eleições argentinas

Argentina: candidato faz campanha de medo para tentar conter onda a favor de radical direita

Ministro da Economia, Sergio Massa, diz que milhões de pessoas passarão a engrossar a fila de pobres e perderão benefícios sociais caso Milei vença

Sergio Massa, ministro da Economia da ArgentinaSergio Massa, ministro da Economia da Argentina - Foto: Divulgação

Num cenário profundamente adverso e com especulações de uma eventual vitória contundente do candidato da extrema direita, Javier Milei, no primeiro turno da eleição presidencial argentina, no próximo dia 22 de outubro, o candidato do governo, o ministro da Economia, Sergio Massa, partiu para uma agressiva campanha do medo como principal estratégia eleitoral. Com o apoio dos principais sindicatos do país, Massa está buscando instalar na sociedade argentina a ideia de que se houver uma mudança de governo, milhões de pessoas passarão a engrossar a fila de pobres e perderão benefícios sociais, entre eles os subsídios de serviços públicos.

O candidato da Casa Rosada — na prática, quem toma as principais decisões de governo no país — aproveita cada ato de campanha para semear o medo entre os argentinos afirmando, por exemplo, que se perder a eleição a passagem mínima de ônibus passará de 52,96 pesos (R$ 0,37) para 700 pesos (R$ 5). Já a passagem de trem, diz Massa, aumentaria de 33,29 pesos (R$ 0,23) para mil pesos (R$ 7,14). Integrantes do sindicato dos ferroviários repetem o discurso do candidato governista com megafones em estações de trem da capital e da província de Buenos Aires.

"Não pensam apenas em privatizar o sistema ferroviário [Milei já disse que privatizaria as empresas estatais], mas também em eliminar a ajuda estatal no valor das passagens. Façam as contas, pensem na vida de cada estudante, aposentado, trabalhador" declarou recentemente o ministro e candidato, e alfinetou: — Uma coisa é ouvir palavrinhas simpáticas em canais de TV, outra bem diferente é transferir isso para a vida real das pessoas.

Nas redes sociais, a Juventude Nacional da União Ferroviária lançou uma campanha alertando sobre o impacto das propostas de Milei. “As iniciativas que poderiam acontecer se Milei for eleito buscam acabar com o setor ferroviário (no passado, pilar da economia nacional)”, diz um dos vídeos divulgados pelo sindicato.

Favorito nas pesquisas
As últimas pesquisas divulgadas no país indicam que o candidato da extrema direita, admirador dos ex-presidentes Jair Bolsonaro e Donald Trump, é favorito para o primeiro turno, e venceria um eventual segundo turno em todos os cenários. O mais provável é que, se a eleição não for definida em 22 de outubro, no segundo turno, previsto para 19 de novembro, a disputa será entre Milei e Massa. A candidatura da ex-ministra Patricia Bullrich, da aliança Juntos pela Mudança, perdeu força e corre o sério risco de ficar de fora da queda de braço final.

Prevendo esta hipotética possibilidade, Massa está buscando aliados por fora do peronismo, na tentativa de criar uma frente antiMilei, similar à que existiu na eleição presidencial brasileira de 2022 contra Bolsonaro. Mas as circunstâncias políticas são muito diferentes, aponta Ignácio Labaqui, professor da Universidade Católica Argentina (UCA).

"Tenho sérias dúvidas sobre o sucesso da estratégia de Massa. O que vemos é uma discussão entre políticos de gerações mais antigas, e os mais jovens, que votam em massa em Milei, estão fora disso" afirma Labaqui.

Para o professor da UCA, que analisou todas as eleições presidenciais na América Latina entre 1978 e 2022 e constatou que nenhum representante de um governo com inflação acima de 100% conseguiu eleger-se presidente, as chances de Massa são muito baixas.

"Não vejo uma frente anti-Milei como a que existiu anti-Bolsonaro. Acho que muitos eleitores de Bullrich, num eventual segundo turno, votarão no candidato da extrema direita" frisa Labaqui.

Ciente de suas fraquezas, Massa está numa cruzada frenética para obter mais votos. O candidato peronista dá poucas entrevistas e, segundo seus colaboradores, “só pensa em subir nas pesquisas”. O ministro-candidato conseguiu que mais de 20 diplomatas assinassem um documento a favor de sua candidatura e da defesa “de uma política exterior pragmática e ao serviço do interesse nacional”.

"Perdidos e impotentes"
O embaixador da Argentina na Espanha, Ricardo Alfonsín, da opositora União Cívica Radical (UCR), que integra a aliança opositora Juntos pela Mudança, gravou um vídeo pedindo votos para Massa e abrindo mais uma frente de conflito dentro da coalizão que tem Bullrich como candidata presidencial. O apoio de Alfonsín é simbólico, já que o embaixador é filho do ex-presidente Raúl Alfonsín (1983-1989), primeiro chefe de Estado eleito democraticamente após a última ditadura militar (1976-1983).

"Vejo um sistema que não sabe o que fazer com o candidato antissistema mais competitivo que já existiu na Argentina" avalia Juan Negri, professor da Universidade Di Tella. "As campanhas estão perdidas e se mostram impotentes diante de algo ainda desconhecido."

O debate entre candidatos a vice-presidentes, realizado na última quarta-feira, mostrou o quanto o sistema político está, de fato, perdido e sem capacidade de enfrentar a onda a favor de Milei. O desempenho de sua candidata a vice, a advogada Victoria Villarruel, foi, segundo vários analistas ouvidos pelo GLOBO, amplamente superior ao de seus adversários.

Com uma surpreendente capacidade oratória, Villarruel atacou principalmente o companheiro de chapa de Massa, o chefe de Gabinete, Agustín Rossi, a quem acusou de viver “numa galáxia desconhecida”, e ignorar que existem 40% de pobres, 20% de indigentes:

"Você vive num planeta no qual você tem um salário seguro, trabalha no Estado há mais de 20 anos e não tem consciência do que está passando o povo argentino" disparou.

O contra-ataque de Rossi foi lembrar que Villarruel já se reuniu com ditadores como Jorge Videla, já falecido, e outros membros do regime militar. A companheira de Milei já tinha a resposta preparada, e lembrou que os encontros fizeram parte de uma pesquisa para escrever um livro.

Ditadura, privatizações, empobrecimento e perda de direitos sociais. Esses são alguns dos elementos da campanha de medo liderada por Massa que, até agora, não está rendendo bom frutos.

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