Arce assumirá as rédeas de uma Bolívia polarizada e em crise econômica
Novo presidente deverá assumir o cargo na primeira quinzena de novembro
O esquerdista Luis Arce assumirá as rédeas de uma Bolívia polarizada e em crise econômica, após obter uma vitória contundente nas urnas neste domingo, que abre as portas para o retorno ao país de seu mentor político, Evo Morales. Apesar da ausência de resultados oficiais significativos até o momento, devido ao avanço lento da apuração dos votos, as projeções que davam a vitória a Arce foram reconhecidas por seus adversários.
"A Bolívia recuperou a democracia. Quero afirmar, sobretudo aos bolivianos, recuperamos as esperanças", disse Arce, chamado por seus seguidores de 'Lucho' em uma entrevista coletiva ao lado de seu vice-presidente, David Choquehuanca, que foi chanceler de Morales (2006-2019).
'Voz de Deus'
De seu exílio em Buenos Aires, Morales expressou nesta segunda-feira que "cedo ou tarde" voltará à Bolívia, o país com a maior proporção de população indígena da América Latina (41%). "O meu maior desejo é voltar à Bolívia e entrar em minha região. É questão de tempo", afirmou Morales, que tem ordem de prisão pendente na Bolívia por suposto "terrorismo".
O ex-presidente conservador Jorge Quiroga, que, como a presidente interina, Jeanine Añez, retirou sua candidatura a alguns dias da eleição para facilitar uma frente anti-Morales, tuitou: "Duro amanhecer para os que lutamos por 15 anos" contra o ex-presidente do Movimento ao Socialismo (MAS).
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No entanto, para José Carlos Quispe, um trabalhador de 52 anos, "esses dez meses (de governo de Añez) mostraram ao povo que a direita é inoperante, inútil para governar". "O povo decidiu, e a voz do povo é a voz de Deus, não?", questionou.
Líderes latinos, como o argentino Alberto Fernández, o venezuelano Nicolás Maduro e o peruano Martín Vizcarra, além de representantes de órgãos internacionais, como OEA e ONU, saudaram a vitória de Arce.
O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, destacou que as eleições foram "pacíficas e altamente participativas", e convocou os bolivianos a se comprometerem "com a democracia, o respeito aos direitos humanos e a reconciliação nacional".
"O presidente Trump e os Estados Unidos esperam trabalhar com o governo eleito boliviano nos interesses compartilhados de nossos cidadãos", disse o chefe da diplomacia americana para a América Latina, Michael Kozak.
Arce também recebeu felicitações de Luis Almagro, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), entidade cujo relatório sobre as eleições de 2019 estimulou protestos que levaram à renúncia de Morales, após uma polêmica nova reeleição. "O povo da Bolívia se expressou nas urnas. Parabenizamos Luis Arce e (o futuro vice-presidente) David Choquehuanca, desejando sucesso em seus trabalhos futuros", disse Almagro no Twitter.
De acordo com o canal de televisão Unitel, Arce venceu no primeiro turno da eleição presidencial com 52,4% dos votos, contra 31,5% de Mesa. A fundação 'Jubileo' aponta Arce com 53% dos votos e Mesa com 30,8%.
O Supremo Tribunal Eleitoral indicou que o novo presidente deverá assumir o cargo na primeira quinzena de novembro.
'Teremos riqueza'
Economista, Arce, 57, estudou na Universidade Mayor de San Andrés, em La Paz, e fez mestrado na universidade britânica de Warwick. Trabalhou por 18 anos no Banco Central e foi ministro de Economia e Finanças por quase todo o período Morales, tendo um perfil mais técnico do que político.
Durante a presidência de Morales, a Bolívia elevou o Produto Interno Bruto (PIB) de 9,5 bilhões de dólares anuais a 40,8 bilhões e reduziu a pobreza de 60% a 37%, de acordo com dados oficiais.
"Arce era um grande ministro. Agora, como presidente, a economia ficará muito bem. Teremos cinco anos de riqueza", declarou à AFP a estudante Ada Mary Medrano, 18 anos. Mas o novo presidente herdará uma economia fortemente atingida pela crise do novo coronavírus, com uma contração prevista do PIB de 6,2% em 2020.
Quase 7,3 milhões de eleitores estavam registrados para votar, numa jornada em que também se renovariam as 166 cadeiras do Congresso, bicameral, onde também se prevê uma vitória do MAS.