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Imbróglio

Contrariando recomendação do Ibama e com aval da Justiça, Marinha decide afundar ex-porta-aviões

Ibama defende a atracação do ex-navio para realização de reparos e aponta impactos em caso de afundamento

Navio foi usado como porta-aviões pela Marinha durante duas décadasNavio foi usado como porta-aviões pela Marinha durante duas décadas - Foto: Reprodução/Wikimedia Commons

A Marinha do Brasil confirmou que vai afundar o ex-porta-aviões São Paulo, que está a 350 km da costa brasileira. O comunicado foi feito por meio de nota assinada conjuntamente pela Marinha, Ministério da Defesa e a Advocacia-Geral da União divulgada no início da noite dessa quarta-feira (2). Apesar da decisão, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) defende a atracação do ex-navio para a realização de reparos e aponta impactos em caso de afundamento.

O documento afirma que "não sobrou alternativa ao Estado brasileiro a não ser considerar o bem como perdido", e que, nos termos da Lei nº 7.542/1986, a Marinha assumiria o controle administrativo do casco, com o objetivo de "evitar danos ao meio ambiente e preservar a segurança da navegação".

A nota informa que a decisão de afundamento planejado e controlado do casco levou em consideração o "crescente risco que envolve a tarefa de reboque, em virtude da deterioração das condições de flutuabilidade do casco e da inevitabilidade de afundamento espontâneo/não controlado", informou a Marinha.

A Marinha Brasileira assumiu a operação do navio  no dia 20 de janeiro. Com a ajuda de um rebocador, o casco foi direcionado para uma área marítima mais afastada, dentro das Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB), a 350 km da costa brasileira e com profundidade aproximada de 5 mil metros, onde o Navio de Apoio Oceânico “Purus” substituiu o rebocador contratado, com o acompanhamento da Fragata “União”, ambos da Marinha brasileira.

De acordo com a corporação, a área de afundamento foi escolhida com base em estudo conduzido pelo Centro de Hidrografia da Marinha, que considerou os seguintes pontos:

– Localização dentro da área da Zona Econômica Exclusiva do Brasil;
– Localização fora de Áreas de Proteção Ambiental;
– Área livre de interferências com cabos submarinos documentados;
- Área sem interferência de projetos de obras sobre águas (ex: parques eólicos);
– Área com profundidades maiores que 3 mil metros.

A nota conjunta informa ainda que as decisões foram pautadas por critérios técnicos e que a Advocacia-Geral da União adotará todas as medidas extrajudiciais e judiciais cabíveis para mitigar, reparar e salvaguardar os interesses do Estado Brasileiro.

Nessa quarta-feira (1º), o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), defendeu a atracação do ex-navio em porto brasileiro para realização de reparos e reexportação para país com estaleiro credenciado capaz de realizar a reciclagem verde (ambientalmente adequada), assim como determina a Organização Marítima Internacional da ONU. 

"A equipe técnica do Instituto estima que a liberação de materiais poluentes contidos na estrutura poderia causar distúrbio na capacidade filtrante e dificuldade de crescimento em organismos aquáticos; o impacto físico sobre o fundo do oceano provocaria a morte de espécies e deterioração de ecossistemas; CFCs e HCFCs usados na insulação de salas contribuiriam, a partir da corrosão das paredes, para a degradação da camada de ozônio; a carcaça poderia atrair espécies invasoras prejudiciais para a biodiversidade nativa; e os microplásticos e metais pesados presentes em tintas da embarcação poderiam se tornar protagonistas de uma bioacumulação indesejável em organismos aquáticos. Como agravante, todos os impactos previstos poderiam ocorrer em hotspots de biodiversidade, fundamentais para a vida marinha", diz nota do Ibama.

Também nessa quarta, a Justiça Federal de Pernambuco (JFPE) negou liminar do Ministério Público Federal (MPF) que solicitava o não afundamento do ex-porta-aviões São Paulo. Na ação, o MPF solicitou que a União fosse condenada a promover estudos técnicos para a adequada destinação do casco do navio, mediante descarte apropriado, sem riscos ao meio ambiente e à saúde pública, ou pela venda do navio a empresa com condições para fazer os reparos necessários ao descarte seguro.

Na decisão do JFPE, o juiz Ubiratan de Couto Mauricio afirmou que, se a Marinha do Brasil defende o afundamento da embarcação, "não é minimamente crível que a extensão do dano ambiental não tenha sido por ela considerado em juízo de ponderação dos interesses". Ou seja, a Marinha está assumindo a responsabilidade técnica do afundamento.

No documento, o juiz solicita que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) seja informado sobre a decisão da JFPE e que o MPF e a União,intimados.

Em resposta, a MSK e SOK repudiaram "veementemente à nota [...] que acusa indevidamente as empresas [...] de não terem tomados as providências necessárias e de terem atuado com 'inércia do proprietário em atender aos requisitos determinados pela' Autoridade Marítima Brasileira (AMB)". As empresas também lamentam o que chamaram de "velado ataque" às autoridades nacionais da Turquia.

Relembre a problemática do navio:
- Em junho de 2022, o Ibama havia autorizado a exportação do ex-navio da Marinha do Brasil (ex-NAe) para a Turquia, país membro da Convenção e que possui estaleiro credenciado

- Após analisar laudos e relatórios produzidos por empresas especializadas, o Ibama obteve autorização da autoridade turca, em maio de 2022, para autorização para exportação.

- O antigo porta-aviões deixou o Brasil em agosto do ano passado, mas, antes que chegasse ao destino, a Turquia cancelou o consentimento. A decisão ocorreu após decisão judicial de primeira instância relacionada a questionamentos sobre o leilão da embarcação, vencido por empresa turca.

- Com o cancelamento da autorização da Turquia, o Ibama teve de suspender seu consentimento e determinar o retorno do ex-NAe ao Brasil.

- Desde então, a embarcação permanecia nas imediações da costa de Pernambuco, monitorada por equipe de emergências ambientais do Ibama que avalia riscos decorrentes do agravamento de avarias no casco.

- Em 10 de janeiro de 2023, a empresa proprietária do ex-navio comunicou ao Ibama e à Marinha a intenção de abandonar a embarcação. Na mesma data, o instituto ingressou com ação judicial para impedir o abandono. A liminar foi concedida no dia seguinte por juiz de primeira instância em Pernambuco. O instituto também exigiu que a empresa proprietária apresentasse os documentos necessários à atracação do ex-navio em estaleiro para realização de reparos.

- Em 20 de janeiro de 2023, a Marinha anunciou o afastamento do ex-porta-aviões da costa pernambucana, alegando que a embarcação apresenta risco de afundar, encalhar ou interromper acesso a canal portuário. Inspeção pericial constatou "uma severa degradação das condições de flutuabilidade e estabilidade" do navio, que também não possui seguro e contrato para atracação e reparo. O afastamento em direção à região com mais profundidade busca garantir a segurança da navegação e a prevenção da poluição ambiental na costa brasileira e portos.

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