Entenda o que são as novas variantes do coronavírus e por que devemos nos preocupar com elas
Veja as principais dúvidas sobre as variantes e o que sabemos sobre elas até agora
Se em 2020 o mundo descobriu o novo coronavírus, seus efeitos (de curto e longo prazo), como preveni-lo e como desenvolver vacinas contra a Covid-19, o assunto em 2021 são as variantes do vírus, ou seja, novas formas dele que continuam a surgir e causam preocupação por causa de seu alto potencial de transmissão e pelo temor do que podem fazer aos imunizantes já desenvolvidos.
Veja as principais dúvidas sobre as variantes e o que sabemos sobre elas até agora.
O que são variantes do vírus?
O coronavírus infecta as células e as sequestra para produzir novas cópias dele. Nesse processo de aumentar seu exército, ele acaba cometendo alguns erros de cópia, chamados de mutações.
Qualquer forma isolada em laboratório com uma ou mais mutações que distingam o vírus da forma ancestral é identificada como uma nova variante do vírus, segundo o virologista e professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP Paulo Eduardo Brandão.
Na prática, cepa e variante são a mesma coisa. Cepa é o termo que se refere a uma única amostra isolada em laboratório, enquanto variante é o termo que se refere ao vírus isolado em uma região (por exemplo o surto de Londres foi por uma variante identificada em várias amostras de lá).
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Durante a pandemia, diversas variantes do coronavírus Sars-CoV-2 já foram identificadas.
E por que as variantes surgem?
Apontadas muitas vezes como a causa da piora da pandemia no Brasil, na verdade elas são resultado do descontrole e da alta circulação de pessoas.
Quanto mais o vírus circula, maiores as chances de mutações surgirem -algumas delas facilitam a entrada do vírus nas células ou então impedem a ação de anticorpos neutralizantes.
Como as variantes são batizadas?
Brandão afirma que, para evitar estigmas, não são mais atribuídos nomes da região geográfica em que foi descoberta a linhagem. A nomenclatura oficial usa uma letra (indicando a linhagem ancestral, como "B" ou "P") e números (por exemplo B.1.1). Para que este texto não vire uma sopa de letrinhas e confunda o leitor, vamos usar as cidades de origem em alguns casos.
As variantes conhecidas até agora que causam preocupação são a B.1.1.7, identificada no Reino Unido, a B.1.351, que surgiu na África do Sul, as duas linhagens brasileiras, a P.1, originária de Manaus e já dominante em pelo menos seis estados brasileiros fora do Amazonas, e P.2, de grande circulação no Brasil e primeiro identificada no Rio de Janeiro, e duas linhagens encontradas nos Estados Unidos, a CAL.20C, no sul da Califórnia, e a B.1.526, em Nova York.
A primeira variante a ser descrita foi a do Reino Unido, a partir de sequenciamento em massa de amostras do vírus, principalmente vindas da região de Kent, no sul de Londres. Até o momento, ela já foi detectada em 111 países e é predominante em toda a Europa.
As variantes são mais perigosas do que o coronavírus original?
A B.1.1.7 já era conhecida por ser de 43% a 90% mais transmissível. Recentemente, pesquisadores das universidades de Exeter e Bristol verificaram também que ela é 64% mais letal e pode causar formas mais graves da doença.
Um novo estudo publicado na revista Nature nesta segunda (15) também aponta que essa variante pode estar associada a um maior risco de morte. A análise foi feita com mais de 2 milhões de testes e 17 mil mortes na Inglaterra entre setembro de 2020 (quando a variante foi identificada) e fevereiro de 2021.
Os autores estimam um risco de morte 61% maior com a variante britânica.
Em relação ao potencial risco à saúde pública, a variante B.1.351, da África do Sul, tem se mostrado preocupante. Apesar de não haver ainda dados que associem esta variante à maior severidade ou letalidade da doença, a linhagem que surgiu no país africano tem potencial de transmissão até 1,5 maior e não é freada pelos anticorpos que ajudam no controle da forma original do vírus, demonstrando que uma infecção prévia não impede a reinfecção.
A P.1, ou variante de Manaus, também apresenta maior transmissibilidade, embora ainda não haja um consenso de quão mais transmissível ela é -cientistas falam de 2,2 a até 6 vezes mais.
Em comum à variante sul-africana, a P.1 apresenta também a mutação E484K, ligada ao bloqueio da ação de anticorpos neutralizantes que ajudam a impedir a entrada do vírus original nas células. Casos de reinfecção também já foram reportados e não podem ser descartados.
Faltam ainda dados sobre maior letalidade ou severidade da doença em indivíduos infectados sobre essa variante, mas a impressão dos profissionais de saúde e pesquisadores que estudam o vírus é que essa linhagem teria relação com o maior número de óbitos observado naqueles lugares com alta incidência da P.1 em 2021, como Manaus e Araraquara.
