Corte IDH retoma histórica audiência sobre aborto contra El Salvador
Segunda sessão da histórica audiência sobre o aborto da Corte Interamericana de Direitos Humanos
A segunda sessão da histórica audiência sobre o aborto da Corte Interamericana de Direitos Humanos começou nesta quinta-feira (23). Trata-se do caso "Beatriz vs. El Salvador", no qual uma mulher salvadorenha foi proibida de interromper a gestação mesmo com sua vida em risco.
Será o último dia de argumentos antes de a Corte IDH, sediada em San José, proferir sua sentença, em aproximadamente seis meses.
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Beatriz (nome fictício), diagnosticada em 2013 com uma doença autoimune, o lúpus eritematoso sistêmico, teve negado o aborto apesar dos riscos e do fato de o feto apresentar anencefalia, a ausência de desenvolvimento cerebral durante a gravidez.
"O que realmente queremos é que outras mulheres não sofram o que minha irmã teve que passar. No futuro, isso também abre um caminho (...) para que as mulheres tenham uma oportunidade e não seja como minha irmã, a quem foi negado" o aborto, disse à AFP seu irmão Humberto (nome fictício), de 30 anos.
Legislação mais restritiva
Beatriz morreu em 2017 em um acidente de trânsito. A Corte iniciou em 2022 seu caso contra o Estado de El Salvador, o país com uma das legislações mais restritivas do mundo sobre o aborto, que é proibido em todos os casos sob pena de prisão de dois a oito anos, segundo a organização Human Rights Watch (HRW).
Além disso, tribunais salvadorenhos costumam classificar o aborto como homicídio qualificado, aumentando a pena para 30 a 50 anos de prisão.
“Esta é a primeira vez que a Corte Interamericana discutirá as consequências da criminalização total do aborto”, apontou Cristina Quijano, pesquisadora dos direitos das mulheres da HRW.
Quijano destacou que a decisão do tribunal continental pode “estabelecer um precedente na América Latina e o Caribe”.
Audiência
No segundo dia da audiência, será ouvida a defesa de ambas as partes.
Do lado da família, a organização Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) se encarregará, junto com outras ONGs, de demonstrar que o Estado violou os direitos de Beatriz "à vida, integridade física, garantias judiciais, vida privada, igualdade perante a lei, proteção judicial e direito à saúde".
Enquanto do lado do Estado de El Salvador, os advogados tentam mostrar que o caso de Beatriz seguiu os procedimentos adequados de acordo com a legislação existente no país sobre o assunto.
A mãe de Beatriz, cujo nome também foi mantido em sigilo, pediu na primeira sessão que "o que aconteceu com Beatriz não aconteça com mais nenhuma mulher".
Também depôs o médico que atendeu a mulher salvadorenha em sua primeira e segunda gestações, o ginecologista Guillermo Antonio Ortiz, que disse à AFP que a junta médica determinou que "era necessário fazer um aborto naquele momento (12 semanas de gravidez) para evitar que ela sofresse danos à saúde ou até morresse".
Apesar da inviabilidade do feto, as autoridades negaram o aborto e 81 dias mais tarde os médicos a submeteram a uma cesárea. O bebê morreu cinco horas depois.
"Acredito que a fizemos sofrer muito e acredito que tenho esse compromisso com a mãe e a família", declarou Ortiz.
Apoio social
Novamente, e como ocorreu no dia anterior, dezenas de mulheres convocaram uma vigília nas imediações da Corte IDH para acompanhar o desenvolvimento da audiência por um telão.
Em El Salvador, mulheres se reuniram mais uma vez em um auditório de uma universidade pública da capital San Salvador com o mesmo propósito.
Na América Latina, o aborto é legal em Argentina, Colômbia, Cuba, Uruguai e em alguns estados do México. No Brasil e no Chile é ilegal, exceto nos casos de risco para a saúde da mãe, ser fruto de um estupro ou de malformações no feto.
Em El Salvador, Honduras, Nicarágua, Haiti e República Dominicana é absolutamente proibido.