Entenda a Guerra: saiba mais sobre grupos como Hamas, Hezbollah, Fatah e locais como Gaza
Confira perguntas e respostas sobre os principais atores políticos que, sob os mais diversos motivos, produzem o mais novo capítulo da crise entre Israel e Palestina
O conflito armado entre Hamas e Israel está inserido em uma história de rivalidades de décadas. Os ataques terroristas do grupo a partir da Faixa de Gaza, no sábado, e a forte reação israelense desde então traduzem desafios seculares, disputa por espaço e grupos com posicionamentos diferentes.
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Neste cenário, há uma série de locais, grupos e entidades importantes para se compreender as muitas dimensões do conflito. Veja abaixo:
LOCAIS
Faixa de Gaza
Limitada ao norte e ao leste pelo território israelense, a oeste pelo Mar Mediterrâneo e ao sul pelo Egito, a Faixa de Gaza é um estreito território de 360 km², com 41 km de comprimento e entre 6 a 12 km de largura. Ou seja, uma área que equivale a um terço da cidade do Rio de Janeiro. Vivem na região mais de 2 milhões de palestinos. São quase 6 mil habitantes por km² — uma das densidades populacionais mais altas do mundo.
A Faixa de Gaza tem mais de 5 mil anos de história. Em 1998, a descoberta do sítio arqueológico de Tell es-Sakan mostrou que uma cidade cananéia fortificada era continuamente ocupada entre 3.200 a 2.000 A.C.
Posteriormente, Gaza esteve sob o domínio, entre outros, dos assírios, babilônios, romanos, árabes e cristãos (assim como toda a Palestina). Em 1948, passou para o controle egípcio, logo após a proclamação do Estado de Israel (em 14 de maio daquele ano). Menos de duas décadas depois, em 1967, Israel anexou o enclave após a Guerra dos Seis Dias entre árabes e israelenses, retirando-se unilateralmente em 2005.
Desprovida de recursos naturais, a Faixa de Gaza sofre com escassez crônica de água e combustível. O desemprego atinge metade da população, incluindo três quartos dos jovens. Mais de dois terços da população depende de ajuda humanitária. A mesma proporção dos moradores vive abaixo da linha de pobreza.
Nos últimos 15 anos, a população de Gaza enfrentou seis conflitos. O mais recente, em maio deste ano, durou cinco dias e teve 35 palestinos mortos, incluindo líderes da Jihad Islâmica.
Cisjordânia
A Cisjordânia (que inclui a porção Oriental de Jerusalém) tem 365 km² e compunha o estado árabe da região tal qual redefinido no Armistício de 1949, juntamente com a Faixa de Gaza. A região fica entre Jerusalém, reivindicada por palestinos e israelenses, e a Jordânia, onde vivem hoje cerca de 2,7 milhões de pessoas.
O território foi anexado por Israel durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967. Além dele, também foram anexadas a Península do Sinai, do Egito, as Colinas de Golã, da Síria, e a Faixa de Gaza. Os territórios do Egito e da Síria foram recuperados parcialmente em um dos conflitos mais avassaladores da história de Israel, a Guerra do Yom Kippur. Tel Aviv saiu vitorioso, após um ataque-surpresa com críticas à época à Inteligência israelense.
A Cisjordânia é atualmente governada pela Autoridade Nacional Palestina e seu governo é secular. Na prática, no entanto, seu território ainda está sob controle militar israelense. Há mais de meio milhão de colonos judeus vivendo na área. Os polêmicos assentamentos começaram a ser erguidos após a guerra de 1967 e, de acordo com o Direito internacional, ilegais.
Jerusalém
Sagrada para judeus, muçulmanos e cristãos, Jerusalém é um dos principais alvos do conflito histórico. Com seus 150 km², a cidade é considerada um dos berços dessas religiões, com importantes marcos para as narrativas desses povos.
Para os cristãos, por exemplo, Jerusalém é central por ter sido palco da paixão e morte de Jesus Cristo. Acidade antiga, ainda dentro dos limites da moderna, foi o local em que Cristo foi sepultado — o Monte Calvário, ou Gólgota. Já para os muçulmanos, ali foi o local em que o profeta Maomé ascendeu aos céus.
Por sua vez, os judeus consideram que Jerusalém é a cidade declarada pelo rei Davi como capital do seu povo. O templo da Arca da Aliança e as tábuas dos Dez Mandamentos também estariam abrigadas lá.
Assim, uma das principais disputas é a reivindicação da cidade como capital. Israel, por exemplo, afirma que Jerusalém é a sua capital, após ter tomado a parte Oriental com a conquista da Cisjordânia em 1967. Internacionalmente, sua capital reconhecida é Tel Aviv, no litoral.
Os palestinos reivindicam que Jerusalém Oriental seja a capital de um estado independente.Em Israel também fica a Esplanada das Mesquitas, o terceiro lugar mais sagrado para o islamismo e o primeiro do judaísmo, que o batizam de Monte do Templo.
Os muçulmanos chamam a região, que também inclui o santuário da Cúpula da Rocha (ou Domo da Rocha), de Haram al-Sharif, ou Santuário Nobre. Os fiéis crêem que o profeta Maomé viajou de Meca até à mesquita em uma noite para orar antes de ascender ao céu.
Os consideram o Monte do Templo sagrado pois é onde ficavam dois templos antigos importantes para a religião, destruídos pelos romanos no ano 70 D.C. O único vestígio deles é o Muro das Lamentações.
Israel
O Estado de Israel, localizado no Oriente Médio, foi criado em 14 de maio de 1948, após pressão internacional por um Estado judeu frente aos horrores do Nazismo e do Holocausto. Está localizado atualmente em uma região considerada sagrada para os judeus mas também para católicos e muçulmanos.
Os judeus acreditam que aquela região é onde está localizada a Terra de Israel, prometida por Deus aos seus antepassados após a escravidão no Egito. A região já foi dominada por diversos grupos, entre eles os babilônios (586 a.C), persas (538 a.C) e romanos (63 a.C). O Império Romano foi quem deu o nome à região de Palestina.
Com o avanço do Islã, a Palestina passou a ser ocupada majoritariamente por populações de fé islâmica, que lutaram contra cristãos durante as cruzadas europeias.
O Império Otomano, comandado pelos turcos, passou a ter controle da região a partir de 1516 até sua desintegração na Primeira Guerra Mundial (1914-18). A administração da Palestina passou então para domínio colonial britânico. Àquela altura, árabes e muçulmanos já protestavam contra a crescente migração de judeus à área e o nascimento do movimento sionista moderno, que defendia o desejo de um Estado judaico na região. A situação só piorou com as promessas do Reino Unido, que se mostraram falaciosas, de acomodar na área tanto árabes quanto judeus.
O antissemitismo durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45) pressionou ainda mais a comunidade internacional para a necessidade da criação de um Estado judeu. A ideia original era a de que o território fosse repartido entre judeus e palestinos, com dois estados independentes.
Um dia após a criação do Estado de Israel, no entanto, o país foi invadido em uma ação conjunta de Egito, Jordânia, Síria e Iraque no território recém-fundado, levando a Organização das Nações Unidas (ONU) a concordar com a redução pela metade do território inicialmente destinado aos árabes, que foram redefinidos no Armistício de 1949. Os árabes ficaram com a Cisjordânia (que inclui Jerusalém Oriental) e a Faixa de Gaza.
Israel tomou a Cisjordânia e a Faixa de Gaza na Guerra dos Seis Dias, em 1967, além da a Península do Sinai, no Egito, e das Colinas de Golã, na Síria.
Apesar dos territórios egípcio e sírio terem sido parcialmente recuperados na Guerra do Yom Kippur, iniciada no dia 6 de outubro de 1973, durante o feriado judaico do Dia do Perdão, Gaza seguiu sob domínio israelense. A Cisjordânia, apesar de ser atualmente governada pela ANP, ainda tem seu território sob controle militar israelense.
GRUPOS
Hamas
Foi o grupo terrorista que atacou Israel no sábado. Hamas é a sigla árabe para Movimento de Resistência Islâmica. O grupo foi fundado em 1987, durante a primeira Intifada, ou revolta, palestina. É conhecido por seus ataques armados como forma de resistência à ocupação israelense.
O Hamas não reconhece Israel e se opõe aos Acordos de Paz de Oslo, negociados pelos israelenses e pela Organização da Libertação da Palestina (OLP) na década de 1990 -- mas que jamais foram postos em prática.
Ainda assim, seus líderes por vezes ofereceram "uma trégua de longo prazo" em troca do reconhecimento de um estado independente palestino em todos os territórios ocupados por Israel em 1967, o que foi rechaçado pelo governo israelense.
Israel, contudo, chegou a permitir ativamente a ascensão do grupo extremista armado pois enxergava no Hamas um contrapeso útil para a Organização de Libertação da Palestina (OLP) de Yasser Arafat, coração do partido Fatah, também considerado entidade terrorista por Israel.
O Hamas controla a Faixa de Gaza desde 2007, após vencer as eleições de 2006 e de vencer uma breve guerra civil contra as forças leais ao Fatah, liderado atualmente pelo presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas. O grupo armado também tem alguma força na Cisjordânia e líderes espalhados pelo Oriente Médio.
Atualmente, é apoiado pelo Irã, pela Irmandade Muçulmana, estabelecida no Egito na década de 1920, e pelo grupo xiita Hezbollah, no Líbano. E financiado, majoritariamente, pelo Catar. O Hamas é considerado organização terrorista por, além de Israel, Estados Unidos, União Europeia, Canadá, Egito e Japão.
Hezbollah
Grupo xiita baseado no Líbano, o Hezbollah surgiu, com a ajuda do Irã, durante a ocupação israelense do Sul do país, que ocorreu nos anos 1980 e 1990. A Revolução Islâmica do Irã, em 1979, e a marginalização do grupo dentro do Líbano, dominado ao longo da história por muçulmanos sunitas e diversos grupos cristãos, também foram fatores decisivos para a sua criação.
O grupo libanês está decisivamente inserido na sociedade do país: seus membros são libaneses, o grupo atua como partido político, mantêm escolas, hospitais e rede de TV.
Diferentemente do Hamas, que nos anos 1990 usava maciçamente a estratégia de atentados terroristas suicidas, o Hezbollah abandonou a tática na mesma década, optando por investir em uma milícia treinada e muito bem armada. Por isso, sua força bélica é ainda mais preocupante para Israel.
Em 2006, o grupo enfrentou Israel em um conflito que se estendeu por 33 dias. O confronto de grande escala, não teve vencedores, mas o Líbano foi arrasado. Atualmente, acredita-se que o grupo armado possui cerca de 100 mil mísseis. O Hezbollah é considerado um grupo terrorista por israelenses, americanos e sauditas. E também lutou, com o apoio do Irã, na Síria, contra o Estado Islâmico e a al-Qaeda, para defender o regime do aliado Bashar al-Assad.
Fatah
O grupo foi fundado no Kuwait, em 1959, após o êxodo palestino conhecido como Nakba. Entre seus fundadores mais notáveis estão Yasser Arafat (1929-2004) e Mahmoud Abbas, atual presidente da Palestina.
Secular, isto é, livre de dogmas religiosos, o Fatah inspirou vários movimentos guerrilheiros esquerdistas durante a Guerra Fria que travaram insurreições em outras partes do mundo.
“Fatah” significa “conquistar” e é um acrônimo para, em árabe, Harakat al-Tahrir al-Filistiniya, que em português significa Movimento de Libertação Nacional da Palestina. Inicialmente, sua estratégia era libertar a Palestina histórica através da luta armada contra o Estado de Israel.
A principal ala do grupo historicamente estava baseada em vários países árabes, mas em especial justamente na Faixa de Gaza, de onde foi expulsa em 2007 pelo Hamas, e na Cisjordânia. Suas principais operações concentravamm-se na Jordânia e no Líbano.
Após a Guerra Árabe-Israelense de 1967, sob a gestão de Arafat, o Fatah se tornou o partido dominante na OLP. A organização, criada em 1964, realizou assassinatos, sequestros e, embora reconhecida por países vizinhos árabes, foi considerada entidade terrorista por Israel.
Nas décadas de 1970 e 1980, o Fatah sofreu uma mudança radical após sua expulsão do Líbano e da Jordânia, passando a optar pela negociação com Israel.
A OLP passou a atuar como representante da Palestina na Organização das Nações Unidas (ONU), após ter renunciado oficialmente à resistência armada em 1990. Foi a organização que assinou os Acordos de Oslo, que levaram à criação da Autoridade Nacional Palestina (ANP), que controla a Cisjordânia.
Jihad Islâmica
A Jihad Islâmica é uma organização palestina fundada em 1981 que também recebe apoio do Irã e defende a resistência armada a Israel. Criado por estudantes da Universidade Islâmica de Gaza, é próxima do Hamas.
A Jihad Islâmica também é próxima da Irmandade Muçulmana, movimento fundado no Egito no começo do século 20. O grupo atua principalmente em Gaza, mas também tem presença na Cisjordânia.
Seu braço armado, as brigadas al-Quds, foi fundado em 1992. A organização foi dirigida por Fathi Chakaki até 1995, quando o líder, também escritor e médico, foi assassinado em Malta pelo Mossad, o serviço de inteligência israelense. Atualmente, seu líder é Ziad al-Nakhala.
A Jihad Islâmica se opõe a qualquer negociação com Israel e rejeita os Acordos de Oslo, assinados pela Autoridade Palestina e Israel em 1993. A organização é considerada terrorista por Israel, Estados Unidos e União Europeia.