Brasil só deve deixar Embaixada argentina em Caracas após escolha de país substituto
Maduro suspende unilateralmente custódia brasileira no local, onde estão abrigados seis colaboradores da líder da oposição venezuelana, María Corina Machado
O governo brasileiro só irá deixar a custódia da Embaixada da Argentina em Caracas quando outro país assumir o local, de acordo com fontes diplomáticas.
Neste sábado, o governo de Nicolás Maduro suspendeu unilateralmente a custódia do governo no local, que abriga seis colaboradores da líder da oposição, María Corina Machado, acusados pelo regime chavista de terrorismo.
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A decisão do regime de Maduro explicaria o cerco do local por homens encapuzados na noite de sexta-feira. Procurado, o Itamaraty ainda não se manifestou oficialmente sobre o assunto.
Os colaboradores da oposição estão abrigados na representação diplomática desde o dia 20 de março e podem ser presos caso deixem o prédio.
Na sexta-feira, Pedro Urruchurtu, coordenador internacional do partido Vem Venezuela e um dos asilados, disse no X que patrulhas do Sebin (Serviço Nacional Bolivariano de Inteligência) e do DAET (Corpo Nacional Bolivariano de Polícia), além de “oficiais encapuzados e armados”, cercaram e sitiaram a sede diplomática.
Imagens divulgadas nas redes sociais mostram veículos com sirenes ligadas nos arredores do prédio, e outro aliado da oposição asilado no local, Omar Gonzalez Moreno, afirmou que a energia da embaixada foi cortada.
Neste sábado, a oposição venezuelana comunicou um novo episódio de “cerco” por parte de agentes “encapuzados” posicionados diante da embaixada argentina.
Nas redes sociais, o partido Vem Venezuela denunciou o episódio, afirmando que os oficiais “impedem o acesso dos jornalistas, embora a rua não esteja fechada”.
A AFP confirmou a presença de pelo menos quatro patrulhas no local, duas do Sebin e duas da Polícia Nacional Bolivariana (PNB), além da instalação de um posto de controle policial para verificar a identidade das pessoas que transitam pela área.
“Na Embaixada da Argentina na Venezuela, sob custódia do Brasil, estamos com a energia elétrica cortada e com os acesso à sede tomados”, escreveu na rede social X Magalli Meda, chefe de campanha de María Corina Machado, refugiada no local desde 20 de março ao lado de cinco colegas.
Luis Almagro, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), criticou o governo venezuelano.
Ele escreveu no X que as “ameaças e ações são completamente contrárias ao Direito e não são aceitáveis de nenhuma forma pela comunidade internacional”.
Uma eventual entrada das forças de segurança venezuelanas na embaixada argentina, mesmo que sob custódia de um outro país, configuraria uma violação da Convenção de Viena sobre as Relações Diplomáticas, que prevê a inviolabilidade de instalações diplomáticas, incluindo embaixadas, consulados e residências de embaixadores.
Por isso, como pontuou uma fonte do Itamaraty, “não há hipótese de vácuo” — ou seja, se a Venezuela quiser o Brasil fora da representação argentina, outra nação terá que assumir a custódia do local.
No final de julho, a Argentina pediu para o Brasil assumir a representação de seus interesses na Venezuela, após o governo venezuelano expulsar as equipes diplomáticas de ao menos sete países que questionaram os resultados das eleições presidenciais.
Quando o pedido foi aceito pelo governo brasileiro, o presidente argentino, Javier Milei, que tem uma relação tumultuada com o Palácio do Planalto, agradeceu e destacou os “laços de amizade” entre os dois países. A bandeira do Brasil foi hasteada na embaixada em 1º de agosto.
Horas antes do cerco de sexta-feira, a Chancelaria argentina havia emitido um comunicado no qual solicitava ao Tribunal Penal Internacional (TPI) uma “ordem de prisão contra Maduro e outros líderes do regime venezuelano”.
De acordo com o jornal argentino La Nación, o pedido considerou o “agravamento da situação” na Venezuela, além da “prática de novos atos que podem ser considerados crimes contra a Humanidade”.
Hernández questionou se a decisão da administração chavista também poderia ter sido feita em resposta às declarações do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que mais cedo no mesmo dia disse achar que o comportamento de Maduro “deixou a desejar”.
O petista voltou a dizer que não reconhece a vitória de Maduro ou da oposição, e cobrou mais uma vez a entrega das atas eleitorais, com detalhes por urna de votação, o que o governo chavista se negou a fazer.
— Ali só tinha uma solução: ou fazer uma nova eleição ou fazer uma coalizão para que se pudesse conviver democraticamente — disse Lula à Rádio Difusora, lembrando que seu governo é formado por partidos que não apoiaram sua eleição. — O Maduro, como presidente, deveria falar o seguinte: ‘Vou provar que eu sou o preferido do povo’. Mas ele não faz.
A proclamação de Maduro como vencedor pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) foi ratificada pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), ambos acusados de servir ao chavismo.
A oposição, por sua vez, reivindica a vitória do diplomata Edmundo González Urrutia, de 75 anos, substituto de María Corina nas eleições presidenciais devido a uma inabilitação da líder opositora imposta pela Controladoria, também chavista, que impediu sua candidatura. Ambos estão escondidos há mais de um mês.
Os resultados oficiais das eleições de 28 de julho foram questionados por Estados Unidos, União Europeia e vários países da América Latina, que pediram uma verificação minuciosa dos votos.
O CNE não divulgou as atas de votação, como a lei exige, alegando que foi alvo de um ataque de hackers. O anúncio dos resultados provocou protestos em todo país, com um balanço de 27 mortos, 192 feridos e 2.400 detidos.