Doses moderadas de vinho reduzem risco de doenças cardiovasculares, diz novo estudo
Por outro lado, evidências recentes afirmam que não há padrão de consumo de álcool absolutamente seguro
Evidências recentes afirmam que não há quantidade de álcool segura para a saúde, contradizendo décadas de estudos que apontaram benefícios do consumo moderado de algumas bebidas, em especial o vinho. Entretanto, o artigo mais recente sobre o assunto indica que beber uma quantidade pequena ou moderada de vinho pode sim reduzir o risco de doenças cardiovasculares.
Publicado recentemente na revista científica European Heart Journal, da Sociedade Europeia de Cardiologia, o trabalho afirma que o consumo moderado de de vinho - definido como uma taça por dia - reduziu em 50% o risco de doenças cardiovasculares graves em pessoas de alto risco que seguem uma dieta mediterrânea. No entanto, este efeito protetor desaparece em pessoas que bebem mais de uma taça por dia.
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A nova pesquisa, feita por um grupo da Universidade de Barcelona e Hospital Clínica Barcelona, ambos na Espanha, faz parte de um estudo maior que investiga o efeito de uma dieta mediterrânea (rica em azeite, vegetais, frutas, nozes e peixe, e pobre em alimentos e bebidas doces ou processados) em pessoas com maior risco de desenvolver doenças cardiovasculares. Todos os participantes não tinham nenhuma doença cardiovascular no início do estudo, mas tinham diabetes tipo 2 ou uma combinação de fatores de risco para doenças cardiovasculares, como tabagismo, pressão alta, colesterol alto, excesso de peso e/ou uma história familiar de doença cardiovascular.
Além de preencherem questionários sobre o que comiam e bebiam, os participantes coletaram amostras de urina no início do estudo e após um ano seguindo uma dieta mediterrânea.
“Este estudo examina a importância do consumo moderado de vinho dentro de um padrão alimentar saudável, como a dieta mediterrânea. Até agora, acreditávamos que 20% dos efeitos da dieta mediterrânea poderiam ser atribuídos ao consumo moderado de vinho; estes resultados, o efeito pode ser ainda maior. Os participantes do nosso estudo eram pessoas idosas com alto risco de doenças cardiovasculares que viviam num país mediterrâneo, pelo que os resultados podem não se aplicar a outras populações", diz o líder da pesquisa, Ramon Estruch, professor da Universidade de Barcelona e do Hospital Clínica Barcelona, em comunicado.
Ao contrário de estudos anteriores sobre os efeitos do consumo de álcool no organismo que se basearam apenas em relatos dos participantes sobre a quantidade de vinho ingerida, o novo trabalho mediu a quantidade de ácido tartárico, uma substância química encontrada naturalmente nas uvas e seus derivados, como o vinho.
O ácido tartárico é excretado na urina, o que significa que pode ser medido para mostrar se alguém consumiu vinho e/ou uvas nos últimos cinco a seis dias. De acordo com os pesquisadores, esta é uma "medida objetiva e confiável" do consumo de vinho.
Para investigar o efeito de beber vinho, os pesquisadores avaliaram 1.232 participantes que foram acompanhados por quatro a cinco anos. Durante esse período, ocorreram 685 casos de doenças cardiovasculares (ataque cardíaco, revascularização coronariana, acidente vascular cerebral ou morte por doença cardiovascular).
Neste grupo de pessoas com alto risco de doenças cardiovasculares que seguiam uma dieta mediterrânea, os investigadores descobriram que o risco de desenvolver um evento cardiovascular foi reduzido em 50% em consumidores leves a moderados de vinho, definido como ingerir meio a um copo de vinho por dia, em comparação com aqueles que bebem muito pouco ou nenhum vinho.
Beber pouco (entre uma taça por semana e menos de meia taça por dia) reduziu o risco cardiovascular em 38%. No entanto, este efeito protetor desaparece em pessoas que bebem mais de um copo por dia.
“Ao medir o ácido tartárico na urina, juntamente com questionários sobre alimentos e bebidas, conseguimos fazer uma medição mais precisa do consumo de vinho. Descobrimos um efeito protetor do vinho muito maior do que o observado em outros estudos. Uma redução do risco de 50% é muito superior à que pode ser alcançada com alguns medicamentos, como as estatinas", afirma Estruch.
Os investigadores consideraram outros fatores que são conhecidos por influenciar o risco de doenças cardiovasculares, mas reconhecem que o desenho do estudo só permite mostrar uma associação entre o consumo de vinho e eventos cardiovasculares, e outros fatores não podem ser excluídos.
Apesar dos resultados, os pesquisadores ressaltam a questão da idade em que o consumo moderado de vinho pode ser considerado 'aceitável'.
“Estudos recentes indicam que os efeitos protetores do consumo de vinho são observados a partir dos 35 aos 40 anos. É importante salientar também que o consumo moderado pelas mulheres deve ser sempre metade do dos homens, devendo ser consumido às refeições.”, avalia o pesquisador.
Num editorial que acompanhou a publicação do artigo, o professor Giovanni de Gaetano do IRCCS NEUROMED, na Itália, e colegas afirmaram que "a relação entre o consumo de álcool, particularmente vinho, e o risco de doenças cardiovasculares continua a ser um tema de debate contínuo".
"O artigo de Inés Domínguez-López et al, publicado nesta edição do European Heart Journal, lança uma nova luz sobre esta complexa relação ao introduzir um biomarcador objetivo - o ácido tartárico urinário - como uma medida do consumo de vinho e fornece evidências convincentes da sua associação com menor risco de DCV. No entanto, Domínguez-López et al também destacam a complexidade do estudo dos efeitos do álcool na saúde", escrevem.
"Embora biomarcadores como o ácido tartárico urinário forneçam uma medida mais objetiva da exposição ao vinho, eles não captam o contexto mais amplo do consumo de álcool, como como padrões de consumo, fatores de estilo de vida e possíveis interações com outros componentes da dieta. Essa limitação ressalta a necessidade de pesquisas mais refinadas que captem a complexidade dos padrões alimentares e seu impacto na saúde. (...) Pesquisas futuras devem continuar a explorar o potencial dos biomarcadores para desvendar as intrincadas ligações entre hábitos alimentares, estilo de vida e resultados de saúde”, completam.
Cautela
Por muito tempo, o consumo moderado de álcool - definido como uma dose por dia para mulheres e duas doses por dia para homens - foi considerado seguro e até mesmo com benefícios para a saúde. Entretanto, estudo publicados nos últimos anos contradizem essa afirmação.
Por exemplo, um relatório da Associação Americana de Pesquisa do Câncer, mostrou que qualquer dose de álcool tem "relação profunda" com ao menos seis tipos de câncer, entre eles, intestino, mama e estômago. Outra metanálise de 107 estudos, publicada na revista científica Journal of Studies on Alcohol and Drugs, defende que consumir álcool de forma moderada não prolonga a vida. Pelo contrário, traz alguns riscos potenciais à saúde, como câncer, doenças cardíacas, pressão alta, derrame e doença hepática.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), não existe um padrão de consumo de álcool absolutamente seguro. As principais diretrizes do órgão definem como moderado duas doses ao dia para homens e uma dose para mulheres. Cada dose corresponde a uma lata de 350 ml de cerveja, uma taça de 150 ml de vinho ou 45 ml de destilado, como vodca ou gim.