Congresso retoma debate de reformas de Milei após repressão policial
Autoridades não forneceram até agora balanços dos incidentes, antes de um terceiro dia com novos protestos convocados
Deputados argentinos retomaram, nesta sexta-feira (2), o debate do amplo pacote de reformas do presidente ultradireitista Javier Milei, após dois dias de maratona no local e protestos do lado de fora reprimidos pela polícia com balas de borracha e gás lacrimogêneo.
"Foram excessos", respondeu um dos líderes da bancada governista, José Luis Espert, em coletiva de imprensa na porta do Congresso, ao ser perguntado sobre a ação das forças de segurança que deixou dezenas de feridos, segundo a AFP conseguiu comprovar.
As autoridades não forneceram até agora balanços dos incidentes, antes de um terceiro dia com novos protestos convocados.
Forças da polícia militarizada haviam antecipado que aplicariam o protocolo de restrições severas criado pelo governo aos comícios de rua.
Os manifestantes e os jornalistas foram dispersados com balas de borracha, agredidos com cassetetes e gás de pimenta, até que as proximidades da região ficaram vazias.
Ao receber as notícias de que a polícia estava reprimindo as manifestações, deputados de vários partidos da oposição abandonaram o local para observar os atos e apoiar os manifestantes.
A câmara discute uma mega lei que inclui a concessão de super-poderes ou faculdades delegadas a Milei para governe por decreto, permite a venda de empresas públicas, contraia dívida pública sem aval parlamentar e desregule toda a atividade econômica, entre outras reformas de seu ideário autodefinido como "anarcocapitalista".
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- A soma do poder público -
O oficialismo tem apenas 38 de 257 assentos, mas conta com o apoio de aliados de direita, centro-direita e social-democratas para aprovar parte do projeto da denominada Lei Ônibus, que inclui 300 reformas econômicas e políticas do governo.
Durante a véspera, a oposição peronista e de esquerda centrou suas críticas nas reformas propostas do Código Penal, que contemplam a criminalização dos protestos de rua e, sobretudo, nas "faculdades delegadas", após denunciar que envolvem "conceder a soma do poder público".
"Tem que debater a quem se dá as faculdades delegadas: a um presidente que não acredita na democracia, que não reconhece o Congresso, que acusou os legisladores de cobrar subornos?", perguntou-se a deputada opositora Paula Penacca.
Esses são, também, alguns dos pontos que mais acirram os ânimos dos manifestantes na porta do Congresso.
Milei busca uma primeira aprovação "em geral" da Lei Ônibus, mas o resultado final dependerá da votação "artigo por artigo" da norma, que nas negociações perdeu a metade de seu conteúdo.
- O ponto: votar cada artigo -
A oposição antecipou que o projeto sofrerá mudanças e, de fato, o texto definitivo segue sendo negociado enquanto está sendo debatido. Até a noite de quinta-feira, os deputados ainda não tinham uma cópia do texto definitivo.
"Ainda não conhecemos o texto da lei que vai ser votado", disse o deputado opositor Daniel Arroyo na porta do Congresso em coletiva de imprensa.
Na semana passada, o governo retirou um "capítulo fiscal" muito questionado do projeto, com o qual buscava assegurar o "déficit zero" nas contas do Estado, mas mantém o pedido de tomar dívida externa sem passar pelo Congresso, como se exige atualmente.
O texto original da Lei Ônibus assegurava a Milei um corte de gasto público de ao redor de 5% do PIB, que agora promete alcançar com outras medidas de ajuste.
Milei já ditou um megadecreto que modifica centenas normas e leis, para reverter com amplas desregulações uma crise que mantém mais de 45% dos argentinos na pobreza, com uma inflação anual de 211% em 2023.
Antes, o ultraliberal avançou com uma desvalorização do peso de 50% e a liberação de todos os preços da economia, o que acelerou a inflação a 25,5% em dezembro.
Milei também renovou o programa creditício de 44 bilhões de dólares com o FMI, que elogiou esses primeiros ajustes, mas previu uma recessão de 2,8% da economia argentina em 2024.
Na quarta-feira, o Fundo aprovou o desembolso de 4,7 bilhões de dólares (23,1 bilhões de reais) - para pagamento de sua própria dívida - em apoio às "medidas econômicas" de Milei, embora tenha advertido que "o caminho para a estabilização será difícil".