SAÚDE

Cresce uso indevido de cosméticos injetáveis no Brasil; especialistas alertam para os riscos

Segundo as normas da Anvisa, produtos dessa categorias não podem ser injetados por não haver estudos de segurança ou eficácia

Especialistas alertam sobre crescente uso indevido de cosméticosEspecialistas alertam sobre crescente uso indevido de cosméticos - Foto: FreePik

Especialistas fizeram um alerta sobre o crescente uso indevido de cosméticos durante uma palestra no 77º Congresso da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), sediado em Natal, Rio Grande do Norte.

Na ocasião, os profissionais destacaram o uso dos produtos de forma injetável, o que contraria as regras da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e leva a riscos à saúde.

De acordo com as normas da autarquia, apenas produtos registrados como medicamentos ou produtos de saúde – o que demanda uma detalhada avaliação de evidências de segurança e eficácia – podem ser injetáveis.

Já os cosméticos, que seguem regras mais brandas e não precisam da análise rigorosa da agência para obter o registro, são permitidos apenas como uso tópico (aplicação sobre a pele).

 

Ainda assim, não é incomum encontrar cosméticos sendo utilizados em procedimentos de forma injetável. Na palestra, os dermatologistas destacaram itens como o polidesoxirribonucleotídeo (PDRN), um composto de DNA derivado do esperma de salmão, de origem da Coreia do Sul, que tem chamado atenção de especialistas, além de lipolíticos, esvaziadores faciais e exossomos.

— Temos visto uma ampla divulgação nas mídias sociais a respeito do uso de cosméticos, e a Anvisa está de olho. Muitas vezes as empresas falam “tem registro na Anvisa”, mas isso não assegura que o produto pode ser injetável. Cosmético de forma alguma pode ser injetável, nem por agulha, nem por outras tecnologias — alertou Suelen Marques, consultora técnica da Anvisa que participou da palestra.

— Muitas vezes o produto é apresentado como se isso fosse possível, com embalagem estéril, às vezes até com agulha e seringa, então é muito fácil confundir. As empresas não registram como medicamento porque isso demanda tempo e dinheiro, demanda todas as fases de desenvolvimento, estudos clínicos, monitoramento. E para cosméticos isso não é necessário — continuou.

É o que destacou também Ediléia Bagatin, médica da SBD e professora do departamento de Dermatologia da Escola Paulista de Medicina (Unifesp), que vê com preocupação o aumento desse uso inadequado. Ela, que participou da palestra com Marques, disse não haver nem mesmo estudos na área da dermatologia sobre o PDRN, por exemplo:

— A questão é que os cosméticos não requerem estudos de eficácia e segurança, não passam por uma avaliação mais profunda de segurança como os medicamentos, eles podem ser comercializados imediatamente após notificação à Anvisa. Sobre o PDRN, existem publicações sobre uso injetável apenas na ortopedia, nenhuma na dermatologia.

O dermatologista Omar Lupi, vice-presidente do Colégio Ibero Latino Americano de Dermatologia e membro da Academia Nacional de Medicina, acrescenta que, além do injetável, outras formas de uso que também levem a uma maior absorção do produto não são permitidas, já que cosméticos são somente para pele íntegra.

— O PDRN foi introduzido no Brasil como cosmético, o que significa que é para ser usado topicamente em pele íntegra. No entanto, tem sido feito apregoado um uso inapropriado, tanto de forma injetável, como com técnicas que levam à sua maior absorção, como pelo uso de derma roller, pós-peeling. O alerta que fazemos é sobre os riscos. Tivemos casos de recolhimento de um produto por causa de vários casos de reação anafilática. Isso nos mostra a dimensão do problema. Não há trabalhos mostrando a eficácia e a biossegurança. E o médico que faz esse uso está desprotegido legalmente caso ocorra uma complicação, porque na bula está que é cosmético — diz ele, que é ex-presidente da SBD.

Essa preocupação já havia levado a Anvisa a publicar uma nota técnica sobre o tema em novembro do ano passado. Na ocasião, o órgão afirmou ter recebido relatos de eventos adversos graves, como até mesmo embolia pulmonar, associados às utilizações irregulares.

“A Agência tomou conhecimento desses eventos adversos por meio de órgãos locais de Vigilância Sanitária, que identificaram os riscos à saúde associados ao uso desses produtos em procedimentos estéticos. Adicionalmente, reportagens na mídia têm destacado casos alarmantes de pacientes que enfrentaram complicações significativas após a aplicação desses produtos injetáveis”, disse o documento.

Outro produto que tem sido utilizado de forma injetável indevidamente e que acende o alerta de especialistas são os exossomas, vesículas produzidas por células-tronco que carregam substâncias que ajudariam na regeneração da pele.

— Os exossomas são um assunto interessante para a medicina em geral, existem mais de 50 empresas estudando eles, são uma promessa. Porém até o momento não há nenhum produto registrado e há uma total falta de evidência. Na cosmiatria, há pouquíssimos trabalhos com metodologia fracas. Além disso, alguns produtos que circulam hoje têm inúmeros ingredientes além do exossoma — alertou Ediléia.

Suelen, da Anvisa, compartilhou na palestra uma maneira fácil de identificar se um produto é medicamento ou produto de saúde, e portanto pode ser injetado, ou se é cosmético:

— Se o número de registro começar com “1” ou “8”, aí é medicamento ou produto para saúde, então podem ser injetáveis. Cosméticos possuem início de registro “2” ou “4”, nesse caso não podem.

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