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"É preciso que o Rio de Janeiro vire a página dessa violência"
A Anistia Internacional divulgou comunicado, cobrando que “o Ministério Público cumpra com seu dever constitucional de exercer um controle externo e participativo do trabalho das polícias, para que a brutalidade não se torne uma constante na política de segurança pública”. Na nota, a Anistia diz ainda que “a ação de segurança pública implementada e praticada pelo governo do estado do Rio de Janeiro tem norteado uma política de eliminação de determinada parcela da população negra, pobre e moradora de favelas e periferias”:
"O morador da favela precisa acordar de manhã para ganhar o seu dia, e não é isso que está acontecendo. É preciso que o Rio de Janeiro vire a página dessa violência imediatamente", afirma Jurema Werneck, diretora-executiva da Anistia Internacional Brasil.
"Não há nenhum plano para o dia seguinte”
Diretor Executivo do Instituto Cidade Segurança e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Alberto Liebling Kopittke enfatizou que a política de segurança do Rio se limita a operações altamente letais para as comunidades. E que "não há nenhum plano para o dia seguinte”:
"O Rio não tem política de prevenção contra a violência; de inteligência para desmantelar grupos criminosos, cortar a lavagem de dinheiro e o abastecimento de fuzis; de integração de jovens das comunidades: e de urbanização dessas áreas. Em nenhum lugar do mundo essa política isolada, essa operação de guerra, conseguiu reduzir a violência. O Rio tem cada vez mais territórios dominados por facções criminosas, mais medo, mais fuzis. Eventualmente, essas operações podem ser necessárias, mas dentro de politica mais ampla."
Para Kopittke, o que o Supremo e o Ministério Público deveriam fazer seria “exigir alguma política de segurança que não seja a da mortandade e responsabilizar os dirigentes que não a implementam”:
" O STF não vai poder manter sua determinação (limitar as operações a casos excepcionais) para sempre. E ela tem sido inócua, porque a polícia do Rio está matando mais, até para desafiar a Suprema Corte."