Israel

Chefe da agência de segurança de Israel condena "terrorismo" de colonos na Cisjordânia e alerta para

Ronen Bar diz que ações de extremistas aumentaram na falta de punições e na conivência de líderes nacionais, podendo provocar a 'perda de legitimidade', inclusive entre aliados

Tropas israelenses e veículos blindados operando em terra na Faixa de Gaza em meio ao conflito contínuo entre Israel e o HamasTropas israelenses e veículos blindados operando em terra na Faixa de Gaza em meio ao conflito contínuo entre Israel e o Hamas - Foto: AFP

O chefe da agência de segurança de Israel (Shin Bet), Ronen Bar, enviou uma carta aos líderes israelenses, entre eles, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, alertando para o "terrorismo" praticado por colonos na Cisjordânia, cujas ações representavam "uma grande mancha no judaísmo e em todos nós".

Encaminhado na semana passada e divulgado na quinta-feira pela rede israelense Canal 12, a carta expôs o fosso entre o Gabinete do premier, cuja coalizão abriga políticos da extrema direita que defendem a expansão dos assentamentos, e o aparelho de segurança israelense, advertindo que essas ações causavam um "prejuízo para Israel".

No documento, Bar abordou os colonos conhecidos como "jovens do topo da colina", extremistas que têm conduzido um campanha de assassinatos, incêndios criminosos e intimidação contra os palestinos da região com o objetivo de expulsá-los da sua terra e promover a busca da extrema direita da anexação completa da Cisjordânia.

O território é ocupado por Israel desde 1967, e o governo israelense reconhece a presença de pouco mais de 465 mil pessoas. Em julho, a Corte Internacional de Justiça declarou ilegal as políticas de assentamento na região.

"Não é crime porque é o uso da violência para criar intimidação, para espalhar medo. Isso é terror", descreveu o chefe do Shin Bet, pontuando como a campanha se proliferou "significativamente" no vácuo de uma resposta policial adequada e a conivência de alguns líderes nacionais. Bar afirmou que os colonos trocaram "isqueiros por armas de guerra", acrescentando que algumas tinham sido fornecidas por Israel. As ações, concluiu, eram "uma grande mancha no judaísmo e em todos nós".

A carta, citada pelo jornal The Guardian, foi encaminhada na mesma semana que um ataque de colonos israelenses contra o vilarejo de Jit, na Cisjordânia, deixou um jovem morto e uma pessoa gravemente ferida, segundo a Autoridade Nacional Palestina (ANP).

Palestinos descreveram ainda que os colonos incendiaram veículos e casas, em uma ação que o próprio presidente de Israel, Isaac Herzog, comparou aos "pogroms", termo originalmente usado para descrever os ultrajes e massacres cometidos contra as comunidades judaicas na Rússia czarista.

No caso dos colonos do "topo da colina", Bar afirma que eles passaram "da fuga das forças de segurança para o ataque às forças de segurança, [e] do isolamento do establishment para o recebimento de legitimidade de certas autoridades do establishment".

Palestinos acusam regularmente as forças de segurança israelenses de ficarem inertes e permitirem que grupos de colonos ataquem suas casas e vilarejos.

A violência na Cisjordânia aumentou significativamente desde o início da guerra em Gaza, em outubro, quando o Hamas atacou o sul de Israel, matando 1,2 pessoas e sequestrando 251.

Até o momento, pelos menos 633 palestinos foram assassinados por soldados e colonos israelenses e pelo menos 18 israelenses morreram em ataques palestinos ou em operações do Exército israelense neste território, segundo dados de ambos os lados.

O chefe da agência está no cargo desde 2021 e compartilhou ter enviado a carta "com dor e grande medo, como judeu, como israelense e como oficial de segurança, sobre o fenômeno crescente do terrorismo judaico da ‘juventude do topo da colina'", dizendo sentir que suas ações se aproximavam de um ponto crítico.

"Estamos no limiar de um processo significativo de mudança de realidade”, escreveu o chefe da agência, continuando: “O prejuízo para Israel, especialmente neste momento, e para a maioria dos colonos é indescritível: uma perda de legitimidade global até mesmo entre nossos melhores amigos, destacando as Forças Armadas de Israel em um momento em que o exército, que não foi criado para lidar com essas missões, está tendo dificuldades para realizar todas as suas tarefas.”

E foi enfático ao pontuar que a liderança israelense estava "disposta a colocar em risco a segurança do Estado e sua própria existência" em nome de sua ideologia.

"Perda de legitimidade"
Bar também criticou o "espetáculo" do ministro da Segurança Nacional, o extremista Itamar Ben-Gvir, ao liderar uma comitiva com centenas de apoiadores judeus à Esplanada das Mesquitas (também chamada de Monte do Templo), área na Cidade Velha de Jerusalém que abriga tanto vestígios do antigo templo judaico, local sagrado para os judeus, quanto a Mesquita de al-Aqsa, terceiro local mais sagrado para o Islã, na semana passada.

O ato foi denunciado por países muçulmanos, líderes políticos israelenses, incluindo de partidos religiosos, e parte da comunidade internacional como uma provocação que coloca Israel e a região em risco. O mesmo foi dito por Bar na carta, ao afirma que a ação de Ben-Gvir poderia levar "a um grande derramamento de sangue e mudar a face do estado de forma irreconhecível”.

As palavras do chefe da agência provocaram críticas de Ben-Gvir, que instou a demissão de Bar.

O ministro foi repreendido pelo ministro da Defesa, Yoav Gallant. Em uma publicação no X, o ministro da Defesa afirmou que "diante das ações irresponsáveis do ministro Ben-Gvir que colocam em risco a segurança nacional do estado de Israel e criam uma divisão interna na nação, [o chefe do Shin Bet] e seu pessoal estão cumprindo seu dever e alertando contra as graves consequências dessas ações".

Em resposta, o ministro da Segurança Nacional disse a Gallant para parar de atacá-lo e "começar a atacar o Hezbollah", com quem militares israelenses trocam ataques diários na fronteira ao norte, incitando o chefe da Defesa a iniciar uma guerra preventiva no Líbano, uma exigência de longa data da direita israelense.

Segundo o Guardian, até o momento, Netanyahu não tentou demitir Bar, mas criticou o chefe do Shin Bet e o chefe da agência de espionagem externa, o Mossad, por seu papel na negociação de um acordo de cessar-fogo com o Hamas, mediado pelos EUA, Egito e Catar.

O premier deu a entender que os chefes "demonstram fraqueza" enquanto ele estaria verdadeiramente lutando pelos interesses dos israelenses.

— Estou enfrentando o establishment de segurança e os líderes das negociações sozinho — disse ao Canal 12, citado pelo Guardian. — Eles demonstram fraqueza e estão apenas tentando encontrar maneiras de ceder, ao passo que eu insisto nos interesses do Estado de Israel e não estou disposto a capitular diante de exigências que prejudiquem a segurança.

O líder israelense é criticado por autoridades por supostamente protelar um cessar-fogo ao acrescentar novas condições à proposta.

Durante sua nona visita ao Oriente Médio, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, informou que o premier havia aceitado a "proposta de ponte" apresentada pelos EUA para fechar as lacunas existentes entre as partes.

Ainda assim, Netanyahu tem insistido em manter o controle do Corredor Philadelphi, uma faixa de 14 quilômetros ao longo da fronteira entre Gaza e Egito, o que, para o Hamas, é inaceitável.

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