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CRIME

Ozempic falsificado: veja como golpistas teriam trocado medicamento em farmácias do Rio

Ao menos três lotes de produtos falsos também já foram identificados pela Anvisa em circulação no Brasil

Acima, a caneta de Ozempic adulterada utilizada pela vítima; abaixo, os modelos originais do medicamento               Acima, a caneta de Ozempic adulterada utilizada pela vítima; abaixo, os modelos originais do medicamento  - Foto: reprodução

A Polícia Civil do Rio de Janeiro investiga como criminosos teriam falsificado o medicamento Ozempic, remédio para controle de diabete que também é usado off label para o enegrecimento, acabou sendo comercializada em algumas farmácias da cidade.

Registro de ocorrências obtidos pelo Fantástico, da TV Globo, mostram como golpistas teriam trocado insulina pelo medicamento original — que acabou sendo comercializado a pacientes que tiveram reações graves.

O golpe começaria com uma pessoa ligando para a farmácia pedindo a entrega de caixas da medicação. Quando o entregador chega ao endereço, antes mesmo de chegar à portaria do prédio, ele é abordado na rua. O suposto cliente, que não mora no local, diz que está de saída com seu carro ali estacionado.

O golpista então pega o medicamento e coloca no carro enquanto tenta efetuar o pagamento. No entanto, o cartão de crédito não autoriza a compra mesmo após diversas tentativas. A pessoa então "desiste" da compra e devolve as caixas do Ozempic. Mas, dentro do carro, outra pessoa fez a troca do medicamento por insulina.


O entregador então leva de volta à farmácia as caxias com o medicamento errado. Como o remédio também é comercializado na forma de uma caneta injetável, quando o cliente verdadeiro recebe a compra, não percebe que, na verdade, está injetando outro princípio ativo. A caneta de insulina custa cerca de 10% do valor do Ozempic.

Em entrevista ao Fantástico, Sérgio Mena Barreto, CEO da Associação Brasileira Redes Farmácias (Abrafarma) diz que o golpe também teria sido flagrado no balcão de uma farmácia:

— Isso aconteceu, inclusive, a gente detectou em balcão de loja. Você traz o atendente, a pessoa pede o Ozempic, coloca o Ozempic em cima do balcão, na cestinha, a pessoa "ah, quero mais produto tal e produto Y" O atendente vai lá dentro, quando volta, alguém tirou da bolsa, trocou a caixinha — afirmou.

Paciente internada no Rio
No mês passado uma paciente foi internada no Copa D'Or após usar o produto falsificado. A paciente já fazia o uso da medicação acompanhada por uma endocrinologista, só percebeu a adulteração da última unidade que comprou em uma farmácia na Zona Sul após uma médica que a atendeu na emergência suspeitar do que poderia ter acontecido. ]

De acordo com a médica Luciana Lopes, coordenadora de endocrinologia do Copa D'Or, a paciente deu entrada no hospital apresentando sintomas de doença neurológica. Ela afirmou que teria utilizado o Ozempic e, 15 minutos depois, começou a se sentir muito mal e foi levada pela irmã ao hospital. Foi na unidade que descobriu que aplicou um produto falsificado.

— Ela entrou no protocolo de doença neurológica. Não estava desacordada, mas não estava com sensório normal. Quando verificaram a glicemia, estava menor que 20, o que é muito grave. Uma pessoa com glicemia abaixo de 50 a 40 já tem sintomas neurológicos associados, como aconteceu com ela. A paciente foi prontamente medicada com quatro ampolas de glicose, subiu a glicemia para 31, melhorou um pouco, e depois recebeu mais aplicações. Ela foi internada e liberada na manhã seguinte — explicou a coordenadora de endocrinologia do hospital.

Casos em outras cidades
A Novo Nordisk, farmacêutica responsável pelo medicamento Ozempic, disse ter identificado casos de falsificação do medicamento em Brasília (DF), Anápolis (GO), Curitiba (PR), Belo Horizonte (MG) e Paty do Alferes (RJ). Sobre a ocorrência no Rio de Janeiro, que repercutiu após a internação de uma paciente com um quadro grave, destacou haver indícios de que eram canetas de insulina readesivadas com rótulos do Ozempic.

"Há indícios de que canetas de insulina Fiasp® FlexTouch® foram readesivadas com rótulos de Ozempic® do lote NP5K174 possivelmente retirados indevidamente de canetas originais do medicamento – a Novo Nordisk não pode garantir que etiquetas de Ozempic® com números de outros lotes não tenham sido igualmente utilizadas em casos semelhantes de falsificação. Há relatos também de casos isolados em Brasília (DF), Anápolis (GO), Curitiba (PR), Belo Horizonte (MG) e Paty do Alferes (RJ)", afirmou em nota.

Diante dos casos de falsificação, o laboratório orienta aos consumidores do medicamento que atentem-se aos detalhes da caneta injetável antes da aplicação. "A caneta de Ozempic® é de cor azul clara, com o botão de aplicação cinza. Já as canetas de insulina Fiasp® são azuis escura, com botão laranja".

