Há 20 anos, morria Dani, promessa do brega pernambucano, em acidente com a Banda Metade
Artista havia assumido vocal da banda há três dias; acidente ficou marcado com uma das maiores tragédias do brega pernambucano
Foi após um show no Clube Municipal de Machados, no Agreste pernambucano, à 1h10 do dia 7 de novembro de 2004, que os integrantes da banda brega Metade vivenciaram a pior experiência da vida deles. O ônibus que os transportava para o Recife, onde o grupo faria mais dois shows, despencou de uma altura de mais de 50 metros, caindo numa ribanceira, na Curva da Pedra, na PE-89, resultando em duas mortes e 21 feridos.
Entre as vítimas fatais estava a cantora Ivanira Melo de Souza, de 24 anos. Ela era conhecida no mundo artístico como‘Dani’ e tinha assumido o vocal da banda há três dias, substituindo a cantora Michelle Melo, que havia deixado o conjunto para engatar carreira solo. Dani era dissidente da Banda Mega Star, onde dividia os palcos com o cantor Geovani Monteiro. No acidente, a artista teve as pernas dilaceradas.
Usiel Barbosa, de 34 anos, também morreu na hora. Conhecido no meio como ‘Birutinha’, ele era um dos donos da banda, junto ao irmão, Eliel Barbosa. Usiel teve sinais de esmagamento no rosto e no tórax. Outras 21 pessoas sofreram ferimentos.
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Entre os casos mais graves estavam Alcidésia Fonseca da Silva, de 37 anos; Roberta Sampaio, 15; Abmael Silva, 32; Dioneres Santana, 23; e Celso José Dias, 32. Eles foram levados para o Hospital Edilson Álvares, em Machados, e depois foram transferidos para o Hospital da Restauração (HR), no centro do Recife. Outros 16 integrantes sofreram pequenas escoriações pelo corpo. Eles receberam alta médica, depois de serem atendidos na unidade hospitalar da cidade interiorana.
Única apresentação na TV com a banda
Na época, o caso foi de grande repercussão, visto que, Ivanira era considerada como um dos grandes talentos da cena brega em Pernambuco. A única e última apresentação dela à frente da Metade foi no programa Tribuna Show, sob o comando de Flávio Barra.
Ainda sem CD gravado com a banda, Dani cantou com playback as músicas ‘Êxtase do Amor’ e ‘Sete Dias de Amor’. Na Mega Star, músicas como ‘Meu Grande Amor’ e ‘Tá Gostoso’ eram sucessos na voz da artista que seria uma promessa para o ritmo em ascensão à época.
"A Dani estava radiante naquele dia. Ela falou sobre essa alegria, durante a entrevista. A Mega Star era uma banda relativamente pequena, perto da Banda Metade, e ali era como se ela tivesse chegado ao auge da carreira, pelo fato de assumir uma banda daquele tamanho. A apresentação dela no Tribuna Show foi muito feliz. A mãe dela estava presente no estúdio. Dani tinha uma energia muito grande e isso era latente nela. Era muito talentosa", comentou o apresentador à Folha de Pernambuco.
A notícia do acidente foi o assunto de destaque, no dia 8 de novembro daquele ano. Quando Flávio soube do fato, estava com o empresário da banda, Eliel Barbosa, que cuidava da carreira de Barra como cantor. Os dois estavam no Clube Bela Vista, em Água Fria, Zona Norte do Recife, quando Eliel foi avisado.
"Eliel e eu somos amigos. Naquele tempo, eu apresentava muitos shows e estava começando uma 'aventura' na música também. Andávamos muito juntos, só que eu ia num ônibus com a minha banda e a Metade ia no dela. No dia do acidente, Eliel estava comigo no Bela Vista. Estávamos do lado de fora, esperando a nossa hora de entrar no palco. Iríamos suceder o cantor Paulo Márcio. Foi quando o celular de Eliel tocou, pela madrugada. Através da fisionomia dele, eu notei que não era algo bom. Ele estava em choque", recordou.
"Não tínhamos muitas informações, porque a internet não tinha a força de hoje. Mas sabíamos que se tratava do ônibus da banda. Pela manhã, soubemos das mortes. Foi uma cena muito forte. Um momento que a gente queria esquecer, mas, infelizmente, aconteceu", contou.
