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AGRICULTURA ESPACIAL

Brasil aposta em projeto de agricultura espacial, mas recursos para viagem à Lua ainda são entrave

Consórcio internacional quer participação brasileira em fase teste de lançamento de robô que pode minerar asteroides

LuaLua - Foto: Reprodução/Unsplash

Às vésperas de sediar o 5° Encontro de Líderes das Economias Espaciais do G20 (Selm, na sigla em inglês), que começa na quarta-feira, o Brasil faz planos de ir à Lua e quem sabe se juntar ao seleto grupo de países que já conseguiram pousar no satélite natural da Terra.

Em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a Agência Espacial Brasileira (AEB) está investindo no desenvolvimento de um programa de cultivo agrícola em ambiente lunar que visa integrar os Acordos Artemis, um esforço multilateral de exploração pacífica do espaço liderado por Washington e do qual Brasília é signatário.

Os acordos não são vinculativos, mas servem como iniciativa de cooperação entre as partes. O objetivo dos americanos é ter uma plataforma permanente na Lua até 2025 e a partir daí expandir a exploração espacial para Marte e além. Para isso, porém, é preciso não apenas planejar missões tripuladas complexas, como também garantir a manutenção da vida humana em ambiente lunar por um longo período de tempo, algo inédito e que requer a produção local de recursos como energia, oxigênio, infraestrutura e comida.

 

Foi aí que o Brasil enxergou uma oportunidade.

— Quando assinamos os Acordos Artemis, em 2021, começamos a buscar projetos com os quais o país poderia contribuir e chegamos a três pilares: ciência, agricultura e mineração — destaca Marco Antonio Chamon, presidente da AEB.

Segundo ele, a proposta brasileira veio em dose dupla: a construção de um pequeno satélite de exploração da Lua, o SelenITA, que já está sendo viabilizado através de uma parceria entre a Nasa, a agência espacial dos EUA, e o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) do Brasil; e o desenvolvimento de um projeto de agricultura espacial, valendo-se da grande experiência agrícola do país.

— [A agricultura espacial] não é uma área exclusiva do Brasil, mas há poucas pessoas trabalhando nisso e não há nenhum país hegemônico na área — defende.

A parceria entre Embrapa e AEB foi firmada em novembro após um ano de negociações. De lá para cá, criaram uma rede de pesquisadores ligados a mais 10 universidades nacionais, a Space Farming Brazil (Agricultura Espacial no Brasil); selecionaram os primeiros cultivares que serão testados na Lua, o grão-de-bico e a batata doce, fontes importantes de proteína e energia; e definiram as técnicas de plantio, hidroponia e aeroponia, que são o cultivo na água e no ar, respectivamente, sem uso de solo.

O projeto foi dividido em duas partes: a primeira será dedicada aos estudos na Terra, enquanto a segunda será voltada para os testes no espaço, provavelmente com uso de robôs. Ao todo, a AEB estima que deve levar entre 10 anos e 15 anos para concluir a entrega, cujo orçamento garantido, por enquanto, é de apenas R$ 20 milhões para os primeiros quatro anos.

Para uma agência estatal cujo montante anual gira em torno de pouco mais de R$ 100 milhões, a viabilização de uma viagem à Lua é o grande X da questão.

— É um orçamento inicial bastante modesto, apenas para estruturar a rede de pesquisadores e fazer alguns estudos internos em laboratório. À medida que o projeto for crescendo, a gente vai alavancando outros recursos — pondera o presidente da agência. — Ciência toma tempo, não acontece do dia para a noite.

Na mesma época em que lançou a iniciativa agrícola, a Agência Espacial Brasileira recebeu uma proposta inesperada: um convite para participar de um consórcio internacional com representantes do Reino Unido, Japão e Suécia. O grupo, liderado pela empresa privada britânica Asteroid Mining Corporation (AMC), desenvolveu um robô em formato de aranha para minerar asteroides e está em busca de parceiros para seu teste piloto, que envolve uma missão à Lua.

