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pães de forma

Com altos níveis de álcool, pães citados em pesquisa devem ser evitados por grávidas e crianças

Análise da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) identificou teores alcoólicos elevados em marcas de pão de forma vendidas no Brasil; especialista alerta para risco de ultraprocessados

Foi comprovado que algumas marcas de pão de forma usam teores de álcool elevadoFoi comprovado que algumas marcas de pão de forma usam teores de álcool elevado - Foto: Reprodução Wickbold

A Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) identificou teores elevados de álcool em algumas das marcas de pão mais consumidas no Brasil. Em três delas, o nível foi alto o suficiente para que o consumidor corra risco de ser reprovado no bafômetro caso tenha comido somente duas fatias.

A notícia surpreendeu a população e até mesmo os especialistas. Afinal, quem esperaria doses elevadas de álcool numa fatia de pão? Pior: um alimento que costuma ser consumido por todos os públicos, inclusive por aqueles que não podem ingerir nenhuma quantidade de álcool, como grávidas e crianças. Mas será que existe risco?

— Esse relatório da Proteste foi algo bem impactante tanto para a população quanto para nós, profissionais da saúde. Não tínhamos ideia da quantidade de álcool presente nesses pães, que são produtos ultraprocessados — conta a nutricionista e colunista do GLOBO, Priscilla Primi.

A presença de álcool em pães de forma ocorre por dois motivos. O primeiro é que o etanol (álcool etílico) é produzido na própria fermentação do pão. Ainda que a maior parte seja evaporada no forno, pode sobrar uma quantidade residual.

O segundo motivo, e mais grave, é o uso de conservantes antimofo para estender a validade do alimento. O problema é que eles são diluídos em álcool e borrifados no produto pronto.

Isso pode ser inofensivo, porém se houver um abuso da substância, pode levar a um pão com teor alcoólico elevado.

Por exemplo: uma lata de cerveja de 5% de teor alcoólico possui em média 14g de álcool. Essa é a quantidade da dose padrão, a mesma presente em uma dose de destilado e numa taça de vinho, por exemplo.

Já entre os pães de forma analisados pela Proteste, aquele com maior quantidade de álcool foi o da marca Visconti, cuja fatia continha 0,843g. Logo cerca de 17 fatias do pão acumulariam 14,3g, o equivalente a uma lata de cerveja.

— É claro que se formos levar para a vida real, parece que precisa consumir muito produto para chegar no nível do álcool contido numa latinha de cerveja. Mas é importante para vermos que não é tão saudável quanto pensávamos, principalmente para grupos populacionais como grávidas e crianças, porque para essas populações não se deve consumir álcool de jeito nenhum. É algo para ficarmos mais alertas ainda — afirma Primi.

Idealmente, sim. E não só os pães de forma, mas os alimentos ultraprocessados de forma geral.

— Que sirva de aleta para sabermos que esses produtos que vêm das empresas, de grandes indústrias, escondem algo que não saberíamos até que uma empresa fosse investigar — diz a nutricionista.

É por isso, segundo ela, que é preferível sempre comer alimentos minimamente processados.

— A gente orienta em consultório que a base da alimentação seja de alimentos in natura e minimamente processados, exatamente para saber o que a gente está colocando no prato. Se eu tivesse feito um pão, comprado o fermento, farinha, água, etc, e preparado, o álcool residual que é obtido através da fermentação da massa, sairia todo durante o cozimento no forno. O que não acontece nos pães processados, porque o álcool, ali, é o veículo para o conservante. Então, ele é borrifado ali por cima.

Teor alcóolico de pães
As análises envolveram 10 marcas que são líderes de vendas no segmento. Seis delas – Visconti, Bauducco, Wickbold 5 Zeros, Wickbold Sem Glúten, Wickbold Leve e Panco – tiveram um teor alto que levaria a marca a ser considerada alcoólica caso houvesse uma legislação semelhante à das bebidas, que estabelece um limite de 0,5% do teor para ser não alcoólica.

Seven Boys e Wickbold tiveram taxas elevadas (0,5% e 0,35%), mas não o suficiente para serem considerados alcoólicos seguindo a regra das bebidas. Porém, seriam considerados caso fosse aplicada a legislação referente aos produtos fitoterápicos. As únicas marcas que não reprovaram nenhuma medida foram a Pullman e a Plusvita.

Além disso, três marcas – Bauducco, Visconti e Wickbold 5 Zeros – poderiam levar motoristas a reprovarem o teste do bafômetro. Isso porque duas fatias dos pães tiveram concentrações superiores a 0,44g de álcool, o que, segundo uma estimativa da Proteste a partir das regras do Detran, seria suficiente para infringir as leis de trânsito.

“Temos a certeza de que esses produtos com elevado teor alcoólico (para a categoria pão de forma) seriam evitados por numerosos consumidores – seja por motivos de saúde, orientação religiosa e outros – se fosse de seu conhecimento o que pudemos constatar com rigoroso teste realizado em laboratório devidamente acreditado, envolvendo amostras das principais marcas vendidas no Brasil. Por isso, criamos a campanha ‘Se tem Álcool, todo mundo tem direito de saber’, porque é nossa obrigação sermos mais transparentes com os consumidores”, defende Henrique Lian, diretor executivo da Proteste.

Após os testes, a associação enviou um ofício com os resultados para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sugerindo o estabelecimento de um percentual máximo de álcool nos pães e a realização de ações de fiscalização.

O que dizem as empresas?
Em nota, a Pandurata Alimentos, responsável pela fabricação dos produtos Bauducco e Visconti, diz que “adota rigorosos padrões de segurança alimentar em todo seu processo produtivo e na cadeia de fornecimento” e que “segue toda a legislação e regulamentações vigentes”.

A Panco também afirmou que adota “práticas totalmente alinhadas aos mais rigorosos padrões de mercado e o cumprimento de todas as normas e legislações específicas vigentes para a produção de alimentos”.

Sobre o estudo da Proteste, disse desconhecer a metodologia e que o etanol “pode resultar do processo de fermentação, sendo que os resíduos não intencionais são aceitos pelas normas e legislações vigentes”.

O Grupo Wickbold, que também detém a marca Seven Boys, disse seguir “protocolos de segurança e qualidade, com o mais alto teor de controle” e que “cumpre toda a legislação vigente, dentro dos parâmetros impostos pelas normas estabelecidas”.

Sobre o estudo, assim como a Panco, destacou que “não foi notificada sobre o referido estudo e a metodologia utilizada” e que, por isso, “não é possível qualquer manifestação sobre ele”.

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