Com Maduro otimista e oposição esperançosa, Venezuela encerra último dia de campanha eleitoral
Seguidores dos dois candidatos tomaram as ruas de Caracas a dois dias da eleição que decidirá os rumos do país
De um lado, Nico; do outro, Egu. Nico é Nicolás Maduro, presidente chavista há 11 anos no poder, que tenta mais uma reeleição no domingo; Egu é o diplomata aposentado Edmundo González Urrutia, figura pouco conhecida no país que substituiu María Corina Machado, mas que representa a esperança da mudança.
Ontem, seguidores dos dois candidatos tomaram as ruas de Caracas, encerrando uma campanha presidencial com comícios históricos da oposição, e que decidirá os rumos do país.
— Nas próximas horas haverá motivação, consciência, disciplina, organização porque na Venezuela reinará a paz e a tranquilidade — disse Maduro, finalizando um comício que durou 12 horas e foi dividido em três pontos de encontro. — No domingo vamos derrotar o fascismo e o imperialismo. Até a vitória sempre, caralho.
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Em sua terceira campanha eleitoral, Maduro incorporou palavras como futuro, evolução, transformação e mudanças. Mas continuam presentes os lemas herdados de Chávez e relacionados “à defesa do socialismo na luta contra o capitalismo” e da soberania nacional diante das “ameaças do imperialismo colonialista”. Nas ruas, seus eleitores cantavam as músicas de Maduro vestindo camisetas com frases que lembram épocas passadas. Algumas têm a imagem de Chávez, o líder eterno e de culto inabalável. Outras, que custam, em média, US$ 5 (R$ 28), refletem os novos tempos com frases como “Com Nico há futuro”, “Nico vai pra frente” e “Nico é meu candidato”, entre outras.
Maduro carrega nas costas índices muito baixos de popularidade — segundo algumas pesquisas, inferiores a 15% —, mas para muitos eleitores chavistas continua sendo a única opção. Por lealdade a Chávez, pavor da oposição ou ambos.
— A vida está difícil, sim, mas confiamos em Nicolás, vai melhorar — comenta a vendedora ambulante Yubisay Rodríguez, de 25 anos.
Clima de esperança
Na oposição, o clima é de esperança, após 25 anos de chavismo. Em La Mercedes, bairro rico da capital, Edmundo e a líder opositora María Corina Machado (inabilitada para disputar eleições e ocupar cargos públicos por 15 anos) encerraram uma campanha que despertou enormes expectativas de mudança no país.
Muitos admitem ter conhecido o candidato recentemente, mas afirmam que o apoio de María Corina é suficiente para decidir seu voto. Com poucas bandeiras políticas e muitos cartazes que pediam “liberdade”, “fim do socialismo” e “a volta de nossos filhos”, milhares de venezuelanos inundaram a avenida principal de um bairro conhecido por seus restaurantes — e escolhido na véspera do comício pela segurança que oferece.
O que mais se ouve entre os opositores é que esta eleição é “a última oportunidade”. A frase é um dos mantras de María Corina, que desde sua esmagadora vitória nas primárias no ano passado, tornou-se líder absoluta da oposição — apesar de manter uma relação conflituosa com a maioria de seus dirigentes.
— Tenho esperanças pela primeira vez em muito tempo, e não quero ir embora do meu país como foram tantos jovens. Precisamos ganhar — disse, emocionado, o estudante de direito Ricardo Campos, de 22 anos.
A parceria entre María Corina e Edmundo é claramente estratégica, e muitos se perguntam como continuará em caso de eventual vitória de um candidato de 74 anos que nunca atuou na política e, até agora, parece seguir as orientações da líder — pelo menos nas decisões mais importantes. Antes do comício, ambos assinaram uma declaração conjunta se comprometendo a, entre outras coisas, buscar consensos no país. A unidade é essencial para uma eventual vitória eleitoral, e María Corina e Edmundo — e seus colaboradores com experiência que operam nos bastidores — sabem bem disso.
— Precisamos que todos, desde cedo, estejam ativos. Quem defende o voto de vocês? — perguntou María Corina, que recebeu a mesma resposta que em todos os comícios: “Nós!”.
Ao seu lado, Edmundo sorriu e concordou:
— Teremos a jornada eleitoral mais importante de nossa História, pelo retorno de nossos filhos e netos, por uma Venezuela livre! — disse, puxando o hino nacional.
Hoje, mais de 50% da população vive abaixo da linha da pobreza, mas eleitores chavistas como Carlos Padrón, um enfermeiro que trabalha num hospital, em suas palavras, “caindo aos pedaços”, afirmam que a culpa não é de Maduro e sim das sanções econômicas e do “imperialismo que nos boicota permanentemente”.
— Os dirigentes opositores são os responsáveis pelas sanções. Por eles estamos como estamos — diz Carlos, de 32 anos, que votou em Maduro nas últimas duas eleições.
'Quase uma religião'
O analista político Oscar Schemel diz que entre o chavismo e seus eleitores “ é compartilhada uma cultura política e uma identidade de classe”.
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— O chavismo é quase uma religião, e isso explica por que, apesar do clima de descontentamento, muitas pessoas votarão por Maduro. Frente à ameaça da exclusão social, os chavistas se unem — aponta.