Caso Gisèle Pelicot: 15 homens considerados culpados por estupro e agressão recorrem de condenações
Ao todo, 51 homens foram condenados e receberam penas de prisão que variam de três a 20 anos, incluindo o ex-marido da francesa, Dominique Pelicot
Pelo menos 15 dos homens considerados culpados de estuprar ou abusar sexualmente de Gisèle Pelicot recorreram de suas condenações e terão direito a um segundo julgamento, publicou o jornal britânico The Guardian neste sábado.
Todos os 51 homens acusados, incluindo o ex-marido de Gisèle, Dominique Pelicot, foram condenados e receberam penas de prisão que variam de três a 20 anos, após um julgamento que durou três meses e meio. Dominique Pelicot foi sentenciado a 20 anos.
O tribunal considerou 47 homens culpados de estupro, dois de tentativa de estupro e dois de agressão sexual. Os condenados têm até a meia-noite de segunda-feira para apresentar recurso. Além da pena de Pelicot, todas as sentenças foram inferiores às solicitadas pelos promotores, que têm o mesmo prazo para apelar.
Uma audiência de apelação, que revisará todas as provas novamente, será julgada por um júri popular, ao contrário do julgamento em Avignon, supervisionado por juízes profissionais.
Após a longa audiência em Avignon, Béatrice Zavarro, advogada de Dominique Pelicot, de 72 anos, um ex-eletricista que admitiu ter drogado e estuprado sua esposa e convidado pelo menos 50 — possivelmente mais de 80 homens — para a casa do casal na Provença para estuprá-la, disse que discutiria com seu cliente sobre recorrer ou não da sentença.
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A agora ex-esposa de Pelicot, Gisèle, também de 72 anos, acredita que pode ter sido estuprada por ele e por desconhecidos mais de 200 vezes entre 2011 e 2020. A investigação contra Pelicot, no entanto, só começou em 2020, após ele ser pego filmando por baixo das saias de mulheres num supermercado.
A polícia descobriu mais de 20 mil fotos e vídeos de abusos cometidos contra sua então esposa, organizados em pastas com títulos como “abusos”, “estupradores dela” e “noite sozinha”. As imagens levaram à identificação de dezenas de cúmplices.
Entre os que recorreram das sentenças está Charly Arbo, de 30 anos, que visitou a casa dos Pelicot na cidade de Mazan seis vezes e recebeu uma pena de 13 anos de prisão.
Na primeira ocasião, ele tinha 22 anos e Gisèle Pelicot, 64. Ele também foi acusado de estuprá-la na noite de seu 66º aniversário. Provas em vídeo mostraram Arbo discutindo sobre drogar e estuprar sua própria mãe com Dominique Pelicot.
Redouan El Farihi, de 55 anos, ex-enfermeiro anestesista, que foi condenado a oito anos, também recorreu da sentença. Ele negou o estupro, alegando que Pelicot o havia “enganado” e insistindo que não sabia que Gisèle havia sido drogada, apesar de vídeos mostrarem ela inconsciente e imóvel.
No julgamento, alguns réus alegaram que Dominique os fez acreditar que participavam de uma fantasia sexual de um casal “libertino”, já que tiveram “o consentimento do marido”.
Um dia após o anúncio das sentenças, o advogado de Gisèle Pelicot, Stéphane Babonneau, que afirmou que o julgamento representou um nível de depravação que ele nunca havia testemunhado, disse ao Observer que ela está disposta a comparecer a um novo julgamento. Segundo ele, Gisèle já afirmou que enfrentará a Justiça novamente se for preciso e caso esteja com boa saúde, considerando seus 72 anos.
— Ela nos disse que estará presente. Talvez não todos os dias, mas ela diz que comparecerá — disse ele, que, quando questionado sobre o estado de Gisèle após o julgamento, declarou: — Ela está aliviada, realmente aliviada, porque todos os acusados foram condenados pelo que fizeram a ela e por ter conseguido chegar ao fim desse processo longo e doloroso.
Gisèle Pelicot, uma ex-gerente de logística aposentada, tornou-se uma figura feminista internacional ao insistir que o julgamento fosse aberto à imprensa e ao público, e que os vídeos de seus abusos fossem exibidos em audiência pública para que “a vergonha mudasse de lado”.
Desde o julgamento, houve pedidos para endurecer as leis de estupro na França, incluindo a introdução do conceito de “consentimento”, atualmente inexistente. O julgamento também lançou luz sobre as atitudes em relação ao estupro e abuso sexual de mulheres no país.
— Do ponto de vista de Gisèle, não há sentença que lhe devolva o que ela perdeu. Ela nunca se sentirá consolada ou de alguma forma compensada pelo fato de 50 famílias terem sido desestruturadas no Natal. Não há satisfação para ela nisso — afirmou Babonneau à imprensa francesa. — Tudo o que Gisèle queria era que os acusados fossem condenados pelo que fizeram a ela. Quanto às sentenças individuais, ela respeita a decisão do tribunal, mas não encontra consolo nelas.