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Brasil se mostra "frágil" para conter garimpo ilegal, diz presidente da Funai

Ao menos 30% do ouro extraído entre janeiro de 2021 e junho de 2022 no Brasil pode ser considerado irregular

Brasil se mostra "frágil" para conter garimpo ilegal, diz presidente da FunaiBrasil se mostra "frágil" para conter garimpo ilegal, diz presidente da Funai - Foto: Evaristo Sá / AFP

Apesar da grande operação ordenada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para expulsar os garimpeiros da Terra Indígena Yanomami, o Brasil enfrenta dificuldades para conter o tráfico de ouro, admite à AFP Joenia Wapichana, primeira indígena a comandar a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

Chefiar a entidade responsável por demarcar, vigiar e promover o desenvolvimento das terras indígenas não foi o primeiro feito de Wapichana: ela também se tornou a primeira mulher indígena a se formar advogada no Brasil e a primeira a ocupar uma vaga na Câmara dos Deputados.

Na Funai, Wapichana assumiu o cargo em meio a uma crise humanitária no território Yanomami, onde centenas de crianças morreram de desnutrição ou doenças ligadas às atividades do garimpo ilegal.

O governo do presidente Lula ordenou uma investigação policial por "genocídio" e uma grande operação militar para expulsar os garimpeiros.

"A partir daí, a gente vai ter que manter uma fiscalização mais permanente e fortalecer as bases da Funai" no território Yanomami, localizado em seu estado natal de Roraima, diz Wapichana, de 49 anos, em seu gabinete em Brasília.

Sistema "imaturo"
Ao menos 30% do ouro extraído entre janeiro de 2021 e junho de 2022 no Brasil pode ser considerado irregular, segundo um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

"O Brasil ainda não tem uma forma de coibir o comércio de ouro ilegal. É muito frágil", admite.

Para comercializar o ouro no país, basta declarar de "boa fé" que a origem é legal, isentando as autoridades do trabalho de verificação.

O sistema "ainda é muito imaturo", diz essa mulher de longos cabelos pretos, que costuma usar cocares.

Sua missão esbarra ainda em um orçamento limitado: o Congresso destinou R$ 600 milhões à Funai até 2023, mas a maior parte desse valor é gasta com despesas administrativas, deixando apenas um sexto para tarefas-chave como demarcação e fiscalização de terras.

Para Wapichana, deveria ser pelo menos o dobro.

A advogada espera obter recursos com o Fundo Amazônia, financiado principalmente por Alemanha e Noruega para a conservação da floresta tropical e ressuscitado com a volta de Lula ao poder, após ficar paralisado durante boa parte do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Ela também espera ajuda do fundo aprovado na COP27 para países vulneráveis a desastres causados pelo clima, cujo operacionalidade, porém, não será imediata.

"A contribuição dos povos indígenas para combater os efeitos das mudanças climáticas" protegendo a natureza "deve ser compensada", reivindica.

Segundo o último censo disponível de 2010, cerca de 800 mil pessoas se reconheceram como indígenas e muitas vivem em terras protegidas, que ocupam 13,75% do território brasileiro.

 

"Resistência"
Joenia Wapichana denuncia também o "sucateamento" da Funai durante o governo Bolsonaro, defensor da abertura das terras indígenas às atividades extrativistas.

Bolsonaro pôs funcionários inexperientes à frente do órgão - um militar e depois um policial - enquanto cumpriu a promessa de "não demarcar mais um centímetro de terra indígena".

Além disso, impulsionada pelo aumento dos preços do ouro, o garimpo ilegal disparou nos últimos anos na Amazônia legal, com uma destruição recorde de 125 km² em 2021, segundo dados oficiais.

Bolsonaro "encorajou a entrada de invasores, negou direitos e colabora até mesmo com a discriminação contra os povos indígenas, que sofreram bastante com perseguições, criminalizações", denuncia a diretora da Funai.

Reverter tudo isso é sua "missão", diz ela, que vê sua trajetória pública como uma "resistência pessoal", especialmente contra os preconceitos que as mulheres indígenas sofrem no Brasil, onde "são vistas só como domésticas e submissas".

"Eu quero dizer: 'nós somos parte deste país, queremos nos sentar na mesa de igual para igual'".

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