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Estados Unidos

Dez anos após vazamentos de Snowden, mais dados e mais controles

Na época, Edward Snowden mostrou que ninguém estava a salvo de escutas telefônicas da Agência de Segurança Nacional

O ex-analista da Agência de Segurança Nacional americana (NSA, sigla em inglês) Edward Snowden O ex-analista da Agência de Segurança Nacional americana (NSA, sigla em inglês) Edward Snowden  - Foto: AFP

Em 2013, Edward Snowden detonou um escândalo, ao revelar que o enorme aparato de espionagem dos Estados Unidos invadia comunicações e coletava dados de pessoas de todo o mundo: de simples publicações em redes sociais a telefonemas da então chanceler alemã Angela Merkel.

Na época um funcionário terceirizado da Inteligência, Snowden mostrou que ninguém estava a salvo de escutas telefônicas da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês), muito menos os americanos, cujas comunicações privadas são, em tese, protegidas pela Constituição.

Dez anos depois, Snowden vive exilado em Moscou, e o serviço de inteligência americano ainda coleta enormes quantidades de informações privadas armazenadas e transmitidas eletronicamente. Mas suas revelações tiveram um impacto duradouro, ao impulsionar a proteção da privacidade na Europa e nos Estados Unidos e acelerar o uso da criptografia.

Após os vazamentos, "aconteceu um debate histórico em quase todas as democracias ocidentais sobre a relação entre os cidadãos e os programas estatais de vigilância em massa, sobre se a supervisão desses programas era adequada", disse Ben Wizner, da ONG 'American Civil Liberties Union' (ACLU) e advogado de Snowden.

Rede global de coleta de dados
Snowden, um administrador de sistemas da NSA de 29 anos, baixou milhares de documentos da agência e da CIA que mostravam o alcance da rede mundial de coleta de dados iniciada após os ataques de 11 de setembro de 2001.

Os documentos entregues a jornalistas em encontros secretos em Hong Kong mostraram como o serviço de inteligência americano trabalhou com seu homólogo britânico GCHQ e com outras agências similares para criar arquivos sobre bilhões de pessoas sem qualquer motivo para suspeita.

Esses papéis evidenciaram que os Estados Unidos eram capazes de grampear os telefones de líderes aliados e que a NSA tinha um programa chamado Prism que coletava dados de gigantes da Internet como Google e Facebook, com e sem seu consentimento.

A NSA coletou dados de ligações da principal operadora de telefonia móvel do país, a Verizon, e rastreou, recorrentemente, dados de empresas, hospitais e universidades.

Snowden também revelou que o GCHQ captou, com a ajuda da NSA, todo o tráfego que circulava pelos maiores cabos de comunicações submarinas do mundo. O GCHQ também tirou, secretamente, milhões de fotos das câmeras de computador de pessoas comuns, enquanto elas estavam em chats de webcam do Yahoo!.

O problema, disse Snowden, não foi a justificativa da luta contra o terrorismo, mas a existência de programas secretos virtualmente sem limites.

Indignação
As revelações provocaram indignação da opinião pública, mas também a inteligência americana, que acusou Snowden de devastar os programas antiterroristas e de ajudar os inimigos dos Estados Unidos. As agências de espionagem se recusaram a listar os danos causados, alertando apenas que sua vigilância permitia impedir dezenas de ataques.

Em 2016, o então diretor nacional de Inteligência, James Clapper, lamentou que Snowden tenha tornado o trabalho da NSA muito mais difícil, ao pressionar empresas de Internet e de comunicações móveis, assim como os fabricantes de aplicativos e outros do setor, a criptografarem seus serviços.

Para Wizner, o vazamento reforçou as liberdades civis, ainda que cada vez mais empresas de Internet coletam dados de usuários.

Snowden obrigou a Casa Branca, o Congresso e os tribunais a reverterem o curso das atividades de espionagem que haviam aprovado em segredo, a revisar as competências da NSA e a cancelar alguns programas.

“O Congresso, pela primeira vez desde 1970, legislou para reduzir, em vez de ampliar, as autoridades de vigilância”, disse Wizner.

Em 2018, a União Europeia lançou o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD), com o objetivo de limitar as possibilidades de empresas americanas, como Google ou Facebook, de coletarem e fazerem um uso livre de dados dos usuários.

"As revelações de Snowden sobre a vigilância mundial afetaram, de forma tangível, o debate sobre a privacidade na Internet na Europa", escreveu o diretor da Responsible Technology e do Grupo Omidyar, Gus Rossi.

De acordo com o GDPR, a Meta, proprietária do Facebook, foi multada em 1,2 bilhão de euros (1,3 bilhão de dólares, ou em torno de 6,4 bilhões de reais na cotação atual) pela Irlanda no mês passado, por violar a proteção de dados da UE. Isso aconteceu porque os dados coletados de usuários europeus e transferidos para os Estados Unidos não estavam a salvo da NSA e da CIA.

Exílio em Moscou
Hoje, aos 39 anos, Snowden continua defendendo mais proteções de privacidade. Ele mora em Moscou com sua esposa americana e os dois filhos, nascidos na Rússia, e ganha a vida com conferências e consultorias privadas.

Ele não pode deixar a Rússia por não dispor de outro refúgio e é procurado pelos Estados Unidos por crimes graves tipificados na Lei de Espionagem.

"Ele preferia estar em outro lugar. E ambos gostaríamos que houvesse outra opção além de uma cela em uma penitenciária de segurança máxima, ou de viver na Rússia", disse Wizner.

Marcy Wheeler, uma jornalista freelancer especializada na relação entre Inteligência e direito, é mais cética sobre as conquistas resultantes das revelações feitas por Snowden.

A NSA simplesmente consegue aquilo de que necessita "por outros meios", afirmou.

"A vigilância mais importante, dirigida aos americanos (...) é feita pelo FBI (a Polícia Federal americana) e, com ainda menos supervisão, pelos estados e localidades", acrescentou.

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