Veja as diferenças:
Além disso, a farmacêutica orienta que o consumidor desconfie de:

Sites e canais não licenciados pela Anvisa para comercialização de medicamentos e que usam os nomes das marcas e/ou adotam aplicativos de vendas e redes sociais para ofertar os produtos;

Embalagem do medicamento rasurada ou visivelmente alterada, em idioma estrangeiro, com aparência farmacêutica (apresentação) diferente da registrada e com informações incorretas sobre o produto – Ozempic® 1mg é vendido apenas em canetas pré-preenchidas injetáveis;

Preços muito abaixo dos aprovados pelo governo (todos os produtos Novo Nordisk seguem a tabela da CMED, órgão federal que regulamenta o preço dos medicamentos no país);

Adesivos e indicações de “nova fórmula” ou informações semelhantes – a Novo Nordisk não lançou nenhuma nova fórmula de Ozempic® desde sua chegada ao mercado, em 2019;

Canetas de Ozempic® 1mg com numerações no seletor de dose diferentes de 0mg e 1mg.

O laboratório afirmou ainda que "reconhece a gravidade da situação" e que "está em contato e colaborando com as autoridades competentes, para contribuir com a investigação dos fatos". Disse já ter notificado a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre os casos e que tem acompanhado todos os relatos que chegam em seus canais, na imprensa e nas redes sociais, "dentro de um plano de gerenciamento e minimização de riscos implementado pela companhia".

Ao GLOBO, a Anvisa disse ter solicitado informações às autoridades locais do Rio de Janeiro após o caso da internação de uma mulher de 46 anos por uso do Ozempic falsificado e que monitora o episódio para “avaliar a necessidade de medidas adicionais”.

Na semana passada, uma mulher foi internada com quadro clínico grave no hospital Copa D' Or, localizado em Copacabana, no Rio de Janeiro, após aplicar um produto que pensava ser o Ozempic, remédio aprovado para diabetes tipo 2 e utilizado de forma off-label (finalidade diferente da bula) para perda de peso.

Ela contou realizar tratamento regular com o remédio, indicado por um endocrinologista, e ter comprado a caneta injetável em uma farmácia. Apenas após a médica que a atendeu no hospital ter desconfiado do item é que descobriu se tratar de um produto falsificado. A paciente estava com um quadro grave de hipoglicemia – níveis baixos de açúcar no sangue.

A agência já emitiu três alertas sobre a identificação de lotes falsificados no país após receber informações do laboratório. Segundo a Anvisa, alguns sinais de desvios de qualidade ou de adulteração do produto são alterações de aspecto, cor, odor, sabor e volume ou presença de corpo estranho.

O órgão orienta ao usuário que, em caso de dúvidas, entre em contato com o serviço de atendimento da Novo Nordisk para checar as informações e origem do remédio. O laboratório disse que os pacientes podem acessar o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) de segunda a sexta- feira, das 8h às 17h, pelo telefone 0800 014 44 88, ou 24 horas pelo e-mail: [email protected].

Lotes falsificados
Em relação aos lotes confirmados de produtos falsificados, a Anvisa confirmou terem sido emitidas três resoluções proibindo a venda e alertando sobre. O último foi em janeiro deste ano. Trata-se do lote MP5A064, na concentração de 1,34 mg/mL, com prazo de validade para outubro de 2025 e idioma da embalagem em espanhol.

De acordo com o decreto da agência, publicado no Diário Oficial da União (DOU) à época, a Novo Nordisk identificou unidades do lote "com características divergentes das constantes no medicamento original, a saber: concentração e idioma, se tratando, portanto, de falsificação" e avisou a Anvisa.

Já no ano passado, os dois lotes de Ozempic falsificados registrados pela Anvisa foram o MP5C960 e o LP6F832, ambos também identificados pela Novo Nordisk e repassados para a agência em junho e outubro.

Além disso, em janeiro deste ano, a agência proibiu a venda de todos os lotes de Ozempic e de outros medicamentos comercializados no site https://www.manual.com.br após constatar que são itens "fabricados por empresa desconhecida" e sem registro sanitário.

"As ações de fiscalização determinadas se aplicam a todos os medicamentos da marca MANUAL, bem como a quaisquer pessoas físicas/jurídicas ou veículos de comunicação que comercializem ou divulguem os produtos", disse o decreto.

O problema das unidades falsificadas do Ozempic, no entanto, não se restringe ao Brasil. Também no início do ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiu um alerta sobre a escassez dos remédios com semaglutida — o princípio ativo do Ozempic e o Wegovy (versão do remédio aprovada para obesidade) — e o consequente aumento da comercialização de versões falsificadas destes medicamentos ao redor do planeta.

“A escassez tem um impacto negativo no acesso a produtos médicos e cria um vácuo que é muitas vezes preenchido por versões falsificadas. No ano passado, a escassez global de produtos indicados para controlar o diabetes tipo 2 e, às vezes, também aprovados para perda de peso, conhecidos como produtos agonistas do receptor do peptídeo 1 semelhante ao glucagon (GLP-1-RA), foram associados a um aumento nos relatos de GLP-1-RA falsificado”, apontou o comunicado, que citava lotes encontrados no Brasil, no Reino Unido e nos Estados Unidos.

O que é Ozempic?
O Ozempic é um medicamento aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para o tratamento de diabetes tipo 2, mas que se popularizou pelo seu uso off label para perda de peso. A administração do fármaco feita por meio de uma caneta injetável e está disponível em 0,25 mg, 0,5mg e 1mg.

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