Entre os sobreviventes, está o cantor Wagner Farias, que dividia os palcos da Banda Metade com Dani e hoje faz carreira solo. 20 anos depois, em entrevista à Folha de Pernambuco, Waguinho, como é conhecido artisticamente, relembrou que, 10 minutos antes da tragédia, a vocalista tinha ido para a cabine próxima do motorista, por causa do ar condicionado, para poupar a voz.
“Estávamos voltando de um show maravilhoso e eufórico em Machados. Todos muito felizes, porque a banda tinha tomado um rumo certo, novamente. Foi aí que sofremos o trágico acidente da Banda Metade. O motorista perdeu o controle do ônibus, em uma das descidas do município. Ele capotou uma vez e saiu deslizando, até o final da ribanceira. O que parou o veículo foi uma capela construída em memória de um outro acidente que matou uma família com 12 pessoas. Lá embaixo tinha um rio. Se o ônibus fosse parar lá, eu não estaria aqui, hoje, contando essa história”, revelou.
“Dani estava muito eufórica, porque estava realizada. Na época, a Banda Metade era grandiosa em Pernambuco, fazia muitos shows e era muito requisitada. Toda semana, estávamos em duas ou três TVs e fazíamos de 10 a 13 festas por semana. Era o terceiro show dela a frente da banda. O show daquela noite foi perfeito. A quadra da cidade estava lotada”, complementou.
Ainda durante a entrevista, Waguinho fez um relato chocante. Segundo ele, depois que o ônibus começou a bater e capotar, Usiel Barbosa tentou assumir o volante para evitar que algo ainda pior acontecesse, mas não foi possível.
“Moura pulou para pegar o volante, porque ele dirigia ônibus também. O motorista [do veículo], quando viu que perdeu o controle, abriu a porta dele, pulou e deixou o ônibus ir embora. Eu estava em pé. Quando vi aquelas batidas, eu segurei forte, fechei o olho e senti as pancadas. Tudo em milésimos de segundos. Eu sou pequeno. Fui parar dentro do maleiro. Uma escuridão tremenda e chovia muito”, disse.
O drama para sair do ônibus
Diante de tudo que passaram, os integrantes do conjunto precisavam sair de dentro do ônibus para pedir ajuda a quem estivesse passando pelo local. Foi aí que eles tiveram que lidar com um grande desafio.
“Para poder sair do ônibus, a gente tinha que passar pelos corpos da Dani e do Birutinha. Uma situação muito difícil. 20 anos se passaram, mas parece que foi ontem. Foi muito triste”, finalizou o cantor.
Enterros
Sob forte comoção, o corpo de Dani foi sepultado no cemitério de Beberibe, Zona Norte do Recife. Naquele tempo, milhares de fãs lotaram o local, cantando os sucessos dela. Todos ainda perplexos com o que havia acontecido. Usiel Barbosa foi sepultado no Cemitério de Santo Amaro, no centro do Recife.
“Hoje, Deus nos confortou e estamos mais consolados. Mas, agora, 20 anos depois, principalmente com o acidente recente do Trio Zeus, a gente relembra tudo novamente. Usiel era o meu irmão. Eu o chamei para me ajudar como sócio da banda, porque eu também tinha uma carreira solo e era muito corrido. Ele veio. A [banda] Metade deu um ‘pipoco’ tão grande, na época, que eu deixei de cantar solo e fui cuidar dela. Birutinha era amigo, gente boa e o mais novo dos irmãos”, esclareceu o atual empresário da Banda Metade e também cantor, Eliel Barbosa.
“Eu ia para todos os shows da Metade, mas não fui para o de Machados, porque tinha um outro evento no Recife. Então, expliquei a ele [Usiel] como eram os procedimentos e o deixei a cargo da banda. Foi uma grande perda. A Dani iria ser outro pipoco na Banda Metade. Quando terminou o primeiro show dela com o grupo, no 100% Brasil, no centro do Recife, ela chorou muito, por causa do bom dinheiro que recebera. Me contou a história da vida que tinha e os desafios a frente da Mega Star. Dani cantava muito, era muito bonita e ‘casou’ com a banda. Aquela tragédia parou o Recife”, desabafou Barbosa.
Trio Zeus
A tragédia com o Trio Zeus relembrada por Eliel trata-se de um outro acidente que aconteceu no último dia 20 de outubro, também na PE-89, quando o veículo caiu na mesma ribanceira onde aconteceu o acidente com o ônibus da Banda Metade. Três pessoas morreram. Elas faziam parte do trio que participou das comemorações da vitória do prefeito reeleito Juarez da Banana, na noite anterior. Outras seis pessoas ficaram feridas.