Dengue: Brasil ultrapassa 1 milhão de casos em 2023; por que doença cresce?
Número de diagnósticos é 22% superior ao do mesmo período no ano passado, o mais letal da série histórica
O Brasil ultrapassou a marca de um milhão de casos prováveis de dengue em 2023. Segundo a última atualização semanal do Centro de Operações de Emergências de Arboviroses (COE Arboviroses), instaurado neste ano pelo Ministério da Saúde devido ao avanço das doenças no país, foram 1.101.270 registros até o último dia 11 – um aumento de 22% em relação ao mesmo período do ano passado, que teve 900.008 casos.
Os números aproximam 2023 dos piores anos de incidência de dengue registrados na série histórica do ministério. Em todo 2022, por exemplo, foram 1,45 milhão de casos, segundo o boletim epidemiológico da pasta referente ao ano. O Brasil também ultrapassou a marca de um milhão em 2013, 2015, 2016 e 2019. De acordo com a Plataforma Integrada de Vigilância em Saúde (IVIS), também mantida pela Saúde, 2015 foi o pior cenário já identificado: 1,69 milhão de pessoas foram contaminadas com o vírus.
O ano era também o mais letal de toda a série histórica, com 986 mortes, mas foi superado por 2022 após o Brasil ter registrado 1.016 óbitos. O cenário tem alertado especialistas em saúde. No início do mês, o ministério lançou a campanha “Brasil unido contra a dengue, Zika e chikungunya”, que busca orientar sobre os sinais e os sintomas das três doenças e ensinar formas de prevenção e controle do mosquito Aedes Aegypti, que as transmite.
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Em relação aos óbitos deste ano, até o último dia 11, o país identificou 434 mortes por dengue, além de 381 que estão em investigação. No mesmo período do ano passado, foram 722 óbitos, mas somente 50 ainda estão em análise. Já para chikungunya, foram 41 vítimas fatais em 2022, com 5 ainda em suspeita. Neste ano, são 26 mortes e 45 sendo investigadas até agora.
Os casos de chikungunya também estão com tendência de alta: foram 80.589 infectados nesse período no ano passado, contra 99.785 em 2023 – aumento de 24%. Já os diagnósticos de zika são os que mais crescem, passando de apenas 1.882 até o início de maio de 2022, para 6.789 agora. Ainda assim, não foram identificados óbitos pela doença neste ano.
Porém, 397 dos casos prováveis neste ano são em gestantes, o que preocupa devido à Síndrome Congênita associada à infecção pelo vírus Zika (SCZ), quadro que compreende um conjunto de anomalias congênitas que podem incluir alterações visuais, auditivas e neuropsicomotoras em bebês que nascem de mães contaminadas durante a gravidez.
Por que a dengue avança no Brasil?
No lançamento da campanha deste ano, o Ministério da Saúde atribuiu, em nota, o crescimento das arboviroses a “fatores como a variação climática e aumento das chuvas no período em todo o país, o grande número de pessoas suscetíveis às doenças e a mudança na circulação de sorotipo do vírus”.
A dengue tem quatro sorotipos, a DENV1, DENV2, DENV3 e DENV4. Na maioria dos estados, os casos têm sido provocados pelo tipo 1, embora alguns tenham prevalência do sorotipo 2. Há ainda uma proporção considerável em Roraima associada ao DENV3.
O ressurgimento do tipo 3, que há 15 anos não causa epidemias no país, tem preocupado em relação à possibilidade de novos surtos provocados por ele, o que pode piorar o cenário epidemiológico. Um estudo da Fiocruz, coordenado pela Fiocruz Amazônia e pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), relatou casos identificados em Roraima, mas também no Paraná.
"Nesse estudo, fizemos a caracterização genética dos casos de infecção pelo sorotipo 3 do vírus dengue. É um indicativo de que poderemos voltar a ter, talvez não agora, mas nos próximos meses ou anos, epidemias causadas por esse sorotipo", explicou o virologista Felipe Naveca, chefe do Núcleo de Vigilância de Vírus Emergentes, Reemergentes e Negligenciados da Fiocruz Amazônia e pesquisador do Laboratório de Arbovírus e Vírus Hemorrágicos do IOC/Fiocruz, à agência Fiocruz.
A dengue costuma ser cíclica, ou seja, provocar ondas maiores a cada três anos. No entanto, o impacto da pandemia, os altos números mesmo em anos de menor incidência e a manutenção da tendência de alta neste ano após os recordes em 2022 acendem um alerta.
Métodos de prevenção
A principal estratégia de combate à dengue no país ainda são as campanhas de prevenção que buscam evitar a proliferação do mosquito transmissor, como evitar a água parada, tampar caixas d’água e colocar areia nos pratos de vasos de planta.
Outras técnicas, como a criação de mosquitos com bactérias e o desenvolvimento de vacinas, porém, têm avançado no país. O método Wolbachia, promovido pela Fiocruz no país, vai ser expandido com a construção de uma biofábrica capaz de produzir até 100 milhões de mosquitos por semana, 5 bilhões ao ano, anunciou a fundação neste ano.
Esses mosquitos carregam a bactéria wolbachia, presente em cerca de metade dos insetos, mas que não é encontrada naturalmente no Aedes aegypti. No entanto, quando inserida no Aedes aegypti, ela impede que os vírus da dengue, do zika e da chikungunya se desenvolvam dentro deles. Com isso, reduz a possibilidade de eles disseminarem esses patógenos na população, diminuindo consequentemente os casos das doenças.
Outra técnica que pode em breve ser incorporada no combate à dengue é a vacina. A Anvisa liberou neste ano uma nova aplicação para prevenir a doença, desenvolvida pela farmacêutica japonesa Takeda, que é o primeiro imunizante destinado tanto a pessoas que já tiveram a doença, como para aquelas que nunca receberam o diagnóstico.
Ela é aplicada em duas doses e indicada para pessoas entre 4 e 60 anos. O esquema protege contra os quatro sorotipos do vírus e, nos testes clínicos, demonstrou uma eficácia geral de 80,2% para evitar infecções, e 90,4% para casos graves. O novo imunizante, porém, depende da incorporação pelo Ministério da Saúde ao Programa Nacional de Imunizações (PNI) para chegar ao Sistema Único de Saúde (SUS). A pasta já disse avaliar a vacina.
Esse é o segundo imunizante a receber um aval pela Anvisa no Brasil. O outro, chamado Dengvaxia e desenvolvido pela Sanofi, já está disponível, porém apenas em clínicas privadas. Além disso, é indicado somente para evitar reinfecções, que costumam ser mais graves, e para um público-alvo restrito — pessoas de 9 a 45 anos que já foram contaminadas anteriormente. Por isso, não é a principal estratégia de combate ao vírus.