Espectro de armas químicas na Ucrânia assusta o Ocidente
EUA e Reino Unido afirmam que a Rússia poderia usar armas químicas na Ucrânia
Os países ocidentais estão preocupados com a possibilidade de a Rússia utilizar armas químicas na Ucrânia, o que traz à tona o espectro das atrocidades cometidas pelo regime de Bashar al Assad na Síria.
A Rússia "pagará um preço alto se utilizar armas químicas" na Ucrânia, advertiu, nesta sexta-feira (11), o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, durante um discurso na Casa Branca.
Desde a quarta-feira, tanto os Estados Unidos como o Reino Unido garantem que a Rússia poderia usar armas químicas na Ucrânia.
Segundo Washington e Londres, o fato de a Rússia ter acusado os Estados Unidos e a Ucrânia de gerenciar laboratórios destinados à produção de armas biológicas na ex-república soviética é um sinal de que Moscou está considerando este tipo de cenário.
"O Kremlin difunde intencionalmente mentiras segundo as quais os EUA e a Ucrânia estariam realizando atividades relacionadas com armas químicas e biológicas na Ucrânia", reagiu na quarta-feira o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Ned Price.
Em 2018, a Rússia já havia acusado os Estados Unidos de realizar experiências biológicas secretas em um laboratório na Geórgia, outra ex-república soviética que, assim como Ucrânia, quer se juntar à Otan e a União Europeia.
A Ucrânia dispõe de "instalações de pesquisa biológica", confirmou a número três do Departamento de Estado americano, Victoria Nuland, ao enfatizar que os Estados Unidos estavam "agora bastante preocupados com a possibilidade de as forças russas tomarem o controle" desses lugares.
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Os russos "começam dizendo que há armas químicas armazenadas por seus oponentes ou pelos americanos. Então, quando eles mesmos utilizam armas químicas, como acredito que farão, eles têm uma espécie de 'maskirovka' [termo russo que se refere à arte de enganar o inimigo], uma história falsa preparada", disse na quarta-feira o primeiro-ministro britânico Boris Johnson.
A Rússia é um dos 198 países que firmaram a Convenção sobre Armas Químicas, que entrou em vigor em 1997, e concluiu oficialmente a destruição de 100% de suas 40.000 toneladas de armas químicas.
'Aterrorizar a população'
Contudo, nos últimos anos, os ocidentais culparam Moscou de dois casos de envenenamento com o agente nervoso Novichok, dirigidos contra o opositor preso Alexei Navalny, em 2020, e o ex-espião russo Sergei Skripal na Inglaterra, em 2018.
Por outro lado, a Rússia sempre negou o uso repetido de armas químicas pelo regime sírio contra a população civil.
Em grande medida, esses crimes ficaram impunes. Em 2013, o então presidente americano Barack Obama (2009-2017), que os havia convertido em uma "linha vermelha", descartou realizar ataques punitivos na Síria.
A hipótese do possível uso de armas químicas na Ucrânia também preocupa a França, no momento em que as conquistas do exército russo em território ucraniano têm sido escassas.
A ofensiva iniciada em 24 de fevereiro "deveria mostrar a força da Rússia, mas acontece o contrário. Isso torna [o presidente russo] Vladimir Putin ainda mais imprevisível", advertiu na quarta-feira o chefe do Estado-Maior da França, Thierry Burkhard, em uma carta enviada a seus oficiais-generais.
"Vladimir Putin não entrou nessa guerra para perder. Em caso de impasse ou humilhação, o uso de armas sujas ou de armas nucleares táticas é parte das possibilidades", reagiu um alto funcionário francês sob condição de anonimato.
"A Rússia errou ao entrar na guerra. Agora é preciso salvar a imagem do Kremlin", analisou Mathieu Boulègue, especialista em Rússia do 'think tank' britânico Chatham House.
"A química é um vetor que [a Rússia] muito bem poderia usar. Não é improvável", acrescentou.
Na Ucrânia, as armas químicas seriam usadas "para aterrorizar a população civil e forçá-la a fugir. Mas não se trata de uma arma que mudaria o curso da guerra. Uma arma nuclear táctica que destruiria uma cidade ucraniana, sim", adverte Mathieu Boulègue.
Olivier Lepick, pesquisador associado da Fundação para a Pesquisa Estratégica (FRS, na sigla em francês), especializado em armas químicas, se mostra mais prudente.
"Daríamos mais um passo no terror e, portanto, na desaprovação da opinião pública internacional, que correria o risco de incrementar o regime de sanções, que já é extremamente severo", opina.