Chefão do bicho, Bernardo Bello acusa rival Rogério Andrade de querer matá-lo
'Vale o escrito' revela a história sangrenta da disputa territorial e familiar dos bicheiros fluminenses contada por pelos próprios personagens
O bicheiro Bernardo Bello, apontado como um dos mais poderosos da nova geração, quebrou o silêncio que impera entre os chefões do jogo para acusar o contraventor Rogério de Andrade, seu rival, de querer matá-lo.
m entrevista inédita, concedida à série “Vale o escrito — a guerra do jogo do bicho”, que entra no ar nesta quarta-feira na GloboPlay, Bello disse que Rogério, sobrinho de Castor de Andrade, é o “senhor do crime” no Rio de Janeiro, teria ingerência sobre os integrantes do Escritório do Crime e estaria por trás “de tudo que possa” no estado, referindo-se à longa lista de vítimas que tombaram nos confrontos.
Dividido em sete episódios, cada qual com duração de 50 minutos a uma hora, o documentário mostrará, pela primeira vez, a história sangrenta da disputa territorial e familiar dos bicheiros fluminenses contada por pelos próprios personagens. Além de Bernardo Bello, a série também exibe depoimentos de Ailton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães; da viúva de Maninho Garcia, Sabrina; de suas filhas gêmeas, Shanna e Tamara; e de José Caruzzo Escafura, o Piruinha; entre outros.
No centro de uma violenta disputa pelo legado de Maninho, que envolve o controle de máquinas de caça-níqueis e pontos de bicho da Zona Sul, Bello disse que resolveu falar após concluir que Rogério estaria usando uma delação premiada, feita por Júlia Lotufo, viúva do ex-capitão do Bope Adriano Magalhães da Nóbrega, para acusá-lo de crimes praticados pelo rival. A colaboração não foi homologada pela Justiça.
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— Todo mundo sabe que (o “senhor do crime”) é Rogério de Andrade. Não falo nenhuma novidade. Estou sendo o primeiro louco a ter coragem de dizer. Mas novidade? Nenhuma. Hoje, meu único problema se chama Rogério de Andrade, por causa das declarações que estou dando. Prefiro enfrentar um possível atentado, uma possível morte, do que ficar anos da vida ceifado da minha liberdade, do convívio com a minha família, por uma coisa que não fiz, para livrar a cara de um homem que há décadas vem aterrorizando e amedrontando todo mundo — disse Bello.
Rogério teria decretado guerra a Bello, em raro confronto entre bicheiros de famílias distintas, depois que se aliou a Shanna Garcia pela retomada dos pontos de bicho e de máquinas caça-níqueis dos Garcia na Zona Sul do Rio. Ex-marido de Tamara, Bello teria assumido o controle do território e suspendido o pagamento da participação dos integrantes da família no lucro da jogatina.
— Foi uma farsa, uma criação manipulada por alguém. Tanto que a delação (de Júlia Lotufo) não foi aceita. E por que não foi aceita? Por que fez a delação? Rogério deu dinheiro para ela? Rogério ia ajudá-la em alguma coisa, no crime dela, para ela sair da prisão? — acusa Bello.
Com narrativa de Pedro Bial e direção de Fellipe Awi, Ricardo Calil e Gian Carlo Belotti, “Vale o escrito” revisita todos os episódios recentes da guerra do bicho no estado. O ponto alto do documentário é a disputa pelo poder e pelo dinheiro envolvendo os integrantes de duas das mais famigeradas famílias da contravenção: os Garcia e os Andrade. Um confronto intestino que já deixou muitas vítimas pelo caminho e que, segundo entrevistados, está longe de acabar.
O programa, ao descrever a guerra que aniquila a família Garcia, desencadeada com o assassinato de Maninho e a morte natural do seu pai, o chefão Waldemir Garcia, o Miro, em 2004, exibe um longo depoimento da amazona Shanna, descrita como pessoa do mesmo temperamento explosivo do pai. A “Maninho de saias”, como é vista no mundo do bicho, abre o jogo sobre a relação de rivalidade com a própria irmã gêmea, com quem teve brigas físicas, e a guerra interna contra Bernardo Bello.
“Vale o Escrito” expõe as contradições e reviravoltas nas trincheiras da guerra. Sabrina Garcia, que viu Rogério de Andrade ser acusado de ordenar a morte de Maninho, passou por cima dos ressentimentos para pedir ajuda ao rival de Bello na guerra contra o ex-genro. Sua filha, Shanna, é mostrada como a primeira personagem feminina, em um universo machista, a lutar por um espaço na cúpula da contravenção.
Shanna não se importa em admitir a ira contra a própria irmã e de apontar o dedo para Bello, a quem responsabiliza pela tentativa de assassinato que sofreu em 2019, e por outras situações violentas vividas por sua família. Desde 2011, Shanna perdeu o marido, José Luiz de Barros Lopes, o Zé Personal; o pai, Maninho; o irmão, Mirinho; e o tio, Alcebíades Paes Garcia, o Bid. Apesar do grau de violência, não parece disposta a desistir da luta pelo poder.
— O que o Bernardo recebe tem de ser dividido por três. Pedi ajuda à cúpula (da contravenção) para resolver, mas eles foram vaselina, principalmente Capitão (Guimarães) — queixa-se Shanna.
O documentário, inspirado nas informações fornecidas pelas próprias gêmeas, compara Shanna e Tamara às irmãs Ruth e Raquel, da novela da TV Globo “Mulheres de areia”. Na trama, exibida em 1993, Ruth é uma bondosa mulher, enquanto sua gêmea, Raquel, é má e de péssima índole — os papéis foram interpretados por Glória Pires. Em “Vale o escrito”, Shanna não se importa em dizer a que personagem era associada:
— Diziam que eu era a Raquel.
O documentário, produzido pela equipe de Conversa.Doc, está longe da ficção. Suas imagens são fortes, com cenas reais de crimes e muito sangue, mas traduzem o tamanho da violência que acossa a população fluminense.
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