Depois da queda do governo francês, quais são as opções para Emmanuel Macron?
Derrota no voto de não confiança reduz a margem de ação do presidente, que vê os pedidos para que deixe o cargo se tornarem cada vez mais estridentes
A queda do governo do primeiro-ministro francês, Michel Barnier, derrotado em um voto de não confiança na Assembleia Nacional após menos de 100 dias no cargo, não levará necessariamente à queda do presidente Emmanuel Macron, cujo mandato termina em 2027. Mas o líder de centro-direita terá agora a difícil tarefa de nomear um primeiro-ministro com a mínima capacidade de governar, e sem poder recorrer a novas eleições legislativas imediatas.
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Em setembro, Macron escolheu o conservador Michel Barnier como primeiro-ministro em nome da estabilidade, dois meses depois das eleições legislativas que antecipou em virtude da vitória da ultradireita francesa na disputa para o Parlamento Europeu. A inesperada decisão deixou uma Assembleia Nacional sem maiorias claras e dividida em três blocos irreconciliáves: esquerda, centro-direita e extrema direita. Pelas regras, Macron não pode convocar novas eleições até julho.
Em plena crise política, quais são as opções para o presidente, que está em seu segundo mandato?
Nomear Barnier de novo?
Nada impede Macron de designar Barnier de novo. Em 1962, o então presidente Charles de Gaulle nomeou novamente George Pompidou, que foi derrotado em moção de censura convocada meses após sua nomeação — contudo, De Gaulle dissolveu a Assembleia Nacional pouco depois, e os governistas venceram a votação seguinte, agora confirmando Pompidou como premier até 1968.
Na noite de terça-feira, o primeiro-ministro de 73 anos descartou essa possibilidade.
— Quero servir. Disse a vocês que é uma grande honra. Mas que sentido tem [uma nova nomeação como primeiro-ministro]? — declarou às redes TF1 e France 2.
Entre os nomes que circulam para suceder o ex-negociador europeu do Brexit estão o atual ministro da Defesa, Sébastien Lecornu, e o aliado centrista de Macron, François Bayrou.
Apoio da direita de novo?
A nomeação de Barnier em setembro foi possível porque seu partido conservador Os Republicanos (LR) decidiu deixar a oposição e governar ao lado da aliança centrista, no poder desde 2017. Mas o líder do LR, Laurent Wauquiez, garantiu a seus deputados na terça-feira que seu "compromisso em setembro era válido apenas para Barnier", de acordo com sua comitiva, sugerindo novas discussões para entrar em um governo.
Faltando dois anos e meio para a próxima eleição presidencial, que Macron não poderá disputar, os partidos buscam se dissociar do legado de um presidente impopular, mas sem parecer responsáveis pela crise atual.
Ampliar o apoio?
O antecessor de Barnier, o macronista Gabriel Attal, defendeu "um acordo de não censura" com o LR, mas também com o Partido Socialista, que faz parte da coalizão de esquerda Nova Frente Popular (NFP). O governo que surgiria desse pacto incluiria ministros da aliança de Macron, de acordo com Attal, de centro-direita, e poderia evitar que sua sobrevivência dependesse do partido de oposição Reagrupamento Nacional (RN), de extrema direita, comandado por Marine Le Pen.
Alguns membros mais à direita da coalizão governista defendem, ao invés disso, um "pacto" secreto entre o chefe de Estado e Marine Le Pen, para que esta última permitisse a sobrevivência de um novo governo.
Virar à esquerda?
A NFP — formada por socialistas, ecologistas, comunistas e o partido de esquerda A França Insubmissa (LFI) — venceu as eleições parlamentares sem maioria, mas Macron se recusou a nomear sua indicada, a economista Lucie Castets, como primeira-ministra. Embora Castets tenha dito na terça-feira que está "pronta para governar", os socialistas veem com bons olhos a proposta de um pacto "sem censura", com acordos pontuais com todos os outros partidos, exceto a extrema direita, mas com um governo de esquerda.
Essa abertura entra em conflito com a posição da LFI, que defende "aplicar o programa e somente o programa" da Nova Frente Popular, mesmo sabendo que também sofreria um voto de censura neste cenário.
O líder dos socialistas, Olivier Faure, também rejeitou um governo liderado pelo ex-primeiro-ministro Bernard Cazeneuve, que deixou o Partido Socialista em 2023, e é contra qualquer acordo com a LFI.
Um governo tecnocrático?
Outra possibilidade seria a nomeação de um governo tecnocrático até as próximas eleições legislativas, um dispositivo usado na Itália em várias ocasiões para superar crises políticas. Esse governo se dedicaria à administração cotidiana e à cobrança de impostos, mas enfrentaria o obstáculo no Parlamento do orçamento de 2025, o que poderia levar à eventual queda de Barnier.
— Por trás da técnica sempre há política — resume um líder da aliança de Macron, rejeitando esse cenário.
Renúncia de Macron?
Cada vez mais vozes, de a esquerda, mas também do LR, consideram que a única saída para a crise inclui a renúncia de Macron e uma antecipação da eleição presidencial.
— Cabe ao interessado decidir se pode continuar ou não. Cabe à sua consciência decidir se pode sacrificar a ação pública e o destino da França por seu orgulho. Cabe à sua razão decidir se pode ignorar a evidência de um repúdio popular maciço que, no seu caso, considero definitivo — disse Le Pen nesta quarta-feira.
Em visita à Arábia Saudita, ele afirmou que as falas “não fazem sentido”, reforçando que foi “eleito duas vezes pelo povo francês” e que tem “muito orgulho disso”.
— Honrarei essa confiança com toda a energia que me corresponde até o último segundo para ser útil ao meu país — acrescentou ele, que também mencionou os riscos de uma crise caso o governo de Barnier caia. — Não se deve assustar as pessoas com essas coisas, temos uma economia forte. A França é um país rico, sólido, que realizou muitas reformas e as mantém, que conta com instituições estáveis e uma Constituição estável.