De acordo com Chamon, o Brasil daria apoio logístico à missão por meio de comunicação (recebimento de dados em terra) e rastreamento do foguete e do robô. Em contrapartida, teria acesso à tecnologia utilizada, além de ganhar visibilidade internacional. A agência, afirma, tem grande interesse em enveredar pela área de robótica espacial para remover lixo do espaço e evitar colisões com satélites brasileiros, que podem sofrer avarias ao impactar com objetos de apenas 1 cm — hoje, só é possível rastrear pedaços maiores que 10 cm.

As conversas foram positivas até o momento, dizem fontes da AEB e da AMC, mas faltam recursos do lado brasileiro para levar o assunto para uma mesa de negociação. O país já apoiou a Índia em missões para a Lua, mas, segundo Chamon, as especificações técnicas demandadas pela Swedish Space Corporation, a empresa de dados suecas que integra o consórcio internacional, estão além das capacidades do Brasil — nossas antenas de recepção são menores do que o necessário.

O Brasil tem uma posição geográfica estratégica para a missão. Como a maior parte das estações espaciais do mundo está concentrada no Hemisfério Norte, o país oferece a maior porção de terra ao Sul do Equador para observação do lançamento e rastreamento da espaçonave, explica o presidente da AEB. Em parte por isso, a mesma proposta foi feita a Argentina, Chile e África do Sul. Mas as conversas também não avançaram.

Procurada, a AMC não informou valores, mas disse que tem como parâmetro a missão Chandrayaan-3 da Índia, que custou US$ 75 milhões em 2023, três vezes o orçamento da AEB este ano. Segundo Celso Merege, representante comercial do consórcio na América Latina, o investimento pode variar de acordo com o prazo de entrega, o tempo de duração e os objetivos da missão. Apenas para planejar o lançamento seriam necessários cerca de três anos, ou seja, se o Brasil começasse agora, poderia ir à Lua em 2027 ou 2028, afirma.

— O Brasil é o único país dos BRIC [grupo originalmente formado por Brasil, Rússia, Índia e China] que ainda não foi à Lua — disse Mitch Hunter-Scullion, CEO da AMC. — Pode demorar dois, três ou quatro anos, mas [participar do consórcio espacial] será benéfico para o país, criará empregos, trará investimentos, novas oportunidades para engenheiros e cientistas brasileiros e, o mais importante, inspirará a nação.

Para especialistas como o geógrafo Ronaldo Carmona, do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), e o astrônomo Jorge Carvano, do Observatório Nacional, é de interesse do Brasil conduzir experimentos na Lua e ter acesso a tecnologias estratégicas como robótica espacial. Mas é preciso “olhar no detalhe” a proposta e ver se está alinhada ao programa espacial nacional, tendo em vista seus recursos reduzidos, ponderam.

— Se quiser, o Brasil tem recursos para participar de uma iniciativa como essa, mas é preciso avaliar quais são as prioridades da Agência Espacial Brasileira. Hoje eu não diria que é ir à Lua — afirma Carmona. — O país está investindo em construir seus próprios satélites e veículos lançadores para garantir autonomia no espaço.

Atualmente, há três satélites brasileiros em órbita, dois deles construídos em parceria com a China e outro totalmente nacional, o Amazônia 1, que desde 2021 monitora o desmatamento no país. O Brasil está desenvolvendo dois satélites com a Argentina para monitorar recursos hídricos, oceanos e umidade do solo, com previsão de lançamento para 2026; e outros dois com a China, um de imageamento feito com radar, capaz de penetrar nuvens, para 2028 e um geoestacionário, geralmente usado nas comunicações, para 2030. Apesar de sua excelência meteorológica, o país usa majoritariamente dados de satélites estrangeiros em suas análises, que afetam desde o dia a dia das pessoas à safra agrícola.

— Ninguém descartou nada, mas não tem nada assinado em pedra. Ainda não temos certeza se os investimentos necessários valeriam a pena a participação brasileira — conclui Chamon.

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