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AMÉRICA DO NORTE

Claudia Sheibaum assume hoje Presidência do México com desafio de não ser tutelada por antecessor

Aos 62 anos, a primeira mulher em ser eleita presidente do país deverá enfrentar liderança de antecessor, que escolheu ministros e terá controle do partido no Parlamento

 Claudia Sheibaum assume hoje Presidência do México com desafio de não ser tutelada por antecessor Claudia Sheibaum assume hoje Presidência do México com desafio de não ser tutelada por antecessor - Foto: Alfredo Estrella / AFP

Ela foi a primeira mulher em se eleger presidente do México, em 2 de junho passado, e a partir desta terça-feira, quando será empossada, terá o desafio de demonstrar que esse fato histórico irá além do impacto simbólico que tem para as mulheres mexicanas e latino-americanas.

Aos 62 anos, a ex-prefeita da cidade do México e nova chefe de Estado do país, Claudia Sheinbaum, terá seis anos pela frente para demonstrar que não será uma presidente tutelada por seu antecessor, Andrés Manuel López Obrador, e, sim, uma nova liderança política com impulso e capacidade para promover iniciativas em áreas ignoradas pelo governo que termina, entre elas o combate às mudanças climáticas, direitos das mulheres, ciência e tecnologia, defesa dos direitos humanos e as relações do México com o resto do mundo.

Até agora, Sheinbaum, que integra o mesmo partido que López Obrador, o Morena (Movimento de Regeneração Nacional), evitou confrontos com um líder político de presença dominante, e que deixa pouco espaço para debates que contrariem suas vontades.

Um dos poucos momentos em que a nova presidente se opôs a posicionamentos de López Obrador foi durante a pandemia da Covid-19. Naquela época, o então presidente mexicano foi um dos chefes de Estado que minimizou a pandemia. Como prefeita da capital, Sheinbaum, uma engenheira com pós graduação no exterior em engenharia ambiental e que iniciou sua carreira política há mais de 20 anos, defendeu o uso de máscaras.

Em junho de 2020, os mexicanos ficaram impactados ao ver a então prefeita do Distrito Federal usando máscara numa coletiva de imprensa. Foi um gesto sutil, mas que, segundo analistas locais ouvidos pelo Globo, demonstra que, como presidente, Sheinbaum poderia buscar, pouco a pouco, descolar-se da figura de López Obrador.

— A chegada deste novo governo coloca o México numa posição de vanguarda, e dá ao país um elemento poderoso em termos de projeção internacional. A dúvida é saber até que ponto a nova presidente usará esse elemento para ter uma agenda própria — afirma Guadalupe González, pesquisadora do Colégio do México.

A decisão de Sheibaum de renunciar ao Morena foi, na opinião de González, “uma sinalização positiva”.

— Está claro que López Obrador vai querer determinar a agenda política, até agora o presidente que sai ofuscou a presidente eleita. Ela vai continuar permitindo isso? É o que muitos nos perguntamos — frisa a pesquisadora e analista política.

Na reta final de seu governo, Amlo, como é chamado o líder do Morena, fez importantes reformas, apesar da presidente eleita ter dito, em alguns casos, que seria melhor esperar. Uma das reformas mais importantes foi a do Judiciário, que implica a eleição popular dos juízes mexicanos.

A mudança deixou os mercados nervosos, e poderia afetar a chegada de novos investimentos ao país, por exemplo, em matéria de transição energética. O tema nunca foi considerado prioritário por Amlo, mas está no topo da agenda da nova presidente.

— A eleição de Sheibaum tem um peso simbólico importante, mas ela será uma presidente limitada. Em matéria de mudanças climáticas, poderá fazer alguma coisa, ou enfrentará resistências? Amlo aprovou uma reforma do setor elétrico que vai na contramão do que pensa a nova presidente sobre energias renováveis — aponta Lorena Ruaro, professora da Universidade Carlos III de Madri.

A grande dúvida que paira sobre o México é até que ponto Sheinbaum, que busca liderar um governo independente do partido que agora terá o controle do Parlamento, poderá alcançar esse objetivo sem ser boicotada pelo partido chefiado nas sombras por López Obrador. O presidente que está entregando o poder conseguiu a nomeação de seu filho Andrés Manuel Lopéz Beltrán como secretário de organização política do Morena, influenciou a escolha de vários ministros importantes do novo gabinete e dominou a agenda política durante toda a transição.

— Hoje, Claudia assume com um gabinete compartilhado, as Forças Armadas ainda muito próximas de López Obrador pelo poder que o ex-presidente lhes deu, e um partido, que já não é de governo, super poderoso — frisa González.

Na opinião do analista José Antonio Crespo, “a nova presidente vai querer exercer seu poder, a questão é saber se conseguirá”.

— Quando os mercados ficaram inquietos com a reforma do Judiciário ela pediu calma, e pediu que o projeto fosse demorado. López Obrador se impôs, mas ela se diferenciou. Com poder, poderá se diferenciar ainda mais — acrescentou o analista.

Sheibaum terá um gabinete paritário, como também o teve seu antecessor, mas num país no qual as mulheres ainda têm muito a fazer em matéria de seus direitos. López Obrador nunca teve uma agenda em matéria de igualdade de gênero, e, muito menos, feminismo. Tampouco a teve a nova presidente quando foi prefeita da capital. A terá agora como chefe de Estado? Outra das dúvidas que existe no país.

Sheibaum receberá um país cuja economia está crescendo abaixo do esperado, com risco inclusive de entrar em recessão em 2025. Os desafios são grandes, e a nova presidente não poderá abrir mão do apoio do Morena. Sua liderança é muito diferente a de López Obrador, Sheibaum tem um perfil técnico, e seu calcanhar de Aquiles, enfatiza a pesquisadora do Colégio do México, “é a falta de carisma político e controle partidário”.

Um analista que pediu para não ser identificado concluiu que “o tamanho do poder que López Obrador terá a partir de agora será determinante. Se a maioria parlamentar decidir ser uma maioria esmagadora, Sheibaum estará condenada a ser uma presidente refém dessa maioria e de seu líder”.

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