EUA anunciam que chanceler chinês irá a Washington após encontro com Blinken em Pequim
Analistas permanecem céticos sobre a expectativa de avanços nas relações entre os dois países durante a visita do Secretário de Estado americano à China
O ministro das Relações Exteriores chinês, Qin Gang, aceitou o convite para visitar Washington, durante encontro com o secretário de Estado americano, Antony Blinken, neste domingo, em Pequim. A informação é do Departamento de Estado americano.
— Concordaram em programar uma visita recíproca em um momento adequado — disse o porta-voz do Departamento de Estado, Matt Miller.
A chancelaria americana classificou as conversas na capital chinesa de "construtivas". Blinken foi recebido com pompa por Gang, com tapete vermelho estendido, em um palácio nos antigos Jardins Diaoyutai. Por trás do cerimonial amistoso e das declarações otimistas, as perspectivas de avanço nas relações cada vez mais ácidas e imprevisíveis entre Washinton e Pequim são poucas no curto prazo.
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A visita de Blinken estava originalmente marcada para fevereiro, mas foi cancelada depois que os Estados Unidos disseram ter detectado um balão de espionagem chinês no espaço aéreo americano. Blinken é o funcionário de mais alto escalão dos Estados Unidos a visitar a China desde que seu antecessor, Mike Pompeo — que mais tarde liderou a política de confronto do ex-presidente Donald Trump com Pequim — esteve lá em outubro de 2018.
Desde o episódio do balão, as tensões entre Washigton e Pequim só aumentaram — levando analistas a classificarem a escalada de piora nas relações de "nova guerra fria". Entre os principais pontos de fricção estão o avanço tecnológico e comercial da China e a questão da ilha democrática autônoma de Taiwan. O governo Biden manteve a linha dura e foi ainda mais longe do que o governo anterior em algumas questões, por exemplo, a imposição de controles de exportação para limitar a compra e fabricação de chips de ponta pela indústria chinesa.
Para muitas lideranças do mundo dos negócios dos dois lados, as expectativas em torno da viagem de Blinken são baixas e se concentram principalmente em evitar uma derrocada ainda maior. Por um lado, se espera que as comunicações bilaterais sejam, pelo menos, restabelecidas. Por outro, que não haja aprofundamento da crise, que já dá sinais de sair da diplomacia para a chamada economia real. O investimento externo direto na China caiu para o menor nível em 18 anos, no segundo semestre do ano passado.
— A relação econômica se tornou tão sombria que qualquer sinal de progresso é bem-vindo, apesar das expectativas serem baixas para qualquer tipo de grande avanço — avaliou Jake Colvin, presidente do Conselho Nacional de Comércio Exterior, que representa uma série de empresas multinacionais.
Cerco a Taiwan
A questão de Taiwan também está entre as mais delicadas na pauta da diplomacia dos dois países. Em abril, a situação atingiu o ponto mais grave quando a China organizou exercícios militares de vulto, com simulação de um cerco total a Taiwan e uso de munição real, após a visita da presidente do governo autônomo da ilha, Tsai Ing-wen, a Washington. No ano passado, os chineses responderam do mesmo modo à ida da então presidente da Câmara dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, a Taipé.
As manobras chinesas foram seguidas pelos maiores exercícios militares em 30 anos dos Estados Unidos com as Filipinas. No início do mês, os americanos disseram que um caça chinês fez uma manobra "desnecessariamente agressiva" perto de uma aeronave americana, na região do Mar do Sul da China. Entre as prioridades da visita de Blinken, está a reabertura de comunicação entre os governos, do ponto de vista de defesa, para reduzir os riscos de um incidente entre navios e aviões militares das duas Forças Armadas em locais delicados da região, como o Mar do Sul da China e o estreito de Taiwan.
Embora não mantenham relações diplomáticas com Taiwan — assim como a maioria dos países do mundo, que reconhecem diplomaticamente apenas Pequim — os Estados Unidos são o principal parceiro militar da ilha autônoma e têm se posicionado de forma cada vez mais veemente, diante de demonstrações crescentes do governo do presidente chinês, Xi Jinping, de ambições de reintegrar a ilha ao território da China. No ano passado, Joe Biden chegou confirmar a jornalistas que o país se envolveria militarmente para defender Taipé de uma invasão liderada por Pequim.
'Linhas diretas de comunicação'
Na sexta-feira, antes da chegada de Blinken, um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês disse que os americanos deveriam "respeitar as principais preocupações da China" e "desistir da ilusão de lidar com a China em 'uma posição de força'.
Antes de decolar rumo a Pequim, Blinken mostrou-se otimista, afirmando que o objetivo da viagem é "abrir linhas diretas de comunicação para que os nossos dois países possam gerir a relação de forma responsável, o que inclui enfrentar alguns desafios e equívocos e evitar erros de cálculo".
O presidente americano, Joe Biden, afirmou que espera se encontrar novamente com seu homólogo chinês, Xi Jinping, após a extensa reunião que tiveram em Bali em novembro, à margem da cúpula do G20.
— Espero que, nos próximos meses, eu me encontre novamente com Xi e possamos conversar sobre as diferenças legítimas que temos, mas também sobre como existem áreas em que podemos nos entender — disse Biden.
Os dois líderes podem se encontrar na próxima cúpula do G20, em setembro, em Nova Délhi. Xi também foi convidado a viajar a San Francisco em novembro para o Fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (APEC).
Para o ex-diplomata americano Danny Russell, a visita de Blinken dificilmente vai resultar em resolução de questões grandes ou pequenas nas relações entre os dois países.
— A visita pode reiniciar o diálogo cara a cara, que é muito necessário, e enviar um sinal de que ambos os países estão passando da retórica raivosa na cabine de imprensa para discussões sóbrias a portas fechadas — acrescentou Russell, vice-presidente da Asia Society Policy Institute.