Brasil teve uma mulher assassinada a cada duas horas em 2018, aponta Atlas da Violência
A pesquisadora Amanda Pimentel afirmou que o racismo no Brasil tem um processo histórico e que os dados demonstram como as desigualdades são demonstradas nos índices letais
O Brasil teve uma mulher assassinada a cada duas horas em 2018, apontou o Atlas da Violência 2020, divulgado nesta quinta-feira (27). Foram 4.519 vítimas de homicídio, o que representa uma taxa de 4,3 para cada 100 mil habitantes do sexo feminino. Seguindo a tendência de redução da taxa geral, a taxa de homicídios contra mulheres teve queda de 9% entre 2017 e 2018.
Mas a situação melhorou apenas para as mulheres brancas, já que a grande maioria (68%) das vítimas era negra -a taxa que é praticamente o dobro na comparação com não negras. Em dez anos, a taxa de homicídio de mulheres negras cresceu 12,4%; já a de não negras caiu 11,7%.
Nesse mesmo período, o Brasil teve um aumento de 4% nos assassinatos de mulheres. Em alguns estados, a taxa de homicídios em 2018 mais do que dobrou em relação a 2008: é o caso do Ceará, cujos homicídios de mulheres aumentaram 278%, de Roraima (+186%) e do Acre (126%).
Leia também
• Projeto garante bolsa de estudo para mulheres vítimas de violência e pessoas com deficiência
• Mulheres teriam melhor resposta imunológica à Covid-19, diz estudo
• Grupo de mulheres e estudantes da UPE presenteiam menina que sofreu estupro e médico do Cisam
A pesquisadora Amanda Pimentel afirmou que o racismo no Brasil tem um processo histórico e que os dados demonstram como as desigualdades são demonstradas nos índices letais. "Mesmo com a redução entre 2017 e 2018, a redução foi muito maior entre os não negros do que entre os negros", disse. "Mulheres negras estão ainda mais vulnerabilizadas: pela raça, gênero e classe", disse.
O estudo foi elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) com dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde. Os negros são representados pela soma de pretos e pardos e os não negros são os brancos, amarelos e indígenas, segundo a classificação do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
O número de homicídios em geral caiu em 2018 no país, quando foram registrados 57.956 casos, o que corresponde a uma taxa de 27,8 mortes por 100 mil habitantes -o menor nível de assassinatos em quatro anos e queda de 12% em relação ao ano anterior. A diminuição aconteceu em todas as regiões, em 24 estados, com maior intensidade no Nordeste.
Porém, os assassinatos diminuíram apenas para uma parte da população. A taxa de homicídios de negros no Brasil saltou 11,5% de 2008 a 2018 (de 34 para 37,8 por 100 mil habitantes), enquanto a morte de não negros caiu 12,9% no mesmo período (de 15,9 para 13,9 por 100 mil).
Entre os anos de 2008 e 2018, foram registrados 628 mil homicídios no país, sendo 91% homens, 55% na faixa entre 15 e 29 anos, e pico de mortos aos 21 anos de idade. O Atlas verificou a baixa escolaridade, com no máximo sete anos de estudo entre as vítimas. Os dias de maior incidência dos crimes foram sábados e domingos.
Entre o total de vítimas, os negros representaram 75%. Segundo o Atlas, a discrepância entre as raças nas taxas de homicídio significa que, na prática, para cada indivíduo branco morto naquele ano, 2,7 negros foram assassinados. O documento aponta que o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) diminuiu a escalada da violência contra jovens no Brasil. Antes do ECA, havia crescimento médio de 8,3% ao ano entre vítimas de 15 a 18 anos, por exemplo. Depois, baixou para 2,6%.
Pela primeira vez, o Atlas compilou também dados do Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) sobre a população LGBTQI+. Eles apontam que houve aumento de 19,8% em casos de violência contra essas pessoas entre 2017 e 2018. Cresceu em 10,9% a violência física, em 7,4% a psicológica e em 76,8% outros tipos de violência. Houve queda de 7,6% nos registros de tortura.