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Liberdade de expressão

Ataques e 'fake news' rebaixam Brasil em ranking de liberdade de expressão

Em 86º lugar no ranking, o Brasil foi o país latino-americano que mais perdeu pontos frente ao relatório de 2019

Jair Bolsonaro é conhecido por também atacar a imprensaJair Bolsonaro é conhecido por também atacar a imprensa - Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Nos últimos dez anos, o Brasil foi o país da América Latina que mais regrediu em termos de liberdade de expressão, com campanhas de desinformação chanceladas pelo governo federal e ataques à imprensa que não eram vistos desde a ditadura militar (1964-1985). A avaliação é da ONG Artigo 19, que publica hoje (29) o Relatório Global de Expressão com dados de 2020 relativos a 161 países.

Em 86º lugar no ranking, o Brasil foi o país latino-americano que mais perdeu pontos frente ao relatório de 2019. Pelo segundo ano consecutivo, é visto como um local "restrito" à liberdade de expressão, classificação observada pela ONG como um alerta à democracia.

"Nos últimos cinco anos, o Brasil deixou de ser um dos países com maior pontuação mundial [de liberdade de expressão] para ser considerado uma crise de democracia e expressão - e agora também uma crise de saúde pública. O Brasil é a perfeita avalanche contemporânea de problemas de expressão: populismo autocrático, desinformação, desigualdade severa e controle tecnológico. A pandemia consolidou as tendências observadas no último ano", diz trecho do relatório.

Em outro documento publicado este ano, a Artigo 19 já havia alertado para as práticas de desinformação utilizadas pelo governo de Jair Bolsonaro (sem partido) para confundir a população sobre temas sensíveis à administração, como o combate à pandemia da Covid-19. A privação à informação de interesse público, como o apagão de dados sobre casos e mortes de coronavírus que levou à formação do consórcio de veículos de imprensa, é vista como um dos indícios de queda na liberdade de expressão do país.

"Muitos governos pareceram mais interessados em controlar a narrativa do que em controlar o próprio vírus", afirma o Relatório Global de liberdade de expressão.
 



A ONG calcula que, durante o ano de 2020, Bolsonaro emitiu 1.682 declarações falsas ou enganosas - média de 4,3 declarações por dia - e defendeu tratamentos sem eficácia comprovada contra o coronavírus em pelo menos 28 ocasiões. Levantamento feito pelo UOL Confere mostrou que, ao falar sobre a pandemia em um intervalo de três meses entre março e junho, Bolsonaro deu ao menos 30 declarações falsas, 14 sem contexto ou distorcidas e seis imprecisas.

A Artigo 19 também registrou 464 ataques à imprensa, feitas tanto pelo presidente quanto por políticos próximos. Muitos ocorreram de forma virtual e tiveram jornalistas mulheres como alvo. Recentemente, o advogado de Bolsonaro, Frederick Wassef, enviou mensagens atacando a colunista do UOL Juliana Dal Piva.
"Esse nível de agressão pública não era visto desde o fim da ditadura militar. A crescente hostilidade social contra jornalistas e seus efeitos desencorajadores não devem ser subestimados", afirma o relatório.
Liberdade de expressão cai em todo o mundo

O relatório aponta que 4,9 bilhões de pessoas - cerca de dois terços da população mundial — vivem em países que foram classificados como ambientes altamente restritos ou em crise quanto à liberdade de expressão. Os lugares mais bem cotados são Dinamarca, Suíça, Noruega, Suécia e Finlândia. Os de pior desempenho são China, Síria, Turcomenistão, Eritreia e Coreia do Norte.

Para criar o ranking, a Artigo 19 atribui aos países notas que vão de 0 a 100; quanto maior a nota, maior a liberdade de expressão no país. Os valores são calculados a partir de 25 critérios, que incluem censura online, assédio a jornalistas, liberdade religiosa, leis de acesso à transparência e liberdade de expressão para homens e mulheres.

Desde o ano passado, o Brasil se encontra na categoria "restrita", junto de nações como Mianmar (97º), Quirguistão (95º), Haiti (82º) e Afeganistão (79º). Na América Latina, o Uruguai (9º) e a Argentina (21º) foram as nações que melhor pontuaram.

A métrica foi reformulada em relação aos anos anteriores para incluir medidores relativos à covid-19. Para facilitar as comparações, a ONG recalculou as pontuações dos países nos últimos dez anos de acordo com o novo índice. Com isso, a pontuação do Brasil no ano passado, que foi de 46, passa a ser 54.

O relatório comparou a mudança de posição dos países no ranking nos intervalos de um ano (entre 2019 e 2020), de cinco anos (2015 a 2020) e dez anos (2010 a 2020).

Apesar de estar à frente de outros países da América Latina no ranking - como Bolívia (87º), Venezuela (138º), Nicarágua (140º) e Cuba (152º), o Brasil foi o que mais perdeu pontos no índice nos últimos dez anos. Com redução de 36 pontos, o país teve maior redução que Nicarágua (-31), Bolívia (-25), El Salvador (-23) e Venezuela (-20).

Em comparação ao resto do mundo, nos últimos cinco anos o Brasil só não perdeu mais pontos (-33) do que Hong Kong (-34). Já no cálculo dos últimos dez anos, o Brasil ficou atrás apenas de Hong Kong (-47) e Índia (-38).

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