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Como as ideias de Milei não entraram na "mar verde" do feminismo argentino

Antissistema libertador foi o segundo candidato mais votado nas eleições presidenciais de domingo (22)

Javier Milei, o candidato da extrema direita argentina Javier Milei, o candidato da extrema direita argentina  - Foto: Luis Robayo/AFP

O primeiro turno na Argentina não foi retomado apenas nas questões econômicas. Os deputados argentinos também estão envolvidos em um debate sobre o poderoso movimento feminista, após o candidato antissistema libertador Javier Milei prometer reverter os direitos das mulheres que colocam o país na vanguarda sobre o tema na América do Sul.

Milei, o segundo candidato mais votado nas eleições presidenciais de domingo (22), depois do peronista Sergio Massa, é conhecido por sua forte oposição ao aborto, seu compromisso de eliminar o Ministério da Mulher e sua negação da disparidade salarial entre homens e mulheres.

Enquanto alguns acusam-no de ser uma “reação patriarcal” aos movimentos feministas, outros veem-no como uma porta-voz da “maioria silenciosa” que se sente ameaçada pelo avanço dos direitos das mulheres.

“Há muito de ocorrência patriarcal nas ideias de Milei”, afirmou a candidata de esquerda, Myriam Bregman. "No mínimo, sinto que suas preferências estão sendo questionadas".

Em contrapartida, no comício de encerramento da campanha, no qual Milei foi recebida como uma estrela de rock com imagens de explosões ao fundo, um de seus apoiadores disse à AFP que as feministas "têm um discurso gravado".

"Eu não concordo com a modificação da língua espanhola", disse Moisés Achee, um operário de 57 anos, referindo-se ao uso da linguagem inclusiva. "Nem que me imponham certas coisas que, se eu não aceito, parece que sou eu quem exclui as pessoas. Não concordo em nada com certas ideias. Então, vamos com Javier Milei!".

Dos lenços verdes para as trincheiras
Em 2015, as argentinas lançaram o movimento Ni Una Menos (Nem uma a menos) para denunciar os feminicídios como a máxima expressão da violência de gênero.

A resolução deste movimento de reivindicações no país culminou na discussão sobre o direito ao aborto, que ocorreu em 2018 e foi promulgado em janeiro de 2021, após uma segunda tentativa.

Durante este período, os lençóis verdes das "pibas" - uma adaptação feminista dos lençóis brancos das Mães da Praça de Maio - foram adotados por mulheres em todo o mundo.

Enquanto a “mar verde” ganhava força, a ocorrência de homens que se sentiam injustamente questionados também nascia em grupos de WhatsApp e redes sociais.

Soledad Vallejos, jornalista especializada em questões de gênero e cofundadora da campanha Ni Una Menos, afirma: "A Argentina é a porta que abre as lutas por direitos na região, e quem mostra esse viés na política contemporânea".

“Se os setores conservadores conseguirem influenciar a sociedade argentina nisso, eles expandirão sua influência por toda a região”, alertou Vallejos.

Agustín Romo, na época um influenciador e agora diretor de comunicação digital de Milei, afirma que "houve um exagero do feminismo, onde você era preocupado apenas por ser homem".

“Gerou uma evidência significativa, inclusive entre homens e mulheres não ideologizadas. Ou em mulheres que inclusive se deram conta de que estava fora de controle”, de acordo com declarações de Romo ao elDiarioAR, em agosto.

Ele diz que "nesse momento", entre 2017 e 2019, "um amigo me colocou em um grupo de WhatsApp. E era uma trincheira" para aqueles que se sentiam ameaçados pelo crescimento do feminismo argentino.

A ascensão de Milei
Paralelamente à formação dessas "trincheiras" nas redes sociais, um economista libertário era frequentemente convidado na televisão da Argentina, devido ao seu estilo excêntrico e a sua retórica antissistema que atraíam grande audiência. Era Javier Milei.

O confinamento provocado pela pandemia da covid-19 contribuiu para criar um ambiente propício para esse movimento de acontecimento - que se enxerga como rebelde e libertador.

E, na Argentina do Ni Una Menos estava em evidência no país, Milei começou a clamar por “igualdade perante a lei” quando se trata de feminicídios. Ou seja, ele propõe a eliminação do agravante do código penal quando o motivo do crime fosse uma questão de gênero.

Em entrevista à revista "Perfil", o filósofo Ricardo Forster observou que Milei "tem um discurso que parece rebelde, mas, na verdade, é profundamente reacionário em termos de valores tradicionais".

Pesquisas de opinião mostram que a maioria dos eleitores de Milei são homens.

“Há uma questão de masculinidade no jogo, um ressentimento em relação à masculinidade que se expressa no crescimento da extrema-direita em muitas partes do mundo”, continuou Forster, relacionando o característico Milei com o de Donald Trump nos Estados Unidos, e o de Jair Bolsonaro, não Brasil.

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