Doenças poderão matar mais em Gaza do que os bombardeios, alerta a OMS
Porta-voz da organização alerta para aumento de 100 vezes no número de casos de diarreia, e defende um cessar-fogo mais amplo para a entrega de ajuda
A porta-voz da Organização Mundial da Saúde (OMS), Margaret Harris, afirmou nesta terça-feira (29) que surtos de doenças dentro da Faixa de Gaza poderão matar ainda mais do que os bombardeios lançados por Israel desde o mês passado, em resposta aos ataques do Hamas. Para ela, é necessário incrementar o envio de ajuda ao território, além de estender o período de trégua, em vigor desde sexta passada.
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— Eventualmente veremos mais pessoas morrendo de doenças do que de bombas se não conseguirmos remontar o sistema de saúde [de Gaza] — disse Harris, durante entrevista coletiva em Gaza, na qual usou a palavra "tragédia" para descrever a situação no local. — E não são apenas os hospitais. Todo mundo, em todo lugar, tem muitas necessidades de saúde, porque estão famintos.
Harris disse que uma avaliação feita dos abrigos da ONU em Gaza, na sexta-feira, primeiro dia da trégua, mostrou que os locais não tinham "remédios, vacinas, atividades, acesso à água limpa e higiene e alimentos.
Para ela, um cenário propício para o surgimento de doenças infecciosas, especialmente as relacionadas à contaminação de água e alimentos — citando números da própria ONU, Harris afirmou que o número de casos de diarreia em crianças com menos de 5 anos hoje é 100 vezes maior do que o registrado no começo do mês.
Mesmo antes do início da guerra, a Faixa de Gaza, com seus mais de dois milhões de habitantes, enfrentava sérios problemas de falta de saneamento — um relatório do Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU, de 2018, alertava para o risco de epidemias de doenças ligadas a água e alimentos contaminados.
Com os bombardeios e a destruição da já precária infraestrutura local, incluindo a paralisação de usinas de dessalinização, a maior parte dos habitantes depende de ajuda externa para obter água.
No caso do sistema de saúde, organizações de defesa dos direitos humanos e autoridades palestinas afirmam que hospitais e clínicas foram diretamente atingidos pelos ataques de Israel, pondo as vidas de centenas de pessoas em risco. Em alguns casos, como o do Hospital al-Shifa, os israelenses acusaram o Hamas de usar o local como base de operações, uma alegação que motivou a entrada de tropas no local, pouco antes do anúncio da trégua. O grupo palestino nega.
Segundo a ONU, apenas cinco hospitais operam de maneira parcial no Norte de Gaza, enquanto no Sul são oito, mas apenas um deles tem capacidade e recursos para realizar operações complexas e tratar casos mais graves. Pela lei humanitária internacional, ataques hospitais são proibidos durante conflitos armados.
— Em todo lugar, médicos estão tendo que fazer decisões horríveis sobre, você sabe, quem eles vão priorizar — disse, através de videoconferência, James Elder, porta-voz do Unicef em Gaza.
Segundo ele, os corredores dos hospitais estão lotados com crianças com ferimentos graves e com sintomas de doenças infecciosas, e operações ocorrem muitas vezes sem anestesia.
Apesar de reconhecer que o ritmo de entrada de ajuda em Gaza aumentou desde o início do cessar-fogo, Harris considera que ainda é pouco diante dos desafios enfrentados pela população e pelas equipes que trabalham no terreno. Por isso, ela defendeu uma extensão ainda maior da trégua, fazendo coro às palavras do diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom.
"Nos últimos dias, o som da guerra silenciou, dando a milhões de crianças e adultos a chance de olhar para o céu sem o medo de foguetes indo em sua direção", escreveu Tedros no X (antigo Twitter), na segunda-feira. "Se as operações militares recomeçarem, também haverá mais mortes, sofrimento, falta drástica de insumos e desespero. A única resposta é um cessar-fogo prolongado. Agora."