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Delator diz que foi pressionado a minimizar impacto de interferência russa nas eleições nos EUA

Ex-chefe de inteligência afirma ainda que foi instruído por superiores a diminuir a ameaça de supremacistas brancos

O secretário interino de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Chad WolfO secretário interino de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Chad Wolf - Foto: Mandel Ngan/AFP

As duas principais autoridades do Departamento de Segurança Nacional dos Estados Unidos instruíram funcionários de carreira do órgão a minimizar o impacto da interferência russa nas eleições, segundo denúncia do ex-diretor do setor de inteligência do departamento Brian Murphy.

Ele diz ainda que a orientação também era para diminuir a ameaça de violência por grupos supremacistas brancos.

Em um documento encaminhado ao inspetor geral do órgão e revelado nesta quarta (8) pela comissão de inteligência da Câmara dos EUA, Murphy afirma que foi orientado pelo secretário interino de Segurança Nacional, Chad Wolf, a parar de produzir relatórios sobre a interferência russa nas eleições.

Segundo ele, em vez disso, foi orientado a ressaltar os esforços de interferência chinesa e iraniana.

A possível interferência russa nas eleições de 2016 pairou sobre boa parte do governo Trump. No ano passado, o ex-procurador especial Robert Mueller concluiu que não houve conspiração do presidente e de integrantes de sua equipe com a Rússia para interferir na eleição americana, mas não isentou Trump de ter cometido obstrução de Justiça.

Em agosto deste ano, um relatório de uma comissão de inteligência comandada por republicanos no Senado dos EUA apontou a existência de uma rede de contatos entre assessores da campanha de Trump de 2016 e agentes do governo russo, incluindo alguns ligados ao serviço secreto.

Murphy afirma também que Wolf e o diretor interino de Serviços de Imigração e Cidadania e número dois do departamento, Ken Cuccinelli, deram orientações para que seu setor modificasse avaliações de inteligência de forma que as ameaças de grupos supremacistas brancos parecessem "menos severas" e que fossem incluídas informações sobre grupos violentos de esquerda, como os Antifa, ajustando as informações de inteligência ao discurso de Trump.

Murphy havia sido transferido de posição recentemente, após revelações de que o setor que ele chefiava havia coletado informações e produzido relatórios de inteligência sobre jornalistas que cobriam os protestos em Portland.

Ele afirma que a mudança foi uma retaliação por ter levantado preocupações aos seus superiores sobre os pedidos e por estar cooperando com o inspetor geral do departamento. Ele também pediu ao inspetor que investigasse a suposta represália.

No documento, Murphy afirma que se recusou a realizar as mudanças para que as avaliações de inteligência se aproximassem da retórica de Trump sobre os grupos de esquerda e que disse a Wolf e Cuccinelli que só relataria informação precisa, conforme coletada pelo departamento.

Segundo a denúncia, ele também se recusou a alterar versões prévias de um relatório em que alertava para as ameaças que grupos supremacistas brancos representavam, obrigando Wolf e Cuccinelli a interromper a produção do documento.

"As informações protegidas divulgadas que levaram às ações de retaliação pessoal enfocaram primeiramente a compilação de relatórios de inteligência e avaliações de ameaças que eram conflitantes com os objetivos políticos da Casa Branca e do Departmento de Segurança Nacional", diz trecho do documento.

À CNN, o porta-voz do Departamento de Segurança, Alexei Woltornist, negou as acusações.

"Essas alegações são patentemente falsas. Os líderes do Departamento de Segurança Nacional endereçaram todas as ameaças à pátria, independentemente da ideologia", disse.

Em carta enviada aos advogados de Murphy, a comissão de inteligência da Câmara, liderada pelo Partido Democrata, pediu que o ex-diretor testemunhe sobre as acusações que fez. Membros da comissão afirmaram nesta quarta que a denúncia apresenta quebra da lei e abusos de autoridade que colocam a "nação e sua segurança sob risco".

A tensão racial no país e os protestos contra a violência policial se tornaram dois dos principais assuntos da corrida pela Casa Branca. A pouco menos de 50 dias das eleições, Trump tenta dominar a narrativa dos protestos, e seu rival democrata, Joe Biden, reage para evitar reviravolta.

O republicano coloca-se como o candidato da "lei e da ordem" e tem se aproveitado de alguns atos violentos nos protestos que tomaram os EUA desde a morte de George Floyd para chamar os manifestantes de anarquistas, agitadores e saqueadores.

Líder nas pesquisas nacionais e na maior parte dos estados decisivos, Biden tem trajetória centrista, mas é acusado por Trump de ser um radical de esquerda que vai mergulhar o país na violência caso seja eleito.

O presidente usa a retórica do medo para animar sua base conservadora e também tentar assustar eleitores independentes e moderados que escolheram o republicano em 2016 e agora, cansados de sua postura agressiva, flertam com a candidatura de Biden.

Na semana passada, Trump e Biden, visitaram a cidade de Kenosha, no Wisconsin, onde mora Jacob Blake, homem negro que ficou com parte do corpo paralisada após ser baleado várias vezes nas costas por policiais brancos.

Biden se reuniu com a família de Blake e falou com ele pelo telefone. O republicano esteve na cidade antes do democrata, mas se recusou a encontrar os parentes de Blake após saber que um advogado da família estaria presente.

Em vez disso, Trump se encontrou com policiais, cujo trabalho elogiou, e chamou os protestos contra a violência policial e antirracistas que irromperam na cidade de "terrorismo doméstico". Em um aceno a supremacistas brancos, o presidente chegou a relativizar o caso de Kyle Rittenhouse, um adolescente branco que matou dois manifestantes e feriu um terceiro em Kenosha após andar à noite pelas ruas com um fuzil.

Trump insinuou que Rittenhouse teria agido em legítima defesa. "Ele estava tentando se afastar, e foi atacado. Ele provavelmente teria sido morto", disse o republicano.

Rittenhouse foi acusado de homicídio em primeiro grau, equivalente ao homicídio doloso no Brasil, quando há intenção de matar, e pode pegar prisão perpétua.

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