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Crianças e adolescentes são os que mais sofrem com as mudanças climáticas no Brasil, aponta Unicef

Relatório da Unicef afirma que mais de 40 milhões de crianças e adolescentes brasileiros estão expostos a mais de um risco climático ou ambiental

Relatório foi divulgado nesta quarta-feira (9) pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef)Relatório foi divulgado nesta quarta-feira (9) pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) - Foto: Unicef-BRZ - Raoni Liborio

Crianças e adolescentes são os mais impactados pelas mudanças climáticas no País. É o que aponta o relatório "Crianças, Adolescentes e Mudanças Climáticas no Brasil", lançado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) nesta quarta-feira (9).  

O documento, publicado em meio à Conferência das Nações Unidas para o Clima (COP27), que ocorre no Egito, afirma que mais de 40 milhões de crianças e adolescentes brasileiros estão expostos a mais de um risco climático ou ambiental, o que representa quase 60% do grupo.

Dados da pesquisa mostram que mais de 8,6 milhões de crianças estão expostas ao risco de falta de água no país e mais de 7,3 milhões, aos riscos decorrentes de enchentes de rios.

Além disso, o relatório da Unicef também aponta que pessoas em situações de marginalização social, econômica, cultural, polític, e institucional estão especialmente vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas.

"Crianças e adolescentes são os que menos contribuem para as mudanças climáticas, mas serão os que mais sofrerão os efeitos delas de forma mais intensa e por mais tempo. [...] Eventos climáticos extremos podem destruir escolas, hospitais, postos de saúde, moradias, áreas de lazer, serviços de transporte que garantem o acesso a serviços essenciais", afirmou a representante interina do Unicef no Brasil, Paola Babos, durante coletiva de imprensa.

O relatório afirma que os efeitos da crise climáticas já afetam desproporcionalmente crianças e adolescentes negros, indígenas, quilombolas e pertencentes a outros povos e comunidades tradicionais, além de migrantes e refugiados; crianças e adolescentes com deficiência e, especialmente, meninas.

"A crise climática impacta desde a frequência de chuvas até a amplitude térmica e as ondas de calor; da quantidade e da intensidade de eventos extremos, como ciclones e queimadas, até o prolongamento de secas extremas. Todos esses fenômenos afetam a vida humana de diversas formas,  colocando em risco o bem-estar, o desenvolvimento e a própria sobrevivência de pessoas em todo o planeta", informa o documento. 

Desmatamento na AmazôniaQueimadas na Amazônia. Foto: AFP

O estudo cita como exemplo a poluição do ar, que está diretamente associada às mudanças climáticas e que, no Brasil, é agravada pelas queimadas e pela queima de combustíveis fósseis em áreas urbanas, impactando na expectativa de vida da população.  

"É o pressuposto de toda a discussão. O Brasil e os outros países precisam reduzir emissões [de gases estufa]. Precisamos de um horizonte de zero de emissão líquida nas próximas décadas ou nada do que falamos aqui faz sentido", afirmou o oficial de Monitoramento e Avaliação do Unicef no Brasil, Danilo Moura.

Aproximadamente três a cada cinco crianças e adolescentes estão expostos a concentrações de PM2.5 - poluição do ar externa. Tal exposição a longos períodos, segundo o texto, pode afetar o cérebro, causando atrasos no desenvolvimento, problemas de comportamento e até mesmo de desenvolvimento intelectual.

"Em ambientes poluídos, os pulmões de crianças não se desenvolvem completamente, e o sistema imunológico fica fragilizado em função da exposição ao ar poluído. Infecções respiratórias, que já são comuns em crianças, ficam mais severas e mais frequentes em ambientes poluídos", informa o relatório.

O texto também revela que mais de 2 milhões de pessoas foram mortas, desapareceram, ficaram feridas, enfermas, desabrigadas ou desalojadas diretamente por desastres ambientais em 2021 no Brasil

O estudo também cita o aumento do risco de transmissão de doenças como malária, febre amarela e dengue no País devido às mudanças nos padrões de chuva e temperatura.

Ainda na área de saúde, a insegurança alimentar também tem relação com as mudanças climáticas. No Brasil, 80% dos alimentos que são consumidos pelas pessoas que vivem na pobreza são produzidos pela agricultura familiar, em pequenas propriedades rurais. Esse modo de produção, de acordo com o Unicef, é um dos mais ameaçado pela crise climática, já que tais produtores possuem menos recursos financeiros e técnicos para se adaptarem às mudanças dos padrões de chuvas e temperaturas. 

O estudo lembra ainda que a última década no Brasil foi marcada por uma série de desastres com alto impacto, como os acidentes nas barragens em Mariana (MG), em 2015, e em Brumadinho (MG), em 2019; o derramamento de óleo na costa do Nordeste, em 2019; as queimadas na Amazônia e no Pantanal, em 2020; os grandes deslizamentos de terra na região serrana do Rio de Janeiro, em 2011; e a cheia extrema no Amazonas, em 2021.

O mapa de desastres naturais no Brasil entre 2003 e 2018, elaborado pelo Observatório do Clima e Saúde da Fiocruz, e que consta no relatório da Unicef divulgado nesta quarta-feira, destaca três grandes áreas de municípios vulneráveis à ocorrência de desastres naturais no país

Desastres naturais no Brasil entre 2003 e 2018 - Fonte: S2ID – Sistematizado pelo Observatório do Clima e Saúde – ICICT / Fiocruz

A região com maior números de desastres é o Nordeste, principalmente os estados de Pernambuco, Alagoas, Paraíba, Ceará, leste do Piauí e norte da Bahia. O segundo local é o norte do estado de Minas Gerais. Já a terceira área mais afetada fica na região Sul, principalmente nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

"Há uma predominância dos eventos catastróficos na região Nordeste e muitos deles relacionados às secas", justificou o oficial de Monitoramento e Avaliação do Unicef no Brasil, Danilo Moura.

Raça e gênero
O texto afima que a distribuição racial e de gênero dos efeitos da crise climática está vinculada à desigualdade socioeconômica e à persistência da pobreza como parte do modelo econômico existente, em que, em média, meninas e mulheres são mais pobres do que meninos e homens, e pretos e pardos são mais pobres do que brancos.

"As mulheres estão mais expostas a diversos fatores de risco ambiental, como, por exemplo, o risco da
poluição do ambiente doméstico, uma vez que geralmente são elas que cozinham nos fogões a lenha e abertos na zona rural. [...] Grandes desastres naturais potencializam os riscos de vitimização para crianças e adolescentes. As situações de vulnerabilidade, incerteza e estresse a que as pessoas estão submetidas em um contexto de emergência catalisa os fatores de risco de violências físicas, morais e sexuais para crianças", diz o texto.

"Todos os fatores de vulnerabilidade que estão associados a esses marcadores de gênero, raça e etnias, de pertencimento a grupos excluídos, são potencializados quando você coloca os riscos climáticos em cima de outras vulnerabilidades", afirmou Danilo Moura.

Ao citar as crianças indígenas, Danilo aponta também que o modo de vida dos povos e comunidades tradicionais precisam ser vistos com ainda mais especificidade quanto aos efeitos climáticos. 

"Se você destrói a floresta, você está destruindo literalmente o lugar onde eles vivem. Quando há uma mudança no padrão da chuva e as enchentes ficam mais frequentes, são as comunidades ribeirinhas que são inundadas primeiro", informou.


Impacto na aprendizagem
O relatório aponta que localidades onde acontecem desastres naturais frequentemente têm escolas afetadas, gravando as dificuldades de acesso e permanência educacional de crianças e adolescentes, levando ao aumento da evasão e à dificuldade de manter em funcionamento os serviços e equipamentos escolares.

O documento cita um estudo acerca das áreas de risco de desastres no Brasil que revela que 721 escolas estão em áreas de risco hidrológico, sendo 525 delas escolas públicas. Além disso, outras 1.714 escolas brasileiras se encontram em áreas de risco geológico- dessas, 1.265 são escolas públicas. Os dados indicam ainda que mais de 3 milhões de pessoas frequentam equipamentos escolares em áreas de risco no País.  

De acordo com o relatório, em situações de desastres ambientais de grandes proporções, em geral, as unidades escolares são transformadas em ponto de acolhimento coletivo em comunidades, tendência que impõe dificuldades para o retorno das atividades educacionais. Tal situação atrasa ainda mais a aprendizagem e desenvolvimento de crianças e jovens que vivem em situação de vulnerabilidade.

Abrigo de vítimas das chuvas em PernambucoEscola vira abrigo após fortes chuvas no Recife. Foto: Melissa Fernandes/Folha de Pernambuco

Recomendações
O relatório aponta que a maioria das políticas públicas e dos planos nacionais referentes ao clima e ao meio ambiente menciona pouco ou ignora completamente as vulnerabilidades específicas de crianças e adolescentes. Com base na análise, o documento elaborado pelo Unicef apresenta uma lista de recomendações para que crianças e adolescentes sejam prioridade na pauta climática:

- Defender e fortalecer as instituições e a legislação responsáveis pela garantia de preservação e pelo enfrentamento da degradação do meio ambiente, garantindo o alcance das metas de redução de emissões. 

- Assegurar acesso a água potável e esgotamento sanitário à totalidade das populações, em casa, nas escolas e nos outros equipamentos e serviços públicos essenciais.

- Fortalecer estratégias de controle e enfrentamento de doenças transmitidas por vetores, a exemplo da febre amarela.

- Garantir financiamento e recursos para a execução de políticas e projetos climáticos sensíveis aos direitos de crianças, adolescentes e jovens

- Desenvolver estratégias que considerem os riscos e potenciais específicos de crianças, adolescentes e jovens indígenas e de outras comunidades tradicionais, negros e meninas. 

- Criar espaços, assegurar e estimular a participação segura e a representatividade de crianças, adolescentes e jovens nas esferas de debate, decisão e implementação de políticas públicas relacionadas ao meio ambiente e à crise climática.  

- Estimular investimentos e medidas que promovam e acelerem a transição para uma economia verde, abrindo oportunidades de inclusão socioprodutiva de adolescentes  e jovens.

Confira o relatório da Unicef na íntegra:

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