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El Helicoide: entenda como projeto de shopping de luxo se tornou centro de tortura da Venezuela

Construção foi construída durante a ditadura de Marcos Pérez Jiménez, na década de 1950

A prisão El Helicoide, em Caracas, na VenezuelaA prisão El Helicoide, em Caracas, na Venezuela - Foto: Yuri Cortez / AFP

Considerado uma joia arquitetônica, o edifício com passagens helicoidais que convergem em uma enorme cúpula começou a ser construído durante a ditadura de Marcos Pérez Jiménez (1951-1958). A ideia era que fosse um luxuoso centro comercial, mas a inauguração nunca aconteceu.

Após décadas de abandono, o El Helicoide foi transformado em um quartel-general. A ONG Foro Penal estima que existam 286 "presos políticos" na Venezuela, 63 deles no Helicoide. O Tribunal Penal Internacional (TPI) investiga possíveis crimes contra a Humanidade cometidos na Venezuela durante o governo do presidente Nicolás Maduro.

As autoridades negam crimes contra a Humanidade e questionam a investigação do TPI, considerando que ela "instrumentaliza" a Justiça internacional como arma política. Recentemente, Maduro disse que o Helicoide era uma "referência moral" ao receber uma pequena maquete do prédio em ato policial.

Projeto denunciou 'tortura sistemática'
Escuridão. Gritos de dor após o barulho de choques elétricos arrepiam a pele. Em 2023, um projeto de realidade virtual denunciou a “tortura sistemática” nas temidas celas de El Helicoide, onde opera o serviço de Inteligência na Venezuela.

"Realidade Helicoide" coletou depoimentos de 30 pessoas que foram presas na sede do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin), em Caracas, em um passeio virtual por 17 países e personalidades, como o presidente do Tribunal Penal Internacional (TPI), Piotr Hofmanski.

— Queremos que aqueles que tomam decisões promovam o fechamento dos centros de tortura. Queremos que Helicoide seja fechado — disse Víctor Navarro, diretor da ONG que desenvolveu o projeto Voces de la Memoria (Vozes da Memória), em entrevista à AFP em Buenos Aires, onde vive há quatro anos e meio como refugiado.

 

Em 2018, Navarro ficou preso por cinco meses em Helicoide:

— Eu presenciei e fui vítima de tortura. Eles colocaram uma arma na minha boca [durante um interrogatório], carregada, destravada (...), eles me espancaram — conta.

Ele define o local como "o maior centro de tortura não só da Venezuela, mas da América Latina".

Este homem de 27 anos acredita que foi preso lá por seu trabalho como ativista a serviço de jovens de rua, após uma onda de protestos contra Maduro que deixou mais de 120 mortos em 2017.

— Fiz um trabalho social. Disseram que criei uma célula terrorista financiada pelos Estados Unidos — afirmou.

Navarro foi solto graças a uma negociação política entre o governo e a oposição que resultou na libertação de dezenas de presos, normalmente usados como moeda de troca. Ele fugiu de seu país.

Navarro escreveu um livro sobre seu tempo em El Helicoide, mas sentiu que as palavras "não faziam justiça" ao que ele havia experimentado. Buscou, então, "alternativas virtuais". Ele conheceu um especialista em realidade virtual que lhe mostrou uma simulação baseada no Diário de Anne Frank.

— Quando eu senti [na experiência virtual] que [os nazistas] viriam me procurar e me levariam para um campo de concentração (...), eu disse: eu tenho de fazer isso com o Helicoide — explicou.

Assim nasceu "Realidade Helicoide", que foi financiado pelo americano National Endowment for Democracy (Fundo Nacional para a Democracia), que tem dado recursos a inúmeras organizações críticas ao governo venezuelano.

A certa altura, o visitante virtual é cercado por baratas antes de encolher lentamente até o nível dos insetos. Muitos dos 30 presos entrevistados para o projeto concordaram: "Eles fazem você se sentir uma barata", comenta Navarro, para quem esse sentimento reflete a "desumanização que existe na tortura".

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