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Bolívia

Apoiadores de Evo Morales ocupam quartel e mantêm 20 militares na Bolívia como reféns

Onda de protestos tomou o país há 19 dias, com bloqueio de estradas importantes em defesa do ex-presidente, investigado pelo abuso sexual de uma menor de idade

Polícia retira bloqueio de estrada feito por manifestantes que apoiam o ex-presidente Evo Morales, após um confronto em Cochabamba Polícia retira bloqueio de estrada feito por manifestantes que apoiam o ex-presidente Evo Morales, após um confronto em Cochabamba  - Foto: Fernando Cartagena/AFP

Apoiadores do ex-presidente boliviano Evo Morales ocuparam um quartel e fizeram 20 militares de reféns na cidade de Cochabamba, na Bolívia. A informação foi anunciada em comunicado pelas Forças Armadas do país, destacando que armas e munições também foram tomadas por "grupos armados irregulares".

A ação acontece em meio ao cenário de instabilidade política no país, que há 19 dias vê uma onda de protestos maciços e bloqueio de estradas em resposta à suposta "perseguição judicial" contra Evo, que foi de aliado a inimigo do presidente Luís Arce no passado.

“Lembramos que qualquer pessoa que pegue em armas contra a pátria é considerada traição e levante armado contra a segurança e a soberania do Estado”, afirma o comunicado emitido pelo Alto Comando, lembrando que o pessoal mantido como refém “são filhos do povo cumprindo seu dever sagrado com a pátria”.

Cochabamba, que se conecta à capital La Paz, se tornou o centro dos protestos que tomaram a Bolívia. Camponeses e mineiros, que apoiam Evo, bloquearam vários quilômetros de estrada com pedras, troncos e fogueiras e dizem que estão preparados para uma “resistência” de semanas e até meses para defender o ex-presidente, investigado por supostamente ter abusado de uma menor de idade durante seu mandato (2006-2019), acusação que ele nega.

Muitos manifestante usam estilingues — ou huaracas, como são conhecidos em quíchua, idioma indígena local — para atirar pedras nas cabeças das forças de segurança. Desde o início dos protestos, 61 policiais e nove civis foram feridos em confrontos, vários com lesões cerebrais traumáticas, de acordo com informações oficiais.

— Essa é nossa arma secreta (...), herança de nossos avós — disse Carlos Flores, um agrônomo de 45 anos, à AFP, afirmando que entre os manifestantes há jovens camponeses “especializados” nessa prática.

Vestido de preto e usando uma faixa no queixo, 'Choque' é um deles. Quando a pedra é atirada, sua huaraca faz um estalo alto e o projétil voa cerca de 100 metros.

Em todo o país, há cerca de 20 pontos de bloqueio, principalmente no departamento de Cochabamba, na região central da Bolívia.

Mas agora os manifestantes também estão exigindo a renúncia do presidente Luis Arce, que não encontrou uma saída para a crise econômica decorrente da escassez de moeda estrangeira.

Arce exigiu na quarta-feira “o levantamento de todos os pontos de bloqueio”. Caso contrário, acrescentou, ele “exerceria seus poderes constitucionais” para expulsá-los.

“Se ele trouxer seus militares, estamos prontos para lutar. Vamos continuar até que ele (Arce) renuncie 'a huaracazo limpio'”, diz Flores.

Nas colinas rochosas que cercam Parotani, dezenas de sentinelas observam o horizonte para alertar sobre qualquer movimento.

O objetivo da polícia é liberar a ponte para permitir o trânsito de veículos pesados que fornecem alimentos e combustível para Cochabamba, onde o aumento dos preços está atingindo consumidores e comerciantes.

Durante a espera, a pastora Nicolasa Sánchez, 59 anos, que fala quíchua, enrola fios de lã de ovelha entre os dedos dos pés descalços e trança novas huaracas.

Ela faz cerca de três por dia. Quase todos os manifestantes têm uma. Eles as giram como hélices enquanto marcham sobre a estrada bloqueada.

“Nossas huaracas podem ser milhares. Nossa pedra nunca vai se esgotar”, diz Juanita Ancieta, líder da Central de Mujeres Campesinas Bartolina Sisa.

Há uma semana, em Parotani, um policial quase perdeu o pé. O presidente Arce afirmou que ele foi atacado com dinamite.

De tempos em tempos, explosões estrondosas são ouvidas na área. Mas os líderes afirmam que não têm explosivos.

“Pedimos às forças armadas e à polícia que não ataquem seu povo (...) que não manchem suas mãos com nosso sangue”, diz Mariluz Ventura, representante de um sindicato de camponeses indígenas.

Uma cidadela surge ao redor da ponte Parotani. Surgiram pequenas lojas vendendo roupas, acessórios para celulares e até vinagre para combater os efeitos do gás lacrimogêneo.

Do outro lado da ponte, com paus e lonas de plástico, foi montado um acampamento com manifestantes de outros lugares.

“Este é o quartel-general. Cochabamba é o coração de toda a Bolívia, por isso este é o local do maior bloqueio nacional”, diz Constancio Vallejos, um agricultor de 37 anos que veio do Trópico de Cochabamba com uma delegação de jovens agricultores.

Humberto Alegre, 31 anos, dirige uma das várias organizações que levam alimentos aos manifestantes. Ele diz que só ele entrega cerca de 500 rações por dia.

A cidade está sem eletricidade há quatro dias, reclamam os manifestantes. Sem bombas motorizadas, eles sobrevivem com a água do rio.

“Nós vamos resistir. Essa é a luta que começamos. Iremos até o fim”, diz Flores, segurando sua huaraca nas mãos.

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