Cubanos são afetados por apagões frequentes em pleno verão
Os apagões foram um dos estopins dos massivos protestos antigovernamentais de 11 de julho de 2021
Apagões decorrentes da escassez de energia elétrica são frequentes em Cuba desde maio e provocam indignação e protestos incomuns, enquanto a oposição considera que estes cortes de luz são "seu melhor aliado".
"As pessoas não suportam o calor, saem às ruas, vão para as varandas à noite para esperar a volta da luz" e poder ligar seus ventiladores, disse à AFP Estrella Ramírez (62), moradora de Bauta, a 29 km de Havana.
Os apagões foram um dos estopins dos massivos protestos antigovernamentais de 11 de julho de 2021, os maiores em 60 anos. Um ano depois, em pleno verão, os cortes provocaram novas manifestações em algumas pequenas comunidades.
Batendo panelas, dezenas de pessoas marcharam na noite de 14 de julho em Los Palacios, uma cidade de Pinar del Río, no oeste. Autoridades confirmaram que o protesto foi motivado pela falta de luz e que não houve detidos ou atos de vandalismo.
Meios independentes reportaram protestos similares na quinta-feira 21 de julho em Jagüey Grande, Matanzas (oeste) e em Caibarien e Sagua la Grande, em Santa Clara (centro).
Leia também
• Miguel Díaz-Canel promete combater 'sem trégua' a corrupção de Cuba
• Cuba concede gestão de ilha turística no país para grupo privado canadense
• Presidente de Cuba celebra derrota de "golpe de estado vandálico", o 11J
Os manifestantes atendem à "contrarrevolução e aos que desejam nosso bloqueio", disse no dia seguinte o presidente Miguel Díaz-Canel, em alusão ao embargo dos Estados Unidos.
Para o veterano dissidente Manuel Cuesta Morúa, estes apagões são "o melhor aliado" da oposição. "Atualiza a crítica da oposição à obsolescência do modelo; são o efeito estrutural da incompetência do governo e dão a oportunidade para a expressão generalizada do mal estar social acumulado".
Cansaço
Até agora, panelaços eram inimagináveis na ilha, onde cerca de 700 manifestantes do 11 de julho estão detidos.
Os apagões não são novos em Cuba. Na década de 1990 durante o chamado "Período Especial" duravam até 16 horas por dia. No entanto, "não havia um desgaste político acumulado, nem se havia alcançado o cansaço que existe hoje.
Atualmente não há apagões de 16 horas, como em 1993-94, mas seu impacto é muito superior, como demostrado em 11 de julho", afirma o sociólogo cubano Rafael Hernández, em um artigo publicado no Center for Latinoamerican & Latino Studies, da American University.
Segundo números oficiais, 68% dos lares cubanos utilizam fogões elétricos. Os cortes de luz programados afetam a diferentes localidades em horas de maior consumo, quando se prepara a comida.
Em Jesús Menéndez, uma pequena cidade de las Tunas (leste), a luz falta entre 8 e 10 horas diariamente. "Há uma grande quantidade de pessoas que cozinham com eletricidade", diz à AFP Gisela González, uma dona de casa de 54 anos.
"O que fazemos? Cozinhamos com carvão (vegetal) ou querosene, quando conseguimos", responde.
"Compreensão" e "economia"
Díaz-Canel pediu aos cubanos "compreensão" e "economia" de eletricidade já que a situação não tem solução "imediata".
Segundo a União Nacional Elétrica (UNE, estatal), 95% da energia é gerada com combustíveis fósseis, parte deles importados que, na atual conjuntura internacional, custam 30% a mais.
O governo já reconheceu que dos 20 blocos geradores de energia que abastecem o país, 19 superam os 35 anos de vida útil.
Os trabalhos de manutenção iniciados em maio e as constantes avarias deixam pouca margem de manobra ao governo. "A situação de emergência no sistema elétrico vai se manter com uma recuperação gradual", informou Edier Guzmán, diretor na União Eléctrica à emissora estatal.
O sistema elétrico nacional tem atualmente uma disponibilidade de distribuição de energia média de 2.500 megawatts, insuficiente para a demanda dos lares em horários de consumo máximo, que alcançam os 2.900 megawatts.