Cana-de-açúcar, romance, prosa e poesia
Desde o século XVI até os dias de hoje, a cana-de-açúcar se destaca como importante vetor do nosso processo de desenvolvimento. Com efeito, a importância da atividade canavieira na nossa formação histórica é tamanha que levou o sociólogo Gilberto Freyre a declarar que nenhuma outra cultura foi capaz de representar tão bem uma nação quanto a cana-de-açúcar, “a cana-de-açúcar representando o Brasil, e o Brasil representando a cana-de-açúcar”.
Nos aspectos político, econômico e social, da colônia à República a cana esteve presente, desde o início, como principal instrumento de colonização e desenvolvimento do “Novo Mundo”, valendo destacar a instalação do primeiro engenho de açúcar em Pernambuco em 1542, por ordem do donatário da capitania, Duarte Coelho Pereira, que entregou a condução do empreendimento denominado NSa da Ajuda ao seu cunhado Jerônimo de Albuquerque.
Mas a relevância da cana-de-açúcar não se resume aos seus aspectos tangíveis, entranhada que está em nossa formação, em nosso DNA, manifestando-se também em prosa e verso, no contexto lúdico, inspirando o cancioneiro popular, a obra de escritores, romancistas e poetas, a exemplo de Ascenso Ferreira, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, João Cabral de Mello Neto, Mauro Mota, Mário Sette, Gilberto Freyre, Ariano Suassuna, Ferreira Gullar, Alceu Valença, inclusive grandes pintores, desde os holandeses Frans Post e Eckhout, no passado, aos contemporâneos, Portinari, José Cláudio, Djanira e tantos outros.
Como dizia o nosso gigante e magistral Ascenso Ferreira, recitando com voz tonitruante “Os engenhos de minha terra”. - Dos engenhos de minha terra, Só os nomes fazem sonhar:
- Esperança! Estrela-d’Alva! Flor do Bosque! Bom Mirar!
Como também em “Trem de Alagoas”.
- Vou danado pra Catende, vou danado pra Catende, vou danado pra Catende, com vontade de chegar, cana caiana, cana roxa, cana fita, cada qual a mais bonita, todas boas de chupar…
- Adeus morena do cabelo cacheado ! Ali dorme o Pai-da-Matta ! Ali é a casa das caiporas,
- Vou danado pra Catende, vou danado pra Catende, vou danado pra Catende, com vontade de chegar.
Ou no nosso ícone cancioneiro maior Alceu Valença, com “Morena Tropicana”,
“Da manga rosa, quero o gosto e o sumo, melão maduro, sapoti, juá, jaboticaba, teu olhar noturno,
Beijo travoso de umbu, cajá, saliva doce, doce mel, mel de uruçu, linda morena, fruta de vez temporana,
Caldo de cana caiana, vou te desfrutar, linda morena, fruta de vez temporana, caldo de cana caiana,
Vou te desfrutar ...”.
Em “Cana Caiana”
“Pernambuco da cana caiana, do verde imburana, do cajá do mel, se destina vida severina,
A moer na usina o amargor do fel
Pernambuco, dos olhos de Holanda, do negro Luanda, cheirando a banguê, se destina, vida severina
A moer na usina, remoer, moer, a moer na usina, remoer, moer
No remoer de sol a sol, para moer velho banguê, remoer fazer forró, e arrasta pé no massapé”.
Pernambuco pelas dificuldades de ontem e de hoje, segue exibindo com muito orgulho a cana-de-açúcar no seu brasão como bandeira de resiliência e esperança, torcendo para que versos, canções e romances, não se transformem em “elegias” de saudades distantes de um tempo melhor.
*Consultor de empresas
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