Uma outra variante também surgiu no Brasil, chamada de P.2, descrita primeiro a partir de um caso de reinfecção com essa nova variante. Por ser ainda pouco estudada, não há dados sobre sua maior letalidade ou severidade, mas ela possui a mesma mutação presente nas variantes B.1.351 e P.1, capaz de bloquear a ação de anticorpos que neutralizam a forma ancestral do vírus.
As variantes podem atrapalhar as vacinas?
A variante britânica não parece causar impacto potencial nas vacinas disponíveis contra a Covid-19.
A variante da África do Sul, quando testada contra o soro de indivíduos vacinados com as vacinas da Pfizer, Moderna e Oxford/AstraZeneca, diminuiu significativamente o nível de anticorpos presentes no sangue. Como a ação de anticorpos é um dos mecanismos de resposta imune, essa variante pode potencialmente reduzir a eficácia das vacinas, segundo estudos feitos na África do Sul com as vacinas da Novavax e da Janssen, que tiveram uma redução na eficácia de seus imunizantes (de 89,1% para 48,6%, no caso da Novavax, e de 72% para 64%, para a Janssen) quando testados naquele país.
Estudo com o soro de indivíduos vacinados com as vacinas da Pfizer e Moderna contra a variante de Manaus apontou redução nos anticorpos neutralizantes, embora em uma proporção menor do que o observado com a B.1.351. A Janssen conduziu testes na América Latina e verificou uma redução da eficácia de sua vacina na região, embora não haja ainda confirmação de que essa redução estaria ligada à P.1.
Já dados preliminares ainda não divulgados oficialmente das vacinas da Oxford/AstraZeneca e Coronavac indicam que essas vacinas são eficazes contra a P.1, de Manaus.
O estudo das vacinas da Pfizer e Moderna com soro de indivíduos vacinados apontou redução de anticorpos quando testados contra a variante P.2, mas não há dados concretos sobre redução de eficácia. Para as demais vacinas, não há dados.
É importante ressaltar que, mesmo com a redução de eficácia, as vacinas ainda têm potencial em reduzir a hospitalização e severidade da doença, e não houve mortes no grupo de indivíduos vacinados dos dois estudos, indicando proteção contra mortes. Além disso, elas protegem contra a linhagem ancestral do vírus e ainda podem ser boas aliadas para a imunização da população.
Há novas variantes preocupantes surgindo?
Recentemente, pesquisadores da Rede Vírus, da Rede Corona-ômica-BR e do Laboratório Nacional de Computação Científica, encontraram uma nova variante, ainda não caracterizada como uma linhagem distinta, no país. Batizada de N.9, essa forma vem de uma outra parte da árvore evolutiva do Sars-CoV-2, distinta daquela que originou a P.1 e P.2, mas também possui a mutação E484K, que reduz a ação de anticorpos neutralizantes. A variante ainda está sob investigação e não é, no momento, uma VOC.
Nos EUA foram identificadas duas novas linhagens: a primeira, CAL.20C, foi encontrada no sul da Califórnia e parece ser a combinação de duas formas diferentes. Com cinco mutações na proteína S do vírus, apenas uma, a L425R, leva a uma maior preocupação por estar em uma região que pode afetar a ação de anticorpos.
Não há informações ainda sobre seu potencial mais letal, mas a variante californiana parece ser mais transmissível. Quando testada com as vacinas da Pfizer e Moderna, houve uma redução de anticorpos neutralizantes de soros de indivíduos vacinados, mas nada muito expressivo ou que pudesse indicar diminuição da eficácia. Não há dados para as outras vacinas em uso.
Por fim, pesquisadores da Caltech e da Universidade de Columbia encontraram uma nova variante na região de Nova York, chamada B.1.526.
Ainda não há dados suficientes sobre essa variante para avaliar seu potencial de transmissão ou de severidade, mas há indícios da redução potencial da ação de anticorpos neutralizantes.
O que eu posso fazer para me proteger das variantes?
Os cuidados são os mesmos desde o começo da pandemia: distanciamento social, uso de máscaras e higienização das mãos.
As variantes podem contagiar quem já teve Covid-19?
Sim. Quando foi descoberta e mesmo agora meses depois, a variante B.1.1.7 (britânica) não parecia estar relacionada a casos de reinfecção, mas, sim, a um surto de novos casos identificados a partir de uma forma mais virulenta.
No caso das variantes da África do Sul e de Manaus, locais que foram fortemente atingidos pela pandemia no início de 2020, o surgimento de novas variantes em lugares onde havia sido apontada alta prevalência do vírus indica potencial bloqueio da ação dos anticorpos que protegem contra a forma ancestral do vírus. O mesmo foi verificado em Nova York, cidade com alto índice de contaminação em 2020 e onde surgiu uma nova variante em meados de fevereiro deste ano.
O primeiro caso de reinfecção com uma nova variante no Brasil foi reportado com a P.2, em Salvador, após uma infecção inicial pela linhagem ancestral do vírus. Essas observações são indícios para o potencial de reinfecção das novas variantes.