Covid-19

É urgente que a cloroquina seja abandonada para qualquer fase da Covid-19, dizem infectologistas

Segundo a SBI, a verba pública pode ser melhor gasta com drogas comprovadamente eficazes e que estão em falta

A hidroxicloroquina é normalmente usada para tratar doenças como a artriteA hidroxicloroquina é normalmente usada para tratar doenças como a artrite - Foto: Yuri Cortez/AFP

"É urgente e necessário", diz a SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), "que a hidroxicloroquina seja abandonada no tratamento de qualquer fase da Covid-19". A orientação da entidade ocorre um dia depois de dois estudos padrão-ouro mostrarem que a cloroquina também não tem efeito em pacientes em quadros iniciais do novo coronavírus. A SBI afirma que o Ministério da Saúde, municípios e estados devem reavaliar as orientações que indiquem a droga, o que evitaria gastar "dinheiro público em tratamentos que são comprovadamente ineficazes".

Segundo a entidade, a verba pública pode ser melhor gasta com drogas comprovadamente eficazes e que estão em falta, como anestésicos para intubação, bloqueadores neuromusculares, em oxímetros e em testes PCR. Já havia estudos que mostravam a falta de eficácia da hidroxicloroquina no tratamento de casos hospitalizados graves de Covid-19 e também sua ineficácia para profilaxia pós-exposição (ou seja, prevenção da infecção em pessoas que tiveram contato próximo com infectados).

Mesmo sem quaisquer evidências, defensores da droga, entre eles o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, insistiam que o remédio teria efeito e deveria ser administrado a pessoas com quadros leves e nos primeiros dias de sintomas. A insistência de Bolsonaro quanto ao assunto, inclusive, levou a mudança do protocolo do Ministério da Saúde –apesar de evidências apontando o contrário– e à exoneração do ex-ministro da saúde, Nelson Teich.

 



Agora, dois estudos padrão-ouro, publicados na quinta (16), mostraram que a hidroxicloroquina usada em pacientes em início de Covid-19 também não tem eficácia contra a doença. O maior deles, multicêntrico e foi feito com 491 pessoas de diversos estados nos EUA e Canadá, foi conduzido por pesquisadores da Universidade de Minnesota e publicado na revista Annals of Internal Medicine.

O estudo, conduzido entre 22 de março e 20 de maio, foi feito com o melhor desenho possível. Ele é duplo cego (pacientes não sabem o que tomam e médicos não sabem o que medicam), com grupo controle (uma parte dos pacientes não toma a droga em estudo, no caso a cloroquina) e randomizado (ou seja, as pessoas são colocadas aleatoriamente nos diferentes grupos que fazem parte da pesquisa).

Os pesquisadores analisaram pessoas não hospitalizadas, com diagnóstico de Covid-19 por PCR (melhor detecção disponível), probabilidade de ter a doença ou com exposição de elevado risco à doença. Cerca de 81% dos participantes tinham confirmação da infecção ou foram expostos a pessoas com a doença confirmada. Além disso, parte considerável dos participante entrou na pesquisa (ou seja, começou a tomar cloroquina ou placebo) com somente 1 dia a partir do início dos sintomas.

O grupo intervenção recebeu uma dose oral de 800 mg de hidroxicloroquina de início, seguido por outra dose de 600 mg após 6 a 8 horas e, finalmente, outras doses de 600 mg por quatro dias. O grupo controle recebeu placebo. Os cientistas documentaram a evolução dos sintomas e não encontraram diferenças entre os pacientes que tomaram hidroxicloroquina e os que tomaram placebo. A conclusão dos pesquisadores foi que a hidroxicloroquina "não diminui substancialmente a severidade dos sintomas em pacientes leves e em início de Covid-19".

A limitação da pesquisa foi o fato de nem todos os pacientes terem teste PCR confirmando a infecção, o que ocorreu devido à escassez dos exames nos EUA no período em questão. Segundo os autores da pesquisa, 58% tinham a confirmação. O outro estudo sobre tratamento precoce com hidroxicloroquina foi feito na Catalunha, na Espanha, e publicado na revista Clinical Infectious Diseases. Novamente, trata-se de uma pesquisa com desenho duplo cego, com grupo controle e randomizado.

Entre 17 de março e 26 de maio, foram incluídos na análise 293 adultos fora do hospital com diagnóstico de Covid-19. Somente pacientes com menos de cinco dias do início dos sintomas participaram do estudo. Um dos grupos participantes tomou 800 mg de hidroxicloroquina no primeiro dia e 400 mg uma vez ao dia pelos próximos 6 dias. O outro grupo, o controle, tomou placebo.

Os pesquisadores analisaram, a partir de amostras dos pacientes, a carga viral com o passar do tempo, a progressão da doença e o tempo necessário para o término dos sintomas. Em comparação com o grupo placebo, a hidroxicloroquina não diminuiu o risco de hospitalização, não abreviou a duração dos sintomas da Covid-19 e não reduziu a carga viral no organismo. "Em pacientes com casos leves de Covid-19, não foi observado benefício no uso da hidroxicloroquina", concluíram os pesquisadores.

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