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Após obter 'remédio mais caro do mundo' com ajuda de doações, Marina, 1, vive nova rotina

Dias após a aplicação do medicamento, Marina já apresentou melhora nos movimentos

Após obter 'remédio mais caro do mundo' com ajuda de doações, Marina, 1, vive nova rotinaApós obter 'remédio mais caro do mundo' com ajuda de doações, Marina, 1, vive nova rotina - Foto: Arquivo Pessoal

Marina Moraes de Souza Roda, de um ano e 11 meses, tem duas datas para comemorar: 1º de setembro, quando nasceu, e 7 de agosto, quando recebeu no Hospital Israelita Albert Einstein a dose única do medicamento Zolgensma, indicado para o tratamento de AME (Atrofia Muscular Espinhal) tipo 1, considerado o mais grave.

A AME é uma doença rara causada por uma alteração do gene responsável por codificar a proteína necessária para o desenvolvimento adequado dos músculos. A doença, portanto, causa fraqueza, hipotonia, atrofia e paralisia muscular progressiva. O tipo 1 acomete de 45% a 60% do total de portadores da doença e pode levar à morte.

Dias após a aplicação do medicamento, Marina já apresentou melhora nos movimentos, o que devolveu o sorriso ao rosto dos pais, Renato Moraes de Souza, 36, e Talita Daiane Souza Roda, 32. Os dois são formados em administração de empresas e trabalham como gerentes comerciais. Casaram-se em setembro de 2017 e descobriram a gravidez no dia 31 de dezembro daquele ano.

"A Marina é um presente que nós ganhamos. Por meio dela, vamos ajudar outras crianças. É a missão de vida mais relevante que nós temos, uma causa que precisamos olhar", diz Renato. Segundo ele, após receber a medicação a bebê começou a fazer movimentos que antes não conseguia executar. "Eu a deixo no chão e ela nunca tinha virado como quem vai rolar. Ela fez isso há três dias e rolou. Estava de barriga para cima e virou de bruços sem a ajuda de ninguém. Cada coisa nova que a Marina faz nos enche de felicidade", conta.



Um vídeo publicado em rede social mostra a bebê em pé, encostada num sofá. Sem dificuldade, Marina segura um brinquedo na mão e empurra um celular para o chão. Além de tomar a medicamento, a bebê faz fisioterapia respiratória e motora diariamente, e os pais pretendem matriculá-la também na hidroterapia.

Talita e Renato já retomaram suas atividades profissionais, mas, além de trabalharem e cuidaram da filha, dedicam parte do dia para ajudar na campanha de outras crianças que têm o mesmo problema. Os pedidos de ajuda e de lives não param de chegar. "Acho que as coisas se tornaram mais fáceis porque consegui ajudar a minha filha, dar a melhor oportunidade para a Marina. Se a gente doar um pouco do nosso tempo, conseguiremos tornar o mundo melhor. Tento conciliar isso com a consciência da responsabilidade que eu tenho como mãe da Marininha, de uma criança especial portadora de AME", diz Talita.

A doença de Marina, descoberta quando ela tinha oito meses de idade, virou a vida da família de ponta-cabeça. Foram várias consultas a diferentes pediatras até que o diagnóstico certeiro viesse. "O dia mais difícil da nossa vida foi quando pegamos o exame e vimos que ela tinha a doença", conta Renato.

Ele e Talita decidiram, então, começar uma campanha para arrecadar o valor do tratamento com o Zolgensma, cuja dose custa US$ 2,125 milhões (cerca de R$ 12 milhões) nos Estados Unidos. Para isso, abriram no Instagram o perfil @cureamarina.

O dia a dia da campanha e da Marina estão na rede social. A campanha teve o engajamento da empresa onde o casal trabalha, que não quer ter o nome divulgado, dos amigos, da família, do Corinthians e de personalidades como o DJ Alok, a apresentadora Sabrina Sato e o ex-jogador e empresário Ronaldo. Renato e Talita também mobilizaram 35 grupos de voluntários, num total de 700 pessoas. Em dez meses, o casal conseguiu arrecadar o dinheiro para o tratamento da Marina.

Por causa da pandemia, o casal pleiteou um abatimento no valor do tratamento. Além disso, houve isenção do imposto de importação pelo governo federal e do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) pelo governo do estado de São Paulo para a aquisição do medicamento.

Dessa forma, sobraram R$ 2,5 milhões do montante arrecadado. O casal afirma que em 1º de setembro, quando Marina completará dois anos, divulgará como o dinheiro será doado. Talita adianta que uma parte será usada para a reabilitação da Marina e outra será destinada ao Iname (Instituto Nacional da Atrofia Muscular Espinhal). O dinheiro ainda será repartido entre outras campanhas e crianças com AME e outras doenças raras. "O dinheiro que sobrou não é nosso. Foi uma arrecadação. A ideia é pegar esse recurso e ajudar as famílias que passam pela mesma situação", diz ela.

"O nosso pedido enquanto família e comunidade AME é aproveitar o mês de agosto, da conscientização da AME no Brasil, para pedir ao governo que o teste genético que identifica a AME seja feito junto com o teste do pezinho nas redes pública e particular. Quanto mais cedo a doença for diagnosticada, melhor. Nós poderíamos ter descoberto a doença da Marina quando ela nasceu e isso faria diferença em sua vida hoje. É uma luta que nós travamos", diz Renato.

Dias após a aplicação de Marina, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) aprovou uso o medicamento para o tratamento do tipo 1, em crianças de até dois anos, no Brasil. O registro do Zolgensma, da empresa Novartis Biociências S. A, foi publicado em 17 de agosto do Diário Oficial da União. Segundo a Anvisa, o remédio pode melhorar a sobrevivência dos pacientes, reduzir a necessidade de ventilação permanente para respirar e alcançar marcos de desenvolvimento motores.

No mês passado, o presidente Jair Bolsonaro comemorou em suas redes sociais após após zerar a alíquota de importação do medicamento. Embora a aprovação tenha sido saudada pelo caráter humanitário, técnicos da área de saúde afirmaram na ocasião que era perigoso zerar a alíquota de importação de um medicamento que ainda não havia sido aprovado pela Anvisa.

Fontes na agência também alertam para o impacto que a autorização do medicamento pode ter no SUS, já que é mais provável que pacientes ingressem na Justiça em busca do tratamento pela rede pública. O número de ações judiciais relativas à saúde no Brasil aumentou 130% entre 2008 e 2017, um crescimento muito mais rápido que o observado no volume total de processos (50%).

Ainda não é possível determinar se o Zolgensma vai chegar ao Brasil pelo valor de mercado que tem nos Estados Unidos. O preço será posteriormente discutido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos, composta também pelos Ministérios da Justiça, Economia e Saúde.

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