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Cúpula do Clima

EUA, Noruega, Reino Unido e empresas lançam coalizão bilionária contra desmatamento

A disponibilização de verbas por países desenvolvidos é um ponto caro às ambições do governo Jair Bolsonaro

Presidente Joe Biden durante Cúpula de Líderes sobre o ClimaPresidente Joe Biden durante Cúpula de Líderes sobre o Clima - Foto: POOL / Getty Images via AFP

Uma coalizão internacional formada por EUA, Reino Unido, Noruega e empresas privadas para reduzir as emissões de gases-estufa derivadas de desmatamento foi lançada na manhã desta quinta (22), durante a Cúpula do Clima organizada pelo presidente americano, Joe Biden.



A disponibilização de verbas por países desenvolvidos é um ponto caro às ambições do governo Jair Bolsonaro. A gestão brasileira tem afirmado a interlocutores no exterior ser necessário receber dinheiro de países mais ricos para conseguir frear o desmatamento crescente nos últimos anos na Amazônia, principal fonte de emissão de gases -junto à pecuária- no Brasil.

Em reunião neste mês com os EUA, Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, chegou a mostrar uma ilustração na qual o Brasil é representado como um cachorro de olho em frangos assados rodando em uma máquina. Acima dos frangos, a frase "expectativa de pagamento".

No passado recente, o Brasil conseguiu reduzir drasticamente níveis maiores de devastação da floresta com ferramentas que seguem disponíveis: monitoramento constante por satélite e ações de fiscalização.

A iniciativa internacional anunciada nesta quinta, porém, não deve atender às expectativas brasileiras, ao menos de início. A Coalizão Leaf é baseada em mecanismos de REDD+, sigla para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal, além da conservação de estoques de carbono florestal, manejo sustentável de florestas e aumento de estoques de carbono florestal.

Assim, é preciso apresentar resultados antes de receber aportes, e o financiamento será direcionado de acordo com a redução efetiva das emissões por desmatamento. A base de comparação será a média das emissões em intervalos de cinco anos, e aspectos sociais também serão levados em conta. A coalizão, por exemplo, consultará povos indígenas antes da assinatura de acordos.

O financiamento só será disponibilizado aos países inscritos após uma análise independente que apontará se os níveis de desmatamento -e, consequentemente, de emissões- foram reduzidos. Um detalhe importante é que, se uma parte da jurisdição (país, estado ou província) reduzir o desmatamento e outra apresentar destruição significativa, ela não será qualificável para receber fundos da iniciativa.

Até o momento, o fundo, cujo nome, "leaf" (folha, em inglês), significa "lowering emissions by accelerating forest finance", ou diminuição de emissões por meio da aceleração de financiamento florestal, já conta com cerca de US$ 1 bilhão.

Além de EUA, Noruega e Reino Unido, a coalizão conta com a participação de empresas privadas, como Amazon, Airbnb, Bayer, Boston Consulting Group, GSK, McKinsey, Nestlé, Salesforce e Unilever. Não foram informadas, por outro lado, as quantias depositadas por cada um dos países.

Devido à preocupação que as empresas usem o mecanismo para atenuar eventuais históricos ou comportamentos poluentes, a iniciativa exige que as companhias sejam ambientalmente comprometidas, tendo reduzido suas próprias emissões. Assim, a doação a países com florestas será uma ação adicional.

As primeiras propostas de projeto devem valer para o período de 2022 a 2026. Há semelhanças entre a Coalizão Leaf e o também bilionário Fundo Amazônia, do qual o Brasil tinha direito a verbas de acordo com os níveis de desmatamento registrados no país. O dispositivo, porém, foi paralisado por Salles e Bolsonaro no início da administração atual.

O ministro suspendeu o mecanismo sob a justificativa de irregularidades em contratos dos projetos beneficiados, vários dos quais com ONGs, entidades contestadas por Bolsonaro e Salles desde o início da administração atual. O Fundo Amazônia, que tinha como principais doadores Noruega e Alemanha, passava por auditorias internacionais constantes, sem haver documentação de problemas graves. Os países doadores também se mostram satisfeitos com a governança do órgão.

O objetivo de Salles, após a paralisação, é mudar a estrutura decisória do fundo, fazendo com que o governo federal se torne preponderante e, assim, tenha a palavra final no uso do dinheiro, destinado até então a projetos sustentáveis e até mesmo à implementação de políticas governamentais em estados, como o CAR (Cadastro Ambiental Rural, no qual todo proprietário deve registrar suas terras).

O destino das verbas é outra semelhança entre o Fundo Amazônia e a nova coalizão. Os doadores não podem decidir o que o país fará com o dinheiro, mas as empresas podem escolher a quais nações doar.

Os países que buscarem a coalizão também necessitarão de uma instituição para lidar com os eventuais aportes recebidos. Algo semelhante ocorria com o Fundo Amazônia, que era gerido pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). As chamadas jurisdições que tiverem interesse no recebimento de verbas deverão submeter propostas até julho de 2021, e outras empresas poderão integrar a coalizão até o fim de 2021, uma vez que a ideia é que os contratos sejam assinados com limite baseado nesse prazo, com pagamentos ocorrendo de 2022 a 2026.

A organização sem fins lucrativos Emergent será responsável por uma plataforma de intermediação para as transações e será a coordenadora administrativa da coalizão. Internacionalmente, tem sido incentivada a atualização das metas dos países para redução de gases-estufa, com objetivos mais ambiciosos, a fim de limitar o aumento médio da temperatura global a 1,5 ºC, como acertado no Acordo de Paris. Os EUA, por exemplo, anunciaram, durante a cúpula nesta quinta, que reduzirão entre 50% e 55% das emissões até o fim da década atual.

Ao mesmo tempo em que pede suporte financeiro internacional, o Brasil não tornou suas metas de redução de emissões de gases, no fim do ano passado. Especialistas, inclusive, apontam que a atualização das metas brasileiras é um retrocesso climático.

Isso ocorre porque o Brasil mudou a base de cálculo para a redução ao utilizar um novo inventário de emissões para o ano-base, com cálculo diferente, que aponta um pico de gases-estufa em 2005 maior do que o anterior. A meta, contudo, não foi atualizada, levando a uma elevação da meta de emissões. 

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