Delegada Adriana Belém faz exame de corpo de delito e é encaminhada para presídio
Audiência de custódia acontecerá nesta quarta; MPRJ encontrou quase R$ 2 milhões na casa da policial
A delegada afastada Adriana Belém, fez exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML) do Centro do Rio na manhã desta quarta, e já deu entrada no Instituto Penal Oscar Stevenson, unidade feminina, também em Benfica, à espera da audiência de custódia que acontecerá à tarde.
Em depoimentos prestados à Corregedoria Geral da Polícia Civil do Rio (CGPOL), os delegados Adriana Belém e Marcos Cipriano — presos nesta terça-feira, dia 10, durante a Operação Calígula, do Ministério Público — negaram que tivessem envolvimento com a suposta liberação de máquinas caça-níqueis apreendidas em um bingo de Rogério de Andrade, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste da Cidade. Adriana contou ter estado pessoalmente com o ex-policial militar Ronnie Lessa — réu pelas mortes da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes — a pedido do “amigo” Marcos, mas enquanto ela afirmou que, durante o encontro, foi conversado sobre um crime pelo qual Ronnie foi vítima, ele afirmou que só foram faladas "amenidades".
Em 26 de agosto de 2021, Adriana Belém relatou que, em meados de 2018, foi contactada por Marcos Cipriano a fim de ter um encontro visando apresentar um “velho amigo” dele que tinha um inquérito em andamento na 16ª DP (Barra da Tijuca), em que ela era delegada titular. Adriana disse que, naquele momento inicial, não tinha conhecimento de que se tratava de Ronnie Lessa - “tampouco tal circunstância se mostrava relevante haja vista que o nome do ex-policial somente ficou em evidência algum tempo depois, por ocasião da morte da vereadora Marielle Franco”.
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Adriana explicou de que, pelo fato de a 16ª ser uma delegacia com alta demanda, o encontro foi postergado por três vezes e aconteceu em uma padaria próxima. Ela disse que poderia simplesmente pedir que Ronnie comparecesse na distrital, onde certamente receberia atendimento, no entanto, “por se tratar do pedido de um delegado de polícia amigo”, concordou em encontrá-lo diretamente. A delegada ressaltou ser comum e até corriqueiro receber visitas no café, um ambiente considerado “aprazível” por ela.
No depoimento, Adriana Belém contou que participaram do encontro o chefe do Setor de Investigação (SI) da 16ª DP, Jorge Luiz Camillo Alves, Cipriano e Ronnie. O delegado teria se encarregado de realizar as apresentações iniciais e depois iniciaram o assunto principal do encontro - segundo ela, uma tentativa de homicídio cometida contra o ex-policial militar. Ronnie Lessa queria, nas palavras da delegada, se certificar sobre a real motivação do crime e ela teria deixado claro estar convencida de se tratar de uma tentativa de roubo.
Adriana Belém disse ter incumbido Camillo de prestar mais informações a Ronnie, garantiu que aquele foi o primeiro e único encontro com o ex-militar e negou ter conhecimento se ambos mantiveram contato telefônico. Na Corregedoria da Polícia Civil, a delegada contou não ter havido menção a assuntos relacionados a prática de contravenção na área da Barra da Tijuca. Sobre ocorrências envolvendo bingos clandestinos, ela falou que, por exercer titularidade, não presidia esse tipo de inquérito, tendo tal incumbência os delegados adjuntos lotados na 16ª DP.
Questionada, Adriana respondeu que, quanto havia a apreensão de máquinas caça-níqueis, havia a requisição de perícia e, após a elaboração de um laudo preliminar, o local era interditado com lacres nas entradas e as carcaças enviadas a um depósito da Polícia Civil, em Niterói.
Já Marcos Cipriano narrou conhecer Ronnie Lessa há mais de 40 anos, pois eram amigos de infância no Méier. O delegado ressaltou que, embora não sejam tão próximos, ainda são amigos. Ele disse que o ex-policial militar solicitou intermediação em um contato com Adriana Belém, de quem também se disse amigo.
De acordo com o MP, Camillo — preso em casa — foi flagrado em uma "intensa sequência de diálogos" com Ronnie Lessa, acusado de executar Marielle e Anderson junto com Élcio de Queiroz. O MP chegou a esse policial civil graças à análise de um telefone celular apreendido na Operação Lume, durante a qual Lessa e Queiroz foram presos.
No depoimento, Marcos disse ter encontrado Ronnie pessoalmente na Rua Olegário Maciel, na Barra, e que ele lhe contou ter sido vítima de um suposto crime de roubo no Quebra-mar, no mesmo bairro, e estar interessado em saber detalhes sobre a investigação. Na ocasião, o ex-militar teria sido atingido por um disparo de arma de fogo no pescoço e revidou, baleando o atirador.
Na Corregedoria, o delegado disse ter tido um encontro pessoal com a delegada e a indagado se ela poderia receber Ronnie Lessa. Tendo ela concordado, o café entre eles ficou agendado para cerca de dez dias depois. Diferente de Adriana Belém, Marcos Cipriano negou que tivessem conversado sobre a suposta tentativa de homicídio praticada contra o ex-policial milirar tampouco a responde de bingo ou de máquinas caça-níqueis. Ele relatou que, durante 30 minutos, “todos falaram de amenidades”.
O delegado disse que Adriana Belém se colocou à disposição para os “esclarecimentos necessários” e já havia sugerido que Ronnie Lessa fosse a delegacia encontrá-la, mas o ex-militar insistiu em um “encontro prévio para quebrar o gelo”. Marcos Cipriano ressaltou que, à época, não havia “divulgação” do suposto envolvimento dele com a morte de Marielle.
De acordo com as investigações do Ministério Público, nesse encontro entre Adriana Belém, Jorge Luiz Camillo Alves, Marcos Cipriano e Ronnie Lessa foi acertada a retirada em caminhões de quase 80 máquinas caça-níquel apreendidas em uma casa de apostas, mediante propina paga pelo contraventor Rogério de Andrade. Na denúncia que faz parte da Operação Calígula, deflagrada nesta terça-feira, dia 10, os promotores afirmam que a quadrilha estabeleceu “acertos de corrupção estáveis com agentes públicos, principalmente ligados à segurança pública”.
Na ação, que culminou com a prisão de 12 pessoas, entre as quais os delegados Marcos Cipriano e Adriana Belém, foram encontrados no apartamento onde ela morava, na Barra da Tijuca, cerca de R$ 1,8 milhão em espécie em sacos e em uma mala de